Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

José Paulo Cavalcanti Filho

‘Foi só mau jornalismo. O mesmo vício antigo, subdesenvolvido, suburbano, mesquinho e menor de esquecer as idéias e atacar as pessoas. Exemplo ruim para jovens jornalistas.

O Presidente do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco, Ayrton Maciel, foi escalado para tomar as dores do Presidente da FENAJ. Finge que responde, sem responder (‘Bola Fora, Zé Paulo!’, dessa terça), às críticas que fiz ao Projeto do Conselho de Jornalistas (‘Um Desastre’, de 19.11.2004). E perde boa oportunidade para um debate democrático.

Temos, nessa resposta que não é resposta, só o mesmo relicário insosso e repetitivo das lideranças da categoria na defesa incondicional desse projeto. Com (muita) boa vontade se vê, em seu texto, só duas idéias. Primeiro, a de que o projeto defende o diploma profissional. Sem nem se dar conta de não haver, nele, uma única linha sobre dito diploma – a favor ou contra. É engraçado. Reduzido o discurso, nesse ponto, a só uma realidade virtual.

Segundo, a de que o papel do Conselho seria o de ‘fiscalizar o exercício da profissão’. Ocorre que, no projeto, o Conselho não tem só esse poder, de fiscalizar o ‘exercício profissional’. Como deveria – em simetria com os estatutos de OAB (art. 3o), CREA (art. 27) e outros órgãos de classe. Mas também, assim diz o projeto, o de regular a própria ‘atividade do jornalismo’(art. 1º; § 1o; art. 2o; e art. 3o, IV). Um escândalo. Manter essas regras seria o mesmo que dar, à OAB, o poder de alterar o Código de Processo Civil. Mais que autoritário, e no plano dos valores democráticos, uma idéia inaceitável. Só que, contra essa crítica, e todas as outras, adota Ayrton um silêncio constrangedor.

As lideranças sindicais continuam defendendo o texto, como se nada houvesse nele de ruim. Sem, para dar alguma dignidade a suas palavras, mesmo pedir a alteração desses três artigos. Não sou contra o projeto. Nem proponho sua retirada. Apenas sustento que, para merecer o apoio de quem tem compromisso com a democracia, a FENAJ deveria ao menos propor a mudança desses três artigos. Assim o disse, lealmente, a seu Presidente. Palavras ao vento.

O amigo Ayrton, para responder retamente a meu artigo, estaria então obrigado: a) a defender o projeto – caso em que deveria usar argumentos, em vez de insultos; ou b) a concordar com as críticas que fiz, também ele estando contra esses três malsinados artigos – o que requereria coragem para romper um corporativismo que, em alguns casos, ganha ares de subserviência.

Grave ainda, no artigo, é que reitera Ayrton (primeiro parágrafo) ser o projeto da FENAJ. Não é. Ele sabe disso. Só para lembrar, o projeto da FENAJ (de 10.09.2002) tem 90 artigos. O do Governo, apenas 19. Sem um único artigo, ou frase, ou conjunto de quatro palavras que se inspirem no projeto original – este sim, da FENAJ.

No mais o Presidente da FENAJ sabe, Ayrton também sabe, e sabe muita gente mais que esse projeto foi redigido longe da sede da FENAJ. Sabemos todos, também, os nomes dos dois diretores da FENAJ que receberam dito projeto de mãos governamentais – contra o compromisso de assumir sua paternidade. Nenhum deles daqui, vale a lembrança – um mais ligado ao café, outro ao leite. Ayrton, sem aparentes escrúpulos de consciência, trai a verdade dos fatos. E se acomoda nas conveniências de um discurso insincero.

Em resumo, fiz críticas ao projeto. Conceituais. Artigo por artigo. O amigo Ayrton, quisesse enriquecer o debate democrático, e deveria contraditá-las. Artigo por artigo. Não o faz. Em vez de responder a essas críticas, ataca o crítico. Faz mau jornalismo. Prefere o insulto fácil. Se esconde por trás de um silêncio pequeno, cômodo, cúmplice, covarde. É pena.’



Ayrton Maciel

‘Bola fora, Zé Paulo!’, copyright Jornal do Commercio, 30/11/04

‘A ânsia de marcar um gol às vezes faz o goleador tropeçar nas próprias pernas. Em sentido figurado, pode-se analisar assim o posicionamento do renomado advogado e amigo dos jornalistas, José Paulo Cavalcanti Filho, ao se posicionar, de forma contundente contra o projeto da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) de criação do Conselho Federal de Jornalismo, em artigo publicado pelo JC, no último dia 19 de novembro. José Paulo se diz a favor do CFJ, porém, rejeita a proposta que se encontra na Câmara dos Deputados. Não é difícil acreditar, entretanto, que, ao escrever o artigo, Zé Paulo se fazia a pergunta: ‘Espelho, espelho meu…’.

O Conselho Federal de Jornalismo é uma reivindicação antiga da categoria, que eu testemunho desde o final da década 80. A proposta do CFJ tem dois objetivos claros: fiscalizar o exercício legal da profissão e cuidar do exercício ético da profissão. Quem pode ser contra isso? Não se quer o controle externo da imprensa, como não aceitamos o controle interno, muitas vezes praticado, e que é danoso à sociedade.

Reconheço o conhecimento e o interesse que a imprensa e as normas legais que a disciplinam, em todo o mundo, têm despertado no advogado. José Paulo teve efetiva influência na elaboração do anteprojeto inicial de criação do Conselho Federal de Jornalismo, que acabou não sendo levado ao Congesso Nacional. Mas, o amigo sabe que é quase um consenso entre os jornalistas que o atual texto, em tramitação nas comissões da Câmara dos Deputados, precisa ser aperfeiçoado, recebendo todas as seguranças de que o CFJ não pretende ser censor do jornalismo. O que se quer é continuar a ter o jornalismo como profissão de nível superior, com a exigência do diploma para o seu exercício.

Ao colocar que esperava que o atual presidente da Fenaj, Sérgio Murilo Andrade, não mais se pronunciasse a favor do projeto que tramita na Câmara – depois de ter colocado para o mesmo suas restrições, em debate promovido pelo Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco – e por ter sido contrariado, resolveu criticar o projeto, publicando o artigo, e pedir o seu sepultamento, José Paulo revela ranço autoritário e traços de vaidade. A Fenaj não tem que seguir o pensamento de uma única pessoa, por mais preparada que esteja, muito embora não seja ela da mesma área de profissão.

Nos preocupam as ameaças ao jornalismo com qualidade, ética e honradez. Nos interessa o jornalismo sério e realmente livre. Nos preocupa a campanha deliberada contra o diploma, tendo como maior expressão desse ataque o jornal Folha de São Paulo, que há muito propaga o fim do curso superior de jornalismo para exercício da profissão. O interesse final da Folha é o de padronizar a imprensa nacional. A Folha criou um estilo de texto que anula, literalmente, a liberdade de criação e o estilo individual do jornalista. Se é um jornal rico em fontes e em investigação, duas características do bom jornalismo, é totalmente autoritário quando liquida a liberdade de expressão e não dá o direito de defesa, duas outras características do bom jornalismo. Na maioria dos ataques feitos ao CFJ, a Folha não permitiu sequer o direito ao contraditório, nas vezes em que a Fenaj reivindicou.

A questão do exercício legal do jornalismo é ponto de honra da categoria. Assim como advogados, médicos, engenheiros, arquitetos, odontólogos e mais de 40 outras profissões de nível superior, nós, jornalistas profissionais, não abrimos mão do mesmo direito. Qual será o jornalismo que o povo brasileiro deseja? O feito por aéticos? O feito por inabilitados, sem conhecimento e sem comprometimento com a verdade e o direito de defesa? A proposta do CFJ está na instituição adequada para o seu debate e aperfeiçoamento, o Congresso Nacional. Querer simplesmente liquidar o projeto, sequer sem o seu debate, retirando-o da pauta, é autoritarismo, próprio daqueles que se sentem donos da informação. O povo brasileiro precisa ficar atento a essa presunção. A Fenaj já está cuidando de apresentar emendas ao projeto, melhorando o texto e deixando bastante transparentes as intenções.

Jornalista não é santo, não é anjo, não é entidade espírita. Quem pode negar ao jornalista o direito a ter um Conselho que defenda a profissão? O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por absoluta maioria, concluiu que o projeto da Fenaj não é inconstitucional e não fere nenhum princípio das liberdades de expressão e de imprensa.

É importante, agora, ressaltar que, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) em plenária do dia 28 de outubro passado, que analisou recurso oriundo de Santa Catarina, decidiu, de forma inequívoca, que, para o exercício da profissão, é necessária a conclusão do curso superior de jornalismo. Ayrton Maciel é presidente do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco.’



O Estado de S. Paulo

‘Liberdade assegurada’, Editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 17/12/04

‘Por acordo de lideranças, a Câmara dos Deputados rejeitou em votação simbólica o projeto do Executivo que previa a criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ). Preparado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), ele foi encampado pelo presidente da República, cujos assessores não o advertiram em tempo para o grave equívoco político que estava cometendo. Ao tomar consciência disso mais tarde, Lula, sensatamente, não moveu um dedo para viabilizar sua aprovação. Pelo contrário, autorizou a própria bancada governista a tomar posição contra o projeto, o que acabou selando a sorte dessa que foi uma das mais desastrosas iniciativas dos setores mais radicais de seu próprio partido.

Deste modo, quatro meses após ter sido apresentado sob a justificativa de ‘orientar, controlar e disciplinar o exercício da profissão de jornalista’, o que deixaria a liberdade de imprensa, assegurada pela Constituição, nas mãos de algumas dezenas de burocratas nomeados pelo PT para cargos de confiança na administração pública, a proposta de criação do CFJ voltou ao lugar de onde jamais deveria ter saído. Ou seja, o limbo da história.

Por isso, das poucas críticas a essa oportuna decisão da Câmara, a mais dura partiu da Fenaj, a entidade que representa os interesses corporativos desses burocratas. ‘A esperança de milhares de jornalistas e a expectativa de segmentos sociais importantes foram enterradas pelos coveiros tradicionais da democracia e da organização da sociedade, aliados a inusitados novos cúmplices’, afirmou a diretoria da Fenaj, depois de acusar o Executivo de ter se aliado aos ‘patrões’ do setor de comunicações.

Na realidade, como há muito tempo já existe entre nós uma legislação específica disciplinando a conduta ética dos jornalistas, impondo-lhes severas sanções penais e pecuniárias nos casos de injúria e difamação, o tal conselho proposto pela Fenaj era um órgão desnecessário e ocioso para o que diz respeito aos crimes de imprensa. ‘A ética do jornalista vai na contramão da ética de outras profissões. Seu compromisso é com a denúncia, com a apuração dos fatos que surjam no subsolo da sociedade, nas engrenagens do Estado e nos sinuosos corredores do poder’, disse o relator, Nelson Proença (PPS-RS), ao propor a derrubada do projeto. ‘A atividade jornalística é intrinsecamente agressiva aos interesses de quem tem suas mazelas expostas por matéria publicada. Mas isso é socialmente legítimo, saudável e essencial à democracia’, concluiu.

Cercear o cumprimento desse compromisso do jornalista era o verdadeiro objetivo do projeto. Aliás, a má-fé da iniciativa da Fenaj era tanta que, se a criação do CFJ fosse aprovada, a primeira diretoria da autarquia, em vez de ser escolhida democraticamente por todos os profissionais de imprensa do País, seria indicada por essa federação sindical, cuja representatividade fora do jornalismo chapa-branca é igual a zero.

Era justamente esse o maior perigo do projeto. Nos países democráticos, a imprensa livre é constituída pela iniciativa privada. Por isso, se do ponto de vista editorial os veículos de comunicação têm ampla liberdade para definir suas posições políticas, do ponto de vista empresarial as atividades jornalísticas envolvem enormes responsabilidades financeiras e comerciais, como a conquista de anunciantes, a obtenção de receitas por meio da prestação de serviços e o pagamento de salários, de fornecedores e de impostos. Nesse universo, portanto, quem não tiver credibilidade não sobreviverá.

Com seu projeto, o que a Fenaj queria era interferir indiretamente na gestão dos veículos de comunicação, substituindo a independência editorial pela autocensura e pela propaganda oficial. Ou seja, jornais, revistas e emissores continuariam tendo obrigações empresariais, mas perderiam a liberdade de traçar suas políticas editoriais.

Felizmente, esse risco de manipulação dos jornais, uma prática comum aos regimes ditatoriais, foi afastado com a rejeição sumária do CFJ pela Câmara. Infelizmente, tudo indica que a luta que se iniciará brevemente no Congresso contra o mesmo tipo de cerceamento da liberdade de expressão na área da comunicação audiovisual – o projeto Ancinav – não será vencida com tanta facilidade.’



O Globo

‘Câmara rejeita projeto de criação do Conselho Federal de Jornalismo’, copyright O Globo, 16/12/04

‘A Câmara dos Deputados rejeitou ontem, em votação simbólica, o projeto do Executivo que previa a criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) com o objetivo de controlar e disciplinar a atividade jornalística. O relator do projeto, Nelson Proença (PPS-RS), recomendou que o projeto fosse rejeitado pelo plenário argumentando que a tentativa de regulamentação, proposta pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e endossada pelo governo Lula, resultaria em restrições à atividade jornalística.

– Essas propostas são recorrentes. Volta e meia retorna ao debate a idéia de regulamentar, restringir, coibir. Alguém já disse que o preço da liberdade é a eterna vigilância e isso vale para este caso – disse Proença.

Havia acordo de líderes para rejeitar projeto

Já havia sido feito um acordo entre líderes governistas e da oposição para rejeitar o projeto e desobstruir a pauta de votações da Câmara. O líder do PT, Arlindo Chinaglia (PT-SP), ao anunciar o apoio do governo à rejeição do projeto, assumiu compromisso de reapresentar o tema na pauta da Câmara após o recesso, no ano que vem. Chinaglia afirmou que, apesar de concordar com a rejeição em atendimento ao acordo, vai pedir que o Executivo envie no próximo ano um projeto propondo simplesmente a criação do conselho. Todo o debate sobre atribuições e composição, disse, se daria no Congresso.

– Nós da bancada do PT achamos muito importante que se crie um conselho de jornalistas. Temos a noção exata que o projeto do Executivo acabou contaminado por um debate que não houve, que esta Casa não fez e que quem acabou fazendo foi a imprensa – disse o líder.

A Federação Nacional dos Jornalistas divulgou nota criticando a rejeição da proposta.’

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‘Petista e comunista insistem na proposta’, copyright O Globo, 16/12/04

‘Mesmo com o acordo de líderes para rejeitar a proposta de criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ), houve polêmica em plenário. O projeto foi defendido pelos deputados Paulo Pimenta (PT-RS) e Daniel Almeida (PCdoB-BA). Diante dos discursos contrários à criação do Conselho, Paulo Pimenta reagiu:

– Sou jornalista por formação. A meu ver, seria desrespeitoso para a categoria dos jornalistas que esta Casa, ao rejeitar esse projeto, vendesse para a opinião pública a idéia de que aqui está sendo enterrada mais uma tentativa de se restabelecer a censura, a Lei da Mordaça.

Já os deputados Darcísio Perondi (PMDB-RS) e Fernando Gabeira (sem partido-RJ) criticaram a proposta argumentando que o país precisa de mais liberdade para a atividade jornalística.

– Não posso entender como esse Conselho formado de burocratas vai me orientar. Isso não tem sentido. O pior é que a constituição do Conselho é feita de tal maneira que a primeira direção seria a que está aí, a da Fenaj, composta de pessoas ligadas ao PT – disse Gabeira, acrescentando:

– Durante quatro anos teria a presença majoritária de jornalistas filiados ao partido do governo.’