Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Luciana Coelho

‘Com 8 milhões de muçulmanos nos EUA de acordo com o último censo (2000), é de se espantar que o ultra-segmentado mercado de TV por assinatura do país ainda não tivesse um canal dirigido a eles. Afinal, nos EUA há canais domésticos que passam exclusivamente produções do cinema indiano ou noticiários em chinês.

Pois esse cenário acaba de mudar. Na semana passada, foi ao ar a Bridges TV (‘pontes’, em inglês), o primeiro canal com 24 horas de programação produzida nos EUA para os americanos muçulmanos -dos programas de culinária e turismo aos desenhos animados, tudo tem inspiração na cultura islâmica.

‘Há 8 milhões de muçulmanos sem uma rede de TV para eles. Isso cria uma oportunidade tremenda para uma televisão que celebre tanto os valores americanos como os islâmicos’, disse à Folha o presidente e fundador da Bridges (ele também um muçulmano americano), Mozzammil Hassan.

Sem nenhuma formação televisiva e sem o capital necessário para investir, Hassan se aventurou na empreitada por incentivo da mulher, Aasiya. ‘Em dezembro de 2001, estávamos viajando de carro para Detroit quando percebemos que nas rádios só havia gente fazendo comentários negativos sobre os muçulmanos’, conta. ‘O 11 de Setembro havia acontecido dois meses antes. Minha mulher estava grávida na época e pensou que aquele não era um bom ambiente para criarmos nosso filho.’ Aasiya perguntou para Hassan por que ele mesmo não tomava uma providência.

‘Mas eu não tenho nenhuma formação televisiva. Minha formação é em finanças’, afirma. Pois o ex-banqueiro de 40 anos tratou então de fazer o que sabia. ‘Escrevi um plano de negócios e fui levantar o dinheiro.’

Segundo Hassan, 100% do financiamento da Bridges foi obtido nos EUA -não há, afirma, nenhum dinheiro estrangeiro envolvido. Na primeira fase, ele buscou investidores muçulmanos americanos. Numa segunda fase, os recursos vieram de um fundo de capital de risco em Wall Street. ‘Conseguimos levantar um bom dinheiro, e a primeira coisa que fiz foi contratar gente com experiência em TV.’

Embora Hassan afirme não favorecer profissionais de religião islâmica, seu quadro de funcionários é composto em 50% por muçulmanos, um percentual muito acima do da população do país.

Sem doutrinação

Com sede em Buffalo (NY), a Bridges entrou no ar no último dia 30, com sinal transmitido por satélite e alcance limitado. Antes mesmo de estrear, já tinha 50 mil assinantes. O próximo passo é passar a transmitir por cabo. ‘Nossa intenção não é doutrinar ninguém. Trata-se de boa TV. No máximo um convite para que os americanos entrem em nossa sala e possam nos entender melhor.’

Na primeira semana, a repercussão do canal foi majoritariamente positiva. Hassan deu entrevistas nas TVs abertas e nas duas principais redes de notícias a cabo, a CNN e a Fox News.

Na Fox, de linha editorial conservadora, foi indagado se o momento era adequado para a criação do canal. ‘Estamos no meio de uma guerra ao terror onde a maioria dos terroristas é muçulmana’, disse o outro convidado do programa, o radialista conservador Mike Gallagher. ‘O senhor não acha que criar uma TV islâmica nos EUA agora seria como criar uma TV em alemão quando os EUA combatiam os nazistas durante a Segunda Guerra?’

Hassan acha a comparação esdrúxula. Ademais, diz, seu canal não se pretende um veículo político. ‘Haverá um noticiário diário e um programa de debates sobre questões internacionais. Mas não pretendemos editorializar nosso noticiário’, afirma.’



Paulo Sotero

‘Televisão americana vive o crepúsculo dos âncoras’, copyright O Estado de S. Paulo, 12/12/04

‘A partida recente de Tom Brokaw, editor-chefe e âncora do principal noticiário da rede NBC, e o anúncio da saída, em março, de Dan Rather, da CBS, foram apresentados como marcos da história do jornalismo na televisão dos Estados Unidos.

Quarenta e um anos depois de Walter Cronkite, o antecessor de Rather na CBS, ter transformado o trabalho de apresentador de notícias num posto de incomparável prestígio e influência na vida americana, graças à sensibilidade e competência com que conduziu a cobertura do assassinato do presidente John F. Kennedy, as duas despedidas, mais a de Peter Jennings, na ABC, que não pode estar distante, marcariam o fim de uma era, segundo as inúmeras análises publicadas nos últimas semanas.

Para John Doolittle, um veterano produtor de noticiários e hoje professor titular de jornalismo de televisão na Escola de Comunicação da American University, em Washington, esta interpretação é simplista. ‘É verdade que a audiência dos noticiários das três redes abertas diminuiu muito nos últimos 20 anos’, disse ele ao Estado. ‘Mas a figura do âncora continuará, a meu ver, a ser um elemento importante de identidade das emissoras, como acontece, aliás, nos noticiários locais, que são hoje altamente rentáveis’, afirmou Doolittle.

‘A televisão a cabo, a internet, a universalização da comunicação sem fio abriram novas alternativas de informação para as pessoas.’ Segundo ele, os horários mais dilatados de trabalho das pessoas nos grandes centros também contribuíram para tirar audiência dos noticiários nacionais de meia hora, que são apresentados pelas emissoras afiliadas às redes entre as 18 horas e as 19h30, porque as pessoas agora chegam mais tarde em casa. ‘Mas esses programas são baratos e acho que serão mantidos em seu formato atual’, disse Doolittle. ‘E poderemos ter a surpresa de um evento novo dramático, como os ataques de 11 de setembro de 2001, que as redes cobriram de forma esplêndida, produzirem um novo Cronkite.’

Pelo critério da audiência, a era dos âncoras terminou há algum tempo. Em 1981, o Nightly News, da NBC, do Evening News, da CBS, e do World New Tonight, da ABC, atingiam 84% do público que tinha a televisão ligada no início da noite. Dois anos atrás, a audiência havia caído pela metade, para 43%, ou 30 milhões de pessoas.

Hoje, os três noticiários atraem apenas 26 milhões num país de 280 milhões de habitantes, que têm, em média, quase três aparelhos de televisão em casa. A idade média dos que assistem aos programas é 54 anos.

Mais importante do que as medidas quantitativas, porém, é a perda potencial de qualidade que a aposentadoria dos três grandes âncoras poderá trazer.

Com Brokaw, de 64 anos, Rather, de 72 anos, e Jennings, de 65 anos, saem de cena profissionais de uma geração de jornalistas de televisão de origem humilde, emocionalmente próximos do americano médio, que aprendeu e exerceu o ofício nas trincheiras do Vietnã e do Oriente Médio e nas coberturas dos grandes batalhas políticas domésticas que sacudiram os Estados Unidos nos anos 60 e 70, como o movimento dos direitos civis, os protestos contra a Guerra do Vietnã , a rebelião dos jovens e o escândalo do Watergate, nos 70.

Rather, do Texas, e Brokaw, de Dakota do Norte, vieram de pequenas cidades do interior do país, Jennings nasceu no Canadá e não chegou a completar o curso secundário. Dois anos atrás, Frank Rich, do New York Times, observou que as experiências pessoais e profissionais dos três jornalistas é parte essencial ‘da seriedade que a presença do âncora dá aos eventos que cobre’.

Brian Williams, de 45 anos, o sucessor de Brokaw na NBC, e John Roberts, de 47 anos, o herdeiro de Rather na CBS, não trazem a mesma bagagem.

Roger Ailes, o ex-publicitário e executivo que conseguiu abrir espaço para a conservadora rede Fox entre as três grandes, resumiu a diferenças entre os âncoras que estão saindo e os que estão chegando ao Times. ‘Brian Williams já esteve em Nova Jersey’, disse ele, com sarcasmo. ‘Williams é um bom leitor de notícia, um bom sujeito, e bastante inteligente.Mas não há como inventar a experiência que confere seriedade e credibilidade ao âncora’, disse ele. Quanto a Roberts, Ailes previu que, quando ele assumir a cadeira de Rather, em março, ‘a CBS lhe dará 13 semanas, e, se ele não conseguir aumentar a audiência, diminuir a idade média do público do seu programa e produzir mais dólares, perderá o posto e terminará como âncora do noticiário local em Detroit’.

Uma mudança que o ocaso das carreiras de Brokaw, Rather e Jennings certamente trará é um realinhamento salarial dos âncoras para baixo. Beneficiários de uma acirrada competição por talentos entre as redes, que começou no início dos anos 80, os três sempre admitiram que são – nas palavras de Jennings – ‘inacreditavelmente bem remunerados’. O âncora da ABC, que é tido como o mais bem pago, ganha entre US$ 7 milhões e US$ 10 milhões por ano. No mercado, estima-se que Williams ganha no máximo um terço disso e que Roberts terá de se contentar com menos.’



Frazier Moore

‘Saindo, Moyers lamenta falta de imprensa independente’, copyright O Estado de S. Paulo / Associated Press, 12/12/04

‘Bill Moyers, famoso jornalista de televisão que vai aposentar-se nesta semana, depois de 30 anos de trabalho, criticou os veículos da ‘imprensa de direita’ por terem se tornado uma máquina de propaganda do Partido Republicano do presidente George W. Bush.

Moyers, que ganhou mais de 30 prêmios Emmy e 10 Peabody, também lamentou o que chamou de falta de uma imprensa independente nos EUA. ‘Vou sair contando uma história que considero a maior história de nossa época: como a mídia de direita se tornou um braço de propaganda do partido republicano’, disse Moyers. ‘Temos uma imprensa ideológica interessada na eleição dos republicanos, e uma imprensa acomodada que só se interessa pelo dinheiro’, disse ele. ‘Portanto, não temos uma imprensa independente vigilante cujo interesse seja o povo americano.’

Nesta semana, Moyers, de 70 anos, vai despedir-se de Now, programa semanal da rede pública PBS, que começou em 2002. Antes disso, ele produziu centenas de horas de programas da PBS e passou uma década na CBS. É um humanista que se sente à vontade com temas que vão do poder do mito até a consolidação da mídia, do vício das drogas à dança moderna, da religião ao abuso ambiental. Moyers produziu uma programação diversificada sobre assuntos que outras emissoras não dão muita importância, fazem questão de minimizar ou simplesmente não noticiam.

Nesse período, ele via seu público não como consumidores, ou eleitores divididos entre liberais e conservadores, mas como seus compatriotas. Ele é um jornalista-cidadão com uma bagagem robusta. Este nativo do Texas desde o início ganhou um grau de divindade – ele é um ministro batista. Serviu como assistente especial do presidente Lyndon Johnson e durante muitos anos foi publisher do jornal de Long Island, Newsday.

Em 1971, foi para a TV pública como âncora de This Week e do Bill Moyer’s Journal e, depois, foi para a CBS News para fazer o mesmo tipo de programação orientada para a cidadania. Então, em 1986, ele e sua mulher, Judith Davidson Moyers, se tornaram seus próprios patrões ao formar a Public Affairs Television, uma produtora independente que não só fazia documentários, mas pagava por eles com o próprio esforço de financiamento.

‘Judith e eu vamos levar vários meses para nos recuperarmos’, disse Moyers recentemente. ‘Depois, vou pensar sobre o Último Ato – U maiúsculo e A maiúsculo – da minha vida.’ Ele tem um projeto imediato: um livro que vai escrever sobre o tempo que passou ao lado de Johnson. Mas não tem em mente nada para a TV.

Nos últimos dias de Now, Moyers disse ter orgulho da série, que na estréia há três anos ele via como ‘um formato flexível para idéias e conversas, reportagem e debate’. Com 2,4 milhões de espectadores semanalmente, Now vai continuar sob o comando de seu valoroso co-apresentador, o jornalista David Brancaccio.’



Franthiesco Ballerini

‘Búlgara chegou à CNN após colapso soviético’, copyright O Estado de S. Paulo, 12/12/04

‘Ralitsa Vassileva é âncora da CNN desde 1992. Fez entrevistas memoráveis com o ex-líder soviético Mikhail Gorbachev, o primeiro-ministro Ariel Sharon e o ex-secretário de Estado dos EUA Henry Kissinger. Nascida em Sófia, Bulgária, ela agradece a Gorbachev a possibilidade de ter saído do país – onde era âncora de TV – e ido com o filho morar em Atlanta, sede da CNN.

Em entrevista ao Estado, ela diz que a CNN nunca se ‘ajoelharia’ a pressões do governo americano na cobertura de guerras.

Qual foi a entrevista mais polêmica que você já fez?

Uma hora após o ataque terrorista de Madri (em março), entrevistei a chanceler da Espanha, Ana Palacio. Ela não parava de insistir que a ETA era a única responsável. Mas eu tinha dúvidas, lendo as pistas superficiais que tínhamos do ataque. Percebi algumas marcas da Al-Qaeda, não da ETA. Então, comecei a pressioná-la. Uma semana depois foi comprovada a autoria da Al-Qaeda. Fiquei aliviada por seguir meu instinto.

Você nasceu na Bulgária, ex-satélite soviético. Entrevistar Gorbachev foi importante?

Sim, estava muito nervosa porque era um entrevistado que me afetava pessoalmente, pois meu povo o via como um responsável pelo fim do comunismo sem derramamento de sangue. Em 1991, fiquei uma semana com medo de não poder vir aos EUA e aceitar o trabalho da CNN na época em que a URSS estava em colapso. Ele me revelou que não pretendia desmantelar a URSS, pois acreditava no comunismo, achava que podia reformá-lo. Gorbachev é incrível, sabia cada detalhe dos problemas e da cultura búlgara. Fiquei impressionada. Algum tempo depois, eu estava em um restaurante de Moscou e ele e a mulher almoçavam numa mesa ao lado. Ela me convidou para almoçar com eles. Em um dado momento, ouvimos uma explosão perto de um supermercado. Mikhail disse, tranqüilo: ‘Ah, é trovão’. Fiquei de olho na janela e vi fumaça. Liguei para meu produtor. Soube depois que era uma explosão de gás dentro de um restaurante, mas pensei, em um momento, que fosse um atentado.

Quem foi o entrevistado mais evasivo nas respostas?

Um grande desafio que eu tive foi com Ariel Sharon, quando ainda não era primeiro-ministro. Entrevistei-o na época em que fez uma visita ao Domo da Rocha, em Jerusalém, que deflagrou a segunda intifada. Foi uma visita provocadora e a entrevista era sobre isso, mas ele não via o ato como provocação. Achava que estava no seu direito, que poderia ir aonde quisesse, porque ‘é um país livre’, como me disse. Foi dificílima a entrevista porque se trata de um tema em que há muita emoção nas respostas. É preciso respeitar os pontos de vista, mas eu precisava de respostas também.

Existem pressões do governo para não mostrar os corpos dos soldados americanos na TV?

No caso da CNN, trata-se de uma política interna da empresa. Nós mostramos corpos, mas não mostramos brutalidades sangrentas. Somos uma empresa privada, sem participação do governo. Se houve pressão do governo eu nunca soube, mas acho que nunca nos ajoelharíamos para isso.

O que você acha dos jornalistas ‘embedded’ (os que viajam com as tropas)?

Nunca fui ‘embedded’, mas entrevistei muitos deles e notei que suas reportagens, infelizmente, não mostram tudo que se passa. Eles estão cobrindo apenas uma parte ínfima do que acontece. De qualquer modo, é melhor que nada. Estas são as regras da guerra e é melhor do que não estar lá.’



EUA / ECOS DA GUERRA
O Estado de S. Paulo

‘Repórter induziu crítica a Rumsfeld’, copyright O Estado de S. Paulo, 11/12/04

‘Um repórter americano do jornal Chattanooga Times incorporado a uma unidade da Guarda Nacional do Tennessee ajudou alguns soldados a elaborarem perguntas feitas na quarta-feira ao secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, em sua visita a uma base no Kuwait. O jornal admitiu ontem que deveria ter dado essa informação aos leitores.

O caso veio à tona porque o jornalista Edward Lee Pitts contou a colegas, num chat na Internet, que ajudou os soldados a formularem as perguntas, já que a imprensa não iria participar do encontro.

‘Elaboramos antecipadamente as questões para Rumsfeld sobre a aterradora falta de blindagem dos veículos de combate’, disse Pitts.

Na quarta-feira, o soldado Thomas Wilson quis saber quando as tropas teriam equipamento adequado, já que são obrigadas a buscar pedaços de destroços e de vidros blindados no lixo para proteger os veículos. Muitos soldados aplaudiram a pergu nta. No dia seguinte, o presidente George W. Bush disse que o governo tomaria providências para resolver o problema.

HELICÓPTEROS

No Iraque, dois helicópteros americanos s e chocaram numa base aérea em Mossul, segundo o comando militar dos EUA dois soldados morreram e quatro ficaram feridos. Um helicóptero Black Hawk colidiu com um Apache que estava no chão.

A Comissão Eleitoral iraquiana prorrogou ontem o prazo para a inscrição de candidatos na eleição de 30 de janeiro para a Assembléia nacional. O prazo expirava ontem e foi estendido até o dia 15.

ABUSOS

O sargento Johnny Horne se declarou culpado do assassinato de um rebelde iraquiano de 16 anos, em agosto, e pode pegar 10 anos de prisão. Horne foi um dos militares que encontraram o rapaz ferido e o mataram, para ‘pôr fim a seu sofrimento’.’