Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Marcelo Russio

‘Olá, amigos. No fim de semana do Natal aproveitei para descansar bastante vendo os programas de TV por assinatura. As retrospectivas esportivas de fim de ano e os programas especiais tomaram boa parte do meu tempo. Uma coisa, na ESPN Internacional, me chamou atenção: o Campeonato Mundial de Pôquer (a World Series of Poker, chamada por eles assim por problemas já discutidos nessa coluna, como o provincianismo dos EUA e a mania que eles têm de achar que tudo que acontece lá é mundial).

Conheci pessoas ao longo da vida que tinham e têm no jogo um problema sério. São viciados compulsivos, que não conseguem parar de jogar e perdem muito (ou quase tudo) em uma mesa de carteado, roletas, apostas ou o que mais estiver à mão. Isso pode não ser um problema para boa parte das pessoas, mas para muitos é a verdadeira ruína, causa principal de tragédias familiares e de sérios problemas. Me chamou a atenção o tratamento quase heróico dispensado aos jogadores, com perfis sedutores e tudo mais. Não houve preocupação em mostrar o quanto se perde em uma mesa de carteado, ou que normalmente quem ganha mil já perdeu 10 mil. E é essa a verdade, é exatamente isso que acontece.

O programa mostra que o perdedor de uma mesa sai com uma bolada de cerca de 70 mil dólares. Nada mal, não? Você vai lá, senta numa mesa, perde de todo mundo e sai com 70 mil dólares. Isso é irreal, e pode incentivar jovens sem muita coisa na cabeça a entrar no jogo com a expectativa de ganhar isso de vez em quando. Ou seja, em última análise, incentiva o jogo e a aposta, sem mostrar o quanto se perde. Glamuriza o lado bom e esconde o lado ruim. Fazendo uma comparação exagerada, seria o mesmo que mostrar um campeonato de consumo de cachaça no qual o vencedor sai com um milhão de dólares no bolso e o cara que bebeu quatro doses saiu com 70 mil dólares como prêmio de consolação. É ou não é um incentivo a beber? Claro que sim.

O problema do vício no jogo é que ele não é químico, mas sim psicológico. Dá a impressão que a pessoa pára na hora em que quiser. Mas não é bem assim. O jogo desmedido, praticado por quem não consegue se controlar, é um mal que acomete muitas, mas MUITAS pessoas. E uma rede de TV especializada em esportes deveria ter a responsabilidade e a sensibilidade de não veicular como uma atração esportiva algo que traga mais malefícios que benefícios para os seus telespectadores.

Se for para transmitir uma atração como essa, pelo menos que o faça por completo, mostrando os malefícios do jogo e as ruínas que este vício já trouxe para tanta gente. Aí sim, seria responsabilidade de quem assiste decidir o que quer para si. Informando, e não vendendo, a emissora faria um bem muito maior a quem a assiste.

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Também assisti pela milésima vez ao DVD ‘Pelé Eterno’. E, como tempo não era problema, me detive em dois lances bastante curiosos:

1) Na hora em que Pelé fez o seu milésimo gol, um jogador do Vasco comemora e, logo em seguida, tenta se mostrar desolado. A câmera que filma o lance por trás do gol capta essa cena. Não consegui identificar o jogador, mas ele está no canto esquerdo da imagem. Após Andrada quase defender a cobrança, o jogador comemora e, em seguida, vai consolar Andrada, meio sem jeito. Quem souber o nome deste jogador, por favor me escreva.

2) No jogo Brasil 1 x 0 País de Gales na Copa de 1958, a jogada do gol da vitória, marcado por Pelé, é curiosa. Didi passa a bola para Pelé e corre para receber na frente, posicionando-se perfeitamente para concluir em gol. Ao invés de devolver a bola para Didi, Pelé faz a jogada individual e chuta para marcar o gol salvador. Todos os jogadores correm para comemorar com Pelé dentro do gol. Todos menos Didi, que vê a bola entrar e volta para o meio-campo sem dar o menor sinal de satisfação pelo gol marcado.

Os mais velhos contam que Didi era o verdadeiro dono do time, era a autoridade máxima em campo, dividindo a liderança com Nílton Santos e Zito. Todos os respeitavam, com inteira justiça, por sua experiência e genialidade. Fiquei imaginando o que aconteceria se Pelé não tivesse feito o gol. O jovem de apenas 17 anos certamente teria recebido uma das maiores broncas de sua vida dada pelo Mestre Didi.’



TV DIGITAL
Graça Rossetto

‘Deja vu sobre as maravilhas da nova TV’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 29/12/04

De tudo o que se lê sobre a implantação da TV digital no Brasil de forma alguma o princípio básico do jornalismo hard news pode ser questionado. Sempre são ouvidos os dois lados, e apresentados os prós – com possibilidades infindáveis da nova tecnologia na vida dos cidadãos – e os contras – que, sem dúvida, significa altos custos de implantação e comercialização.

Anyway, como diria o típico americano, é no mínimo intrigante não perceber em toda essa discussão uma mínima comparação com o que foi a implantação da televisão por assinatura no Brasil. Estaria eu vendo bugalhos no lugar de alhos?

Vamos aos fatos: Quando da aprovação da louvável Lei nº8.977 de 6 de janeiro de 1995, a chamada Lei do Cabo, que regulamentava os primeiros passos da TV paga brasileira através do sistema de distribuição via cabos, muitas empresas disputavam a portas principalmente fechadas o controle do que seria uma verdadeira revolução no modo de ver TV. As possibilidades eram ainda maiores do que a diversidade de canais que estavam por surgir.

Muito antes disso, no entanto, a maravilha distribuída, fosse por cabos ou canais em freqüência UHF, funcionava na ilegalidade. Cabe lembrar ainda que, por falta de know how nacional, quem tirou proveito do novo sistema a princípio foram empresas estrangeiras, sobretudo corporações argentinas.

Enfim regulamentada, através de Lei, Portarias e Decretos, as previsões eram as melhores possíveis e as possibilidades inesgotáveis. Mas, devido à constante crise econômica verde-amarela, ao sempre baixo poder aquisitivo da população e ao inevitável alto custo da nova engenhoca, o sistema não prosperou, e as previsões de pelo menos 5 milhões de assinantes no ano 2000 ficaram no passado ressentido, que no presente contabiliza um número real, sem grande crescimento, de 3,5 milhões de assinantes. De qualquer forma, somos brasileiros, não desistimos nunca, e os números hão de melhorar!

O que cresceu, no entanto, foi o número de trabalhos científicos sobre o tema. Enquanto a economia lamenta, a academia agradece! Pesquisando todos os trabalhos da área de comunicação que tratam sobre o tema, foi verificada a primeira publicação no ano de 1982, por Berta Maria Sichel*. Esse número foi crescendo conforme aqueciam-se as discussões sobre o tema, tendo seu ápice em 1998, com 33 publicações científicas entre artigos, capítulos de livros, livros, monografias, dissertações, teses, trabalhos publicados em eventos e sites. Ao todo, foram encontradas 187 publicações, pesquisadas até o ano de 2003 em bancos de dados online e nas bibliotecas das principais instituições de ensino superior de comunicação do país. O número pode não ser dos melhores, mas sem dúvida é muito bom comparado com a lógica que permeia o dito advento da televisão paga.

Então, enquanto continuam as discussões sobre o padrão a ser implantado, a regulamentação e a viabilidade da inserção da novidade na frágil economia canarinho, segue a dica que guiou os estudos científicos da TV paga brasileira. Arrisco dizer que assim como na implantação da maravilha de outrora, os pesquisadores enxergaram mais rápido do que o mercado as possibilidades de explorar essa tecnologia.

O futuro virá. Espera-se que, além da academia, a economia também agradeça desta vez.

*SICHEL, Berta Maria. Novas tecnologias de comunicação: dos satélites aos microcomputadores. Cadernos Intercom, São Paulo, ano 1, n.4, outubro 1982, p.6-19.

(*) Jornalista’



O APRENDIZ
Laura Mattos

‘O aprendiz ganha emprego de escritor’, copyright Folha de S. Paulo, 3/01/05

‘‘Money, money, money, money’, diz a música do ‘reality show’ ‘The Apprentice’ e de sua versão brasileira, ‘O Aprendiz’. É exatamente disso -dinheiro, dinheiro, dinheiro, dinheiro- que se trata o livro recém-lançado pelo empresário Bill Rancic, vencedor da primeira versão nos EUA.

Na Record, nem a vencedora Viviane nem seus concorrentes chegaram aos pés do norte-americano em admitir o quanto sua vida é movida por cifrões. ‘Algumas das minhas primeiras lembranças da infância têm a ver com dinheiro. Ganhar dinheiro, contar dinheiro, guardar dinheiro e, logo, logo, investir dinheiro. Mas o mais importante dessas lembranças tem a ver com o quanto parecia curtir ganhar dinheiro.’

Antes do prefácio escrito pelo milionário Donald Trump (o apresentador nos EUA), Rancic mostra a que veio com a seguinte frase do cineasta Woody Allen: ‘Ter dinheiro é melhor que ser pobre, nem que seja só por razões financeiras’. Na introdução, promete que ‘O Aprendiz’ (Landscape, 188 págs., R$ 19,90) não será um livro ‘tradicional sobre vendas’ nem sobre sua história. Ou seja, não é mais um livro de auto-ajuda na linha ‘como fazer amigos e influenciar pessoas’.

Só a divisão dos capítulos já mostra que, para ele, promessa não é dívida: ‘Um: O espírito empreendedor. Lições aprendidas sobre objetivos’; ‘Dois: A hora de dar partida. Lições aprendidas sobre valores’, ‘Três: Um bom preço. Lições aprendidas sobre estratégia’… É preciso dizer mais?

O contratado de Trump, que dirige um projeto de construção civil do milionário, transforma passagens de sua vida e do programa em ‘lições’ para o sucesso. Nem Denis, vice-campeão no Brasil e acusado de ser arrogante, chegaria perto da falta de modéstia do autor. ‘Aqui vai outra história (…) que tem tudo a ver com as formas criativas com que tendo a olhar para o mundo’, escreve.

Pouco menos blablablá é quando fala sobre o ‘reality’, que, para ele, ‘não tem realidade’. Diz que o pai, já morto, teria orgulho dele, apesar da ‘onda ridícula’ que pegou em razão da atuação em ‘O Aprendiz’. E revela que participantes traíam uns aos outros para salvar a própria pele. Como diz Roberto Justus, nosso Trump, nada pessoal, só negócios.’