Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Moacir Japiassu

‘O considerado Fernando Lobo, que não é o compositor do genial Chuvas de Verão, despacha notícia do Diário do Rio Doce, de Governador Valadares. Homiziado sob o título Sucateiro é esfaqueado dentro de casa, lê-se:

O sucateiro Ângelo Resende Alves, de 25 anos, foi encontrado morto dentro de sua casa, no centro de Galiléia, a 65 quilômetros de Valadares. O crime aconteceu na noite de domingo e, segundo a versão de familiares do rapaz, há algum tempo ele vinha sofrendo de depressão e já havia tentado se matar. Mas a possibilidade de ter havido um suicídio foi descartada pela polícia, já que o corpo tinha várias facadas nas costas, no peito e uma faca cravada no pescoço.

Fernando ficou impressionado com a eficácia da polícia daquele sertãozão do Vale do Rio Doce: ‘A população deve estar muito bem protegida, hein?’.

É verdade, Fernando; Janistraquis está convencido de que não é falta de segurança a responsável pela migração patológica do pessoal de Governador Valadares para os Estados Unidos.

Aliás, por falar no assunto, a coluna recomenda a leitura do sensacional livro de José Inácio Werneck, intitulado Com Esperança no Coração: Os Imigrantes Brasileiros nos Estados Unidos. Acaba de ser lançado pela Augurium Editora e o prefácio saiu, modéstia à parte, da lavra deste humilíssimo colunista.

Jogão

Depois de vários insucessos, com Ronaldo Fenômeno jogando pior que o Dimba, o timaço do Real Madri deu de 5 a 0 num time chamado Levante. Janistraquis, que não acompanhou o ‘clássico’ pela TV mas viu chamada nos jornais, comentou:

‘É, considerado…o adversário se chamava Levante, donde se conclui que estava deitado ou, na melhor das hipóteses, sentado.’

Data venia

Impressionante e dolorosíssima notícia que saiu em tudo quanto é jornal, rádio e TV do Brasil e, certamente, ecoou mundo afora:

Exame de Ordem da OAB-SP reprova mais de 90% dos inscritos

A Ordem dos Advogados do Brasil, seção São Paulo, divulgou nesta quinta-feira (25/11) o resultado final do Exame de Ordem 124, realizado em setembro (1ª fase) e outubro (2ª fase) que aprovou apenas 8,57% (1.686 bacharéis) dos 19.660 inscritos.

‘Estou profundamente chocado com esse resultado, o pior da história do Exame de Ordem, em São Paulo e no país’, afirma o presidente da Seccional Paulista, Luiz Flávio Borges D´Urso. Até então no último Exame de Ordem , promovido no primeiro semestre deste ano, a OAB-SC tinha aprovado apenas 12,77% dos inscritos e São Paulo, 13,21%.

Janistraquis leu e suspirou: ‘Tá vendo como tenho razão, considerado? O analfabetismo é tão espetacular que a gente nem pode confiar na competência dos poucos aprovados. Afinal, quantos desses não estarão fazendo besteira amanhã, enfiados numa bem desenhada toga?’.

É mesmo de arrepiar…

Sempre alerta

O considerado Rafael Silvestre leu aqui mesmo no primeiro caderno do C-se:

Sunday Times: jornalistas franceses estão vivos

Da Redação

Fonte: Folha de S. Paulo

O jornal londrino Sunday Times afirmou que assistiu a um vídeo em que aparecem os jornalistas franceses Christian Chesnot e Georges Malbrunot. Eles teriam dito que estão com saúde e que só aguardam ser libertados em breve.

Eles são reféns há quase três meses no Iraque.

Perplexo com a ‘personificação’ do jornal, Silvestre protesta:

Escrever desse jeito dói na alma, não é? O Sunday Times deve ser uma pessoa atenta a tudo!!!!

Janistraquis, que andou acamado (andar acamado é das boas, né mesmo?) por causa de um ataque de gota, completa:

‘Dói na alma e piora bastante o estado do dedão do pé…’.

E olhem que meu secretário, como todo bom sertanejo, está acostumado a prosopopéias nas quais burro fala e cachorro-do-mato responde!!!

De costas

O considerado Celsinho Neto, diretor desta coluna no Nordeste, lia O Povo quando foi devidamente entroviscado pelo textinho que falava das muitas escolas cearenses que estão sendo fechadas:

Entre as respostas da secretária de Educação, algumas foram encaradas de frente, como o fato de ter tomado decisões que afetam a sociedade sem ter aberto um amplo leque de discussões.

Celsinho meteu os pés da rede armada na Praça do Ferreira:

‘Encaradas de frente? Oxente, e existe a possibilidade de encarar alguma coisa de costas? O considerado e os leitores da coluna me perdoem, mas sempre ouvi dizer que o olho que temos atrás é cego…’

Janistraquis não se sente abalizado para discutir essa propalada cegueira, Celsinho, mas concorda: essa de O Povo é mesmo difícil de encarar.

Velhos tempos

O considerado Robertão Porto recordava algumas aventuras de Arthur Parahyba, nosso amigo e companheiro do JB dos anos 60, morto recentemente, quando foi assaltado pela lembrança de maravilhoso título perpetrado pela editoria de esportes de O Globo, naquele tempo comandada por Ricardo Serran:

Prepara-se o Peru para o Mundial Feminino

Robertão era menino e assustou-se com a ousadia do redator:

‘Fiquei a imaginar como seria o preparo do peru; levanta, baixa, fica a meio-pau?…’

Outro susto de Robertão aconteceu também na década de 60, quando leu o seguinte título d’A Gazeta Esportiva:

Choque de locomotivas amanhã em Araraquara

Ele recorda:

‘Menino novo no pedaço, pensei que se tratava de premonição de Chico Xavier. Depois, Oldemário Touguinhó me explicou que era um jogo entre a Ferroviária e outro time paulista (não me recordo qual) de ligação com as estradas de ferro.’

Janistraquis aproveitou para imitar o saudoso Itamar Franco: ‘Trem doido, sô!’.

Teje preso!

O considerado Roldão Simas Filho, diretor da sucursal desta coluna no Planalto, de onde se pôde escutar Lula e Zé Dirceu a comemorar a quebra de sigilo bancário do vice-prefeito eleito de São Paulo, Gilberto Kassab, pois Mestre Roldão organizava seu arquivo de perplexidades quando deparou com matéria em que o Correio Braziliense recordava a chamada Intentona Comunista de 1935.

Sob o titulinho Lembrança viva de luta, lia-se:

A musiquinha nunca saiu da mente de Maximiro, que mandou: ‘Praia maravilhosa/cheia de balas mil/ vermelha e radiosa / redentora do Brasil’. A letra se refere à Praia Vermelha, no Rio, onde ficava o Pavilhão dos Primários da Casa de Detenção.’

Roldão, homem decente e temente a Deus e às leis, mas que sabe o endereço das históricas penitenciárias desta inimputável nação, reclamou:

Trata-se de um equívoco do jornalista. A letra da paródia se refere à Praia Vermelha, onde ficava o 3º Regimento de Infantaria que se rebelou e cuja revolta foi esmagada pelo Governo. A Casa de Detenção ficava no complexo do presídio na rua Frei Caneca, no Estácio.

Curiosa coincidência é que o nome da praia nada tem a ver com a cor símbolo dos comunistas mas sim com a tonalidade das suas areias.

Preconceito

O considerado Jorge Serrão, editor-chefe do Alerta Geral, que nos conta tudo da política (menos os boatos!) pelo telefone 21-4003-6900, pergunta:

Você votaria em César Maia para presidente da República?

Janistraquis responde que está indeciso, porém desabafa: ‘Considerado, depois de Lula, qualquer um, até César Maia, pode ser presidente do Brasil!’

Não concordo com tais preconceitos; Lula faz um governo inesquecível e César Maia, economista preparado e respeitado, iria transformar o Brasil numa grande potência se fizesse, nacionalmente, o que tem feito na prefeitura do Rio!!!

Nota dez

O texto mais ‘abusado’ da semana é de Carlos Heitor Cony, em ingente peroração no Observatório da Imprensa e cujo final antológico é este:

(…) Reitero que não pedi as quantias que ainda não recebi. Se a lei me facultasse estabelecer o valor das mesmas, teria pedido mais. Quanto ao destino que darei ao pagamento daquilo que a Viúva me deve – e deve a milhares de brasileiros – é assunto meu. Agradeço e louvo as sugestões de doar o dinheiro ao Estado ou a institutos de caridade. Prefiro seguir o exemplo de Rabelais: nada tenho, devo muito, o resto – imitando a senhora Ana Leocádia Prestes – deixo aos pobres.

Leia a íntegra aqui.

Errei, sim!

‘TEXTO ENROLADO — Nosso mais novo correspondente gaúcho, Marcelo Soares da Silva, de Porto Alegre, envia nota do Correio do Povo pela qual é possível avaliar a escolaridade de cartolas do futebol, empresários e (por que não dizer logo?) jornalistas. Ei-la: Gomes, caso complicado é o título; texto-charada: ‘O Cruzeiro quer Luís Fernando Gomes, diz que está tudo certo com o Internacional, mas que o empresário português Manuel Barbosa está complicando tudo. O Inter afirma que vende o jogador por 600 mil dólares, dos quais 400 mil ficam com o clube e 200 mil com o empresário. Manuel Barbosa, por sua vez, garante que é o contrário: ele fica com 200 mil e o Inter, com 400. Um caso muito complicado.’

Leiam, releiam e concluam: textinho enrolado esse do Correio, não?’ (junho de 1995)’



LÍNGUA PORTUGUESA
Deonísio da Silva

‘Metrossexual sem rodeios’, copyright Jornal do Brasil, 6/12/04

‘O atual latim do império fez com que metrossexual, neologismo criado pelo escritor inglês Mark Simpson, fosse adotado por várias línguas, incluindo a portuguesa, para qualificar um tipo específico de homem, vaidoso de sua aparência.

O novo comportamento masculino surgiu na década de 1990, quando os homens também passaram a cuidar da fachada, antes uma exclusividade feminina. Até então eram privilegiados outros quesitos masculinos: a juventude, a força física, a estatura, o sucesso profissional visto sob o ângulo de propriedades e saldos bancários e, em menor grau, a inteligência.

Valores como a delicadeza no trato e roupas bem cuidadas semelhavam coisas de mulher. Campinas, em São Paulo, e Pelotas, no Rio Grande do Sul, ganharam fama injusta e, por preconceito, receberam a pecha de ‘capitais da veadagem nacional’ pelo esmero com que educaram seus filhos. Serviram de pretexto para insinuar homossexualidade a roupa e os modos polidos dos moços, então acusados de ‘veados’, designação chula do discurso machista.

O metrossexual mora nas grandes cidades. Poderíamos ter um metrossexual rural? Na verdade, já o temos, desde a década passada. É o ‘agrobói’ que, em companhia da ‘agrogirl’, abre seu sorriso exportador, indicador do sucesso do agronegócio. Mas ele não mora em metrópoles. Os centros de difusão, se o registraram, não o acolheram. Além do mais, veste-se com outros cuidados, freqüenta rodeios e não boates.

Lojas, clubes, academias de ginástica e cabeleireiros, importantes na construção das mitologias e lendas urbanas, apesar de existirem também em médias e pequenas cidades, não têm ali a propulsão necessária à construção de modelos.

A figura emblemática de metrossexual é o jogador inglês David Beckham. Não é um Pelé ou um Maradona, mas é um craque mundial. Cuida dos cabelos, da pele, das unhas, das roupas, dos sapatos, numa palavra, da aparência. Seus ternos, camisas e gravatas são observados com o intuito da imitação. Antes dele, talvez o primeiro metrossexual tenha sido o catarinense Falcão que, entretanto, não estava mais na ribalta quando o termo surgiu.

Vejamos como uma nova palavra ganha o mundo. Em primeiro lugar, é indispensável que seja proferida ou registrada num dos latins do império, de preferência o inglês. Neologismos chineses, árabes, hindus e russos, por exemplo, apesar de falados por bilhões de pessoas, não são acolhidos, a menos que uma língua franca na Galáxia Gutenberg os recolha e adote. Nesta função, é indispensável o papel da imprensa, da música ou do cinema. Se as instâncias de adoção forem outras, a tarefa de disseminação caberá exclusivamente à imprensa.

Assim, metrossexual, palavra surgida em 2002, teve como berço a revista eletrônica Salon.com, em que Mark Simpson delineou o perfil de David Beckham, apresentando-o como o primeiro caso de metrossexual.

O escritor inglês, como todos os que fazem da palavra sua ferramenta de trabalho, não descuidou, consciente ou inconscientemente, da etimologia. Com a habitual obsessão da linguagem coloquial por tudo simplificar, ‘metropolitan’ foi reduzido a ‘metro’ apenas. E ‘sexual’ teve o ‘s’ inicial duplicado porque em português, não fosse tal providência, teria som de ‘z’.

Embutido no significado vem, porém, o que não é dito, o conjunto de preconceitos. O metrossexual é aferido por oposições: é homem e não mulher ou guei; jovem e não velho; rico e não pobre; bonito e não feio. A beleza tem padrões. Os primeiros instrumentos para aferi-la são a fita métrica e a balança. E depois, como sempre, as palavras. Por isso, em antigos concursos de miss, era recomendado que as candidatas abrissem a boca apenas para sorrir. Prevaleciam misses emudecidas a bem da etiqueta.’



A ARTE DE ESCREVER BEM
Clara Arreguy

‘Por um bom texto’, copyright Correio Braziliense, 2/12/04

‘Mesmo que as tecnologias se desenvolvam e cada vez mais as pessoas escrevam como bem entendem, ou com a ajuda de corretores automáticos em computador, todo mundo sabe a importância e o sabor de um bom texto. Daí a utilidade de um livro como A arte de escrever bem – Um guia para jornalistas e profissionais do texto, que as jornalistas Dad Squarisi e Arlete Salvador acabam de lançar, pela Editora Contexto, e já está nas livrarias. Basicamente são regras e dicas para profissionais da escrita, mas os ensinamentos que as duas conseguiram reunir no volume acabam sendo úteis para qualquer interessado.

Organizado como manual de redação e estilo, o livro possui capítulos que buscam cobrir as principais áreas de dúvidas comuns a leitores e potenciais escritores. A garimpagem do óbvio (título do primeiro capítulo) compreende o histórico do texto jornalístico em sua origem na própria estruturação do pensamento, que determina a estrutura do texto e variáveis como o novo jornalismo, que introduz elementos literários no trabalho da imprensa.

No segundo capítulo, O texto jornalístico, vão as dicas mais curtas e diretas, facilitadas inclusive pela diagramação do livro, que alinha tópicos e ilumina lembretes. Falam da opção pelas frases e palavras curtas, a voz ativa e a ordem direta como mais simples; a busca da palavra exata; concisão e clareza como metas do texto harmonioso e legível.

O terceiro capítulo analisa os vários gêneros de reportagem, como especiais, factuais, perfis, opinativas etc. Entre os toques finais do último capítulo, as jornalistas falam da ética das palavras, ensinam a fugir do lugar-comum (inclusive com extensa relação do mais usados. Encerram o livro explicando a importância da rapidez na produção do texto, que acaba impondo limites à própria qualidade do produto final – mas como jornalismo é indústria, com prazos rigorosos que, perdidos, implicam em prejuízos para as empresas, a pressão do fechamento prepondera sobre qualquer burilamento que se pretenda.

Dad Squarisi é editora de Opinião do Correio Braziliense, assina coluna de dicas de português duas vezes por semana no Caderno C e leciona a matéria. Já publicou diversos livros sobre o tema. Arlete Salvador exerceu diferentes funções em jornais e revistas de circulação nacional, como repórter, editora, colunista política e chefe de sucursal.’