Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Silvana de Freitas


‘O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, disse ontem que a imprensa faz ‘um manchetismo danado’, minimizando as suspeitas de corrupção no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criadas pela entrevista do presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson.


‘O Brasil está passando por momentos difíceis? Está. A imprensa hiperavalia isso, faz um manchetismo danado. Isso é da vida. A gente não deve se apavorar nem se amedrontar por causa disso’, afirmou Fonteles, no início da noite de ontem, ao discursar na posse de novos procuradores da República. ‘A crise é o alimento da democracia. Só o ditador não gosta da crise’, afirmou.


O procurador-geral tem o poder exclusivo de pedir ao STF (Supremo Tribunal Federal) investigações criminais contra o presidente da República, ministros de Estado e deputados, por causa do foro privilegiado.


Fonteles disse, por meio de sua assessoria, que estuda as declarações de Jefferson para decidir se tomará alguma providência. O mandato dele termina no próximo dia 30. Lula ainda não indicou o sucessor.


O procurador-geral disse que, em 30 anos de carreira no Ministério Público Federal, viu ‘tempestades e noites escuras’.


STF e o esquema PC


Dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) -Marco Aurélio de Mello e Carlos Ayres Britto- consideraram ‘muito grave’ a afirmação do presidente nacional do PTB, deputado Roberto Jefferson, de que o tesoureiro do PT dava mesada de R$ 30 mil a congressistas.


Para dois ministros que falaram em caráter reservado, há indícios de prática dos crimes de corrupção e prevaricação.


Em razão do caráter aparentemente institucional do chamado ‘mensalão’, que seria a obtenção de apoio de parlamentares ao governo, os ministros dizem haver a possibilidade de envolvimento do presidente Lula.


Um deles disse que o caso da ‘mesada’ pode ser mais grave que o esquema PC, que levou à renúncia do ex-presidente Fernando Collor. Nas acusações contra Collor, o dinheiro teria sido desviado em benefício de pessoas, sem envolver o governo.


Marco Aurélio defendeu a apuração dos fatos, ao se dizer ‘perplexo’. Britto, que é ex-petista (1985 a 2003) e foi indicado por Lula para o STF, afirmou estar ‘estupefato’, mas que esperaria explicações do PT e do governo.


Processos


Um presidente pode responder a processo político, de impeachment, perante o Senado, e a processo judicial, por crime, perante o STF. No primeiro caso, qualquer cidadão pode denunciá-lo. No segundo, apenas o procurador-geral. Nos dois casos, o processo só será aberto se for aprovado por dois terços dos deputados.


O Código Penal prevê de um a oito anos de prisão nas condenações por corrupção. A pena de prisão para a prevaricação varia de três meses a um ano. Esse crime é definido como ‘retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal’.’



Guilherme Evelin


‘‘Governo já perdeu batalha da opinião pública’ ‘, copyright O Estado de S. Paulo, 7/06/05


‘Professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais, o cientista político Fábio Wanderley Reis avalia que a atual crise política é a culminância do processo de erosão do lado ético do PT, iniciado com o caso Waldomiro Diniz. ‘O governo já perdeu a batalha da opinião pública’, disse ele, em entrevista ontem ao Estado.


A crise chegou ao Palácio do Planalto?


As denúncias do deputado Roberto Jefferson ainda precisariam ser comprovadas. Afinal, o PT nega a veracidade delas, e Jefferson está sendo confrontado por gente que em princípio merece mais crédito do que ele. Mas as denúncias são graves, e é difícil negar que são também verossímeis. Se o presidente foi informado sobre o suposto esquema de pagamento de mesada a deputados, como diz Jefferson, seria de esperar que adotasse medidas mais enérgicas do que simplesmente mandar suspendê-lo.


Há possibilidade de uma desestabilização institucional?


Falar em crise institucional como a que aconteceu em 1964 me parece um claro exagero. São circunstâncias completamente diferentes. Mas não há a menor dúvida de que o episódio de agora é muito negativo para o governo, num quadro em que ele já perdeu a batalha da opinião pública, que tende a dar crédito às denúncias.


Qual é o aspecto mais grave da crise, na opinião do senhor?


Essa crise me parece ser a culminância de um processo que começou com as denúncias sobre Waldomiro Diniz, que criaram, na minha opinião, a grande esquina do governo Lula. A tergiversação do governo naquele episódio começou a erodir o lado ético do capital simbólico do governo e do PT. A partir daí tivemos o governo na defensiva e grande inépcia na atuação política, com destaque para o desastre da eleição de Severino, o comprometimento das relações com a chamada ‘base aliada’. É incrível que tenhamos visto o presidente Lula a manifestar solidariedade a Jefferson para vê-lo, dias depois, vir a público com denúncias como essas. Que isso tenha acontecido mostra como as coisas estão mal paradas.’



Revista Consultor Jurídico


‘MPF vai à Justiça para ter entrevista de Duarte à Veja’, copyright Revista Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 7/06/05


‘O Ministério Público Federal vai requisitar por via judicial que a revista Veja entregue as fitas com o conteúdo integral da entrevista que o ex-presidente do IRB – Instituto de Resseguros do Brasil, Lídio Duarte, concedeu ao repórter Policarpo Júnior.


A entrevista serviu como subsídio para a reportagem ‘Uma mentira contada na PF’. Na reportabem, Veja desmente depoimento de Duarte à Polícia Federal, no qual ele disse que as informações publicadas pela revista a respeito do esquema de corrupção no IRB para favorecer o PTB eram inventadas.


Em ofício encaminhado à semanal, na segunda-feira, (6/6), o procurador da República no Distrito Federal Bruno Acioli solicitou à direção da sucursal em Brasília a íntegra original do áudio. A Editora Abril, responsável pela publicação de Veja, enviou apenas parte do material, além de cópia da íntegra dos arquivos contidos na reportagem e as transcrições das partes da entrevista veiculadas nas páginas e no site da revista.


Veja alega sigilo da fonte para não atender ao pedido do procurador. Diz também que só identificou Duarte como fonte das informações sobre o IRB, porque ele próprio quebrou seu compromisso de sigilo. ‘A revista, cumprindo o compromisso do off, no qual a fonte conta o que sabe sob a promessa de não aparecer como origem das informações, não noticiou que o esquema dos 400.000 reais fora revelado por Duarte. Só o faz agora, nesta reportagem, por considerar que Duarte quebrou sua parte no compromisso, ao tentar desmentir a revista’.


Para Bruno Acioli, ao revelar sua fonte na reportagem, o sigilo deixa de ter finalidade. ‘O áudio é a prova da materialidade do crime de falso testemunho de Lídio Duarte, o qual manteve relações com Henrique Brandão, amigo do deputado Roberto Jefferson e suspeito de captar recursos públicos para fins políticos’, afirma o procurador da República.


Acioli e os demais procuradores da República que integram a equipe de investigação das irregularidades nos Correios intimaram Policarpo Júnior a prestar depoimento nesta quarta-feira (8/6), às 15h, na sede da Procuradoria da República no Distrito Federal.’



O Estado de S. Paulo


‘‘Mensalão’ agrava crise’, Editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 7/06/05


‘O PT corre o sério risco de se arrepender da sua nota de ontem, segundo a qual ‘não têm o mínimo fundamento na realidade’ as acusações do deputado Roberto Jefferson, em entrevista à Folha de S.


Paulo, de que o tesoureiro petista, Delúbio Soares, pagava mesadas de R$ 30 mil aos parlamentares do PL e do PP.


Por menor que seja a credibilidade do presidente do PTB – acusado de ser o mentor do esquema de corrupção nos Correios e de exigir de um presidente do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) mesada de R$ 400 mil -, ainda é maior do que a do partido do governo.


Nenhum brasileiro minimamente informado acreditará que ‘o relacionamento do PT com todos os partidos da base de sustentação do governo, inclusive o PTB’, como diz a nota, ‘se assenta em pressupostos políticos e programáticos’.


Não há qualquer resquício de dúvida sobre os meios a que os operadores recorreram com o maior descaramento para ‘garantir a governabilidade do País e implementar o programa de governo pelo qual o presidente Lula foi eleito’ – ou, como está à vista de todos agora, para sufocar a CPI dos Correios.


As últimas pesquisas sobre a avaliação do governo, com uma penca de más notícias para o presidente Lula também no quesito corrupção, indicam que não poderia haver hora pior do que esta para o PT tratar o chamado ‘público externo’ como se fosse constituído de imbecis.


Apelar novamente para o argumento de que a Polícia Federal, o Ministério Público e a Controladoria-Geral da União se desdobram para elucidar as denúncias que tomam conta do noticiário e isso basta é tapar o sol com peneira: o PT deixou definitivamente de parecer honesto.


A reação do partido às declarações plangentes e ameaçadoras do deputado – que se queixava dos petistas por não terem se solidarizado com ele, ao contrário de Lula, no caso dos Correios – sugere que o governo resolveu queimar os navios, sem deixar uma brecha para um mea-culpa numa situação-limite.


O efeito mais provável dessa atitude desafiadora será estimular na oposição uma resposta contrária de igual intensidade, aumentando as tensões políticas e a desconfiança nos meios econômicos e financeiros, que já derrubou o Ibovespa ontem.


Mesmo tendo partido de quem partiu, a acusação clama por providências.


Mal secara a tinta da nota do PT, por sinal, o líder do PDT no Senado, Jefferson Peres, pediu o imprescindível: a mobilização do Conselho de Ética e da Corregedoria da Câmara para investigar as ações do tesoureiro Delúbio – sobre quem pairavam pesadas suspeitas não como pagador, mas como arrecadador.


O deputado ‘não faria uma denúncia desta, se não fosse verdadeira’, avalia Peres.


‘Agora se entende por que o governo comprometeu até o ministro da Fazenda para barrar a CPI dos Correios.


‘ O tom da entrevista, aliás, não deixa margem a dúvidas: sabendo que não sairá ileso da crise (‘não me preocupa mais o mandato, não vou brigar por ele’), Jefferson resolveu levar consigo o PT para o cadafalso.


Pagando solidariedade com solidariedade, poupou o presidente Lula, dizendo que ele ‘chorou’ – de vergonha ou de desespero? – quando lhe contou o que Delúbio fazia e que, desde então, o ‘mensalão’ teria cessado.


Mas a questão central, evidentemente, não são as manobras do antigo capitão da tropa de choque collorida, embora ele decerto ainda não disse tudo que sabe.


O ponto é que o presidente só tem a escolher entre o menos mal e o pior – para ele e o seu partido.


O movimento inicial, a nota do PT, foi uma escolha pelo pior.


O menos mal teria sido o próprio Lula anunciar já na manhã de ontem que, diante do fato novo, instruíra os líderes governistas a apoiar não apenas a CPI dos Correios, mas também toda e qualquer investigação parlamentar sobre a compra de votos no Legislativo revelada por Jefferson.


O fato de não tê-lo feito representa literalmente uma provocação que a oposição aceitará de bom grado.


Dela, de todo modo, se espera que seja mais responsável do que o governo.


É de seu dever contribuir para expor o que possa haver de fraudulento nas ações do Planalto e do PT.


É de sua conveniência minar o patrimônio eleitoral de um presidente que, enquanto o mundo à sua volta ameaça ruir, continua obsessivamente em campanha, como se viu no fim de semana em São Bernardo.


Mas a oposição não pode ignorar que no Brasil ainda é tênue e quebradiça a linha que separa crise política e crise institucional.


A forte queda da Bolsa ontem é um sinal ominoso.’



Folha de S. Paulo


‘O ‘mensalão’ ‘, Editorial, copyright Folha de S. Paulo, 7/06/05


‘São estarrecedoras as declarações do presidente do PTB, Roberto Jefferson, em entrevista publicada ontem por esta Folha. O homem a quem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que daria um cheque em branco veio a público para aprofundar e ampliar as proporções da crise política, acusando o PT de prover uma mesada de R$ 30 mil a políticos do PP e do PL, a título de assegurar apoio no Legislativo.


De acordo com Jefferson, o ‘mensalão’, como ele se referiu à compra de parlamentares, era distribuído pelo tesoureiro do PT, Delúbio Soares, nome que tem rondado com inquietante assiduidade o noticiário de casos nebulosos na seara petista. A prática teria vigorado até o começo deste ano, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva -sempre na versão do entrevistado- veio a tomar conhecimento do caso por intermédio do petebista.


Jefferson, que se encontra no centro do escândalo de corrupção nos Correios e no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), explicou a lógica do ‘mensalão’ afirmando que é ‘mais barato pagar o exército mercenário do que dividir poder’.


Parece claro que o presidente do PTB, vendo-se na iminência de ser abandonado no episódio das estatais, decidiu bombardear o PT e outros aliados. ‘Percebo que estão evacuando o quarteirão, e o PTB está ficando isolado para ser explodido’, disse na entrevista, referindo-se à ‘bomba’ armada pelas revelações sobre a intermediação de negócios nas duas empresas federais.


Se, por um lado, o famigerado histórico de Jefferson exige cautela em relação ao que diz, por outro, sua familiaridade com os bastidores do poder o torna um profundo conhecedor de situações como essas a que se referiu. Não basta, portanto, como fez o PT, manifestar ‘surpresa e indignação’ e considerar que o caso não tem ‘fundamento na realidade’.


Diante da gravidade do que foi dito, o mínimo que a sociedade pode esperar é uma investigação profunda. Mesmo que o presidente tenha chorado e manifestado indignação ao saber da compra de votos -logo a seguir supostamente suspensa-, haveria outras atitudes a tomar.


Segundo disse ontem o ministro Aldo Rebelo, da Coordenação Política, o presidente pediu informações sobre o assunto depois do relato de Jefferson. Soube então que o caso já havia sido levantado, em setembro, pelo deputado Miro Teixeira (PT-RJ), gerando uma sindicância na Câmara. Como Teixeira, porém, recuou da denúncia, nada foi apurado. É preciso, portanto, reabrir o inquérito. O país precisa de explicações.’



VEJA vs. MORAIS


Veja


‘O marketing da censura ‘, copyright Veja, 8/06/05


‘A decisão judicial que, há cerca de um mês, impôs a censura ao livro Na Toca dos Leões, história da agência de publicidade W/Brasil escrita pelo jornalista Fernando Morais, deveria em tese resguardar a imagem do deputado Ronaldo Caiado, do PFL, que se julga caluniado pela obra. Até agora, porém, a polêmica serviu apenas para despertar a curiosidade pelo livro. Ele está em quarto lugar na lista dos mais vendidos de VEJA. Isso é possível porque, apesar de proibido, Na Toca dos Leões continua nas vitrines da maioria das livrarias. Na Saraiva e na Siciliano, as vendas dobraram depois da proibição. Dos cerca de 30.000 exemplares distribuídos, só 14.000 foram retomados pela editora Planeta, que alega dificuldades operacionais para a retirada. A Justiça diz que não é de sua competência verificar o recolhimento. ‘Não sou eu que vou sair como louco fiscalizando isso aí’, afirma o juiz Jeová Sardinha, responsável pela liminar que cerceia a circulação da obra. A Planeta ainda tenta reverter a decisão – um recurso nesse sentido foi negado pelo Tribunal de Justiça de Goiás na semana passada. Na Toca dos Leões diz que, na campanha presidencial de 1989, Caiado, então candidato, relatou ao publicitário Gabriel Zellmeister um plano para esterilizar mulheres nordestinas. Caiado nega o diálogo. A censura ao livro é um atentado à liberdade de expressão. Mas, ao deixar de ouvir Caiado sobre uma acusação grave, Morais fez mau jornalismo. Sorte dele que a censura no Brasil não é tão dura quanto em Cuba.’