Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A jornada de FHC

As narrativas fortes apresentam questões intrínsecas ao ser humano como vida, prazer, ira e ultrapassam o dualismo ao buscar abranger a complexidade de seus personagens. Outro elemento nessas histórias é o personagem principal, que pode ser interpretado como herói, anti-herói ou vilão, conforme o receptor da mensagem e as condições.

O mitólogo Joseph Campbell, em sua entrevista para Bill Moyers que rendeu o livro Poder do Mito, e também na obra O Herói de Mil Faces, explica que o “herói” é aquele que se doa e se sacrifica pelo bem da sociedade, e não apenas almeja brilhar como uma celebridade. Após o filme Quebrando o Tabu (2011), de Fernando Grostein Andrade, Fernando Henrique Cardoso é aniquilado por alguns e louvado por outros, mas é visível que expõe sua imagem como ex-presidente, como um dos idealizadores da 3ª via e renomado acadêmico, para tratar de um tema que o afeta há décadas: a descriminalização das drogas.

A película abre caminho para depoimentos pessoais, como o do ex-presidente americano Bill Clinton, que teve um dependente químico em sua família, mas como o texto de qualquer acadêmico de respeito, o roteiro se baseia em dados que lhe conferem seriedade, fora o fato do presidente ser uma figura com a aura do maior cargo político e até mesmo sua indumentária influenciar na absorção da mensagem em camadas preconceituosas.

Um dos pontos em que FHC é mais atacado por seus rivais políticos é pelo fato de ter um suposto perfil elitista. Porém é visível que, apesar de não ser mais de esquerda, há nele ainda muito do pensamento de seu mentor e figura paterna, Florestan Fernandes, principalmente nos trabalhos de assistência social e no pensamento de bolsas de estudo.

Abrir o diálogo

Grostein, nas filmagens, é como o poeta romano Vírgilio, e Fernando Henrique seria Dante descendo pelos círculos do inferno em busca daquilo que crê ser a solução para as drogas, após décadas de combate ineficazes.

Campbell aponta também os arquétipos que surgem nos diversos mitos da humanidade que são também narrativas. Além do mentor, que seria Florestan, outro é o aliado, e FHC no seu debate sobre a descriminalização conta com o apoio do deputado petista Paulo Teixeira. Nesse momento, o pluralismo se apresenta visando a uma causa maior que os próprios e seus partidos. Há alas no PSDB contrárias a esse debate e FHC tem seus pseudo-aliados.

No sábado (18/6/2011), Fernando Henrique Cardoso comemorou 80 anos, homenagens foram feitas, inclusive pela atual presidente Dilma Rousseff, pupila de Lula. Em um site, o mesmo deu entrevistas e é visível que um ciclo de sua jornada está próximo ao fim quando afirma que mais próximo da candidatura presidencial pelo PSDB em 2014, está Aécio Neves, o qual o sociólogo afirma ter um perfil mais parecido consigo, fala que dá uma deixa para a interpretação que o tucano-alfa será o neto do dr. Tancredo Neves.

O filme não coincide com período eleitoral, principalmente para o Planalto, e não possui ares de campanha política. O maior trunfo não é reerguer FHC para a Sociedade do Espetáculo dos conglomerados midiáticos, mas abrir o diálogo de uma questão que afeta muitos setores da sociedade e de uma forma pluripartidária.

***

[Gabriel Leãoé jornalista e mestrando em Comunicação]