Wednesday, 11 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1317

A reportagem de volta às bancas

O Brasil tem uma nova publicação. É a revista mensal Brasileiros, que chegou às bancas em julho passado. Hélio Campos, seu diretor de Redação, anunciou: ‘não será chapa branca – não está aqui para bajular este ou aquele governo –, nem é chapa preta – não tem como missão promover o apocalipse a qualquer preço e a qualquer prêmio’.

É saudável o seu projeto editorial, principalmente no Brasil, onde as desgraças aparecem estampadas com grandes destaques, e interesses subalternos fazem com que a mídia com freqüência se renda ao ‘quanto pior, melhor’. Todavia, não fosse a mídia, os brasileiros teriam sido privados de saber como agia a quadrilha dos 40, a organização criminosa atualmente em julgamento no STF.

A denúncia – especialmente a social e a política – foi sempre um estandarte de nossa imprensa e à falta dela não adiantou encartar dicionários e suplementos: a tiragem de jornais e revistas desabou nos últimos anos.

Alguns exemplos ilustram o mútuo abandono. Os jornais abandonaram os leitores e estes abandonaram os jornais. A evolução dos sete maiores apresenta um quadro preocupante, principalmente para a imprensa paulistana, quando comparadas as tiragens diárias médias de 2000 e 2006, incluídas assinaturas e vendas em banca, como segue: Folha de S.Paulo: 450 mil /325 mil; Estado de S.Paulo, 400 mil/250 mil; O Globo, 325 mil/300 mil; Extra, 300 mil/300 mil; O Dia, 275 mil/125 mil.

O Diário Gaúcho e a Zero Hora mantêm em 2006 as mesmas tiragens de 2000, na faixa dos 175 mil exemplares/dia, em média.

No resumo geral, os 80 grandes jornais do Brasil vendem hoje 1,2 milhão de exemplares a menos do que em 2000. É um formidável prejuízo e levou a imprensa a demissões constantes, sem reposição dos empregos.

Policiais e juízes

Para onde foram os leitores abandonados? Não se sabe ao certo, mas algumas hipóteses encontram fácil comprovação. A maioria refugiou-se na internet, que recebeu também boa parte dos anunciantes.

E o fenômeno não é brasileiro. Na Alemanha, o Frankfurter Allgemeine Zeitung perdeu para a internet 40% da renda dos anúncios classificados. As ações do New York Times caem sem parar e já perderam 50% de seu valor desde 2003.

Com as revistas, não é diferente. A Time, a mais vendida do mundo, vinha caindo desde 1988 e fechou 2006 com a maior queda dos últimos anos. (Para esses dados, ver texto de Pedro Doria, intitulado ‘A Super faz 20 anos. Vai fazer 30?’, na Superinteressante, edição 243, setembro de 2007, pp. 35-36).

É neste cenário que surge a Brasileiros, com tiragem de 50.000 exemplares. Sob a batuta de Hélio Campos, ajudado por Nirlando Beirão e Ricardo Kotscho na diretoria adjunta, e tendo Alex Branco e Luci Ayala como editores, a estréia, em julho, trouxe o ator Lázaro Brandão na matéria de capa (‘Preconceito: uma praga que divide o Brasil’).

O olhar foi bem abrangente e não se limitou ao preconceito de cor, mas também ao social e ao de sexo, de que, já com a revista nas bancas, um juiz daria exemplo escabroso, na sentença homófoba que exarou contra conhecido jogador de futebol.

O número 2 de Brasileiros está nas bancas. O número 1, só garimpando ou pedindo por encomenda. O diretor de Redação faz advertência muito pertinente nesta segunda viagem: ‘Nós da mídia, não podemos mais confundir nossas funções com as de policiais e juízes’. E conclama todos ao bom senso, que ‘é bom para o governo, bom para quem gosta dele e bom para quem não gosta’.

Sem espartilhos

E como uma revista se faz também com escritores, alguns deles dublês de jornalistas, aqui estão eles neste segundo número. Domingos Pellegrini foi a Cuba e fez um relato do que encontrou nos mergulhos da água do Caribe e na superfície. Seu texto, como sempre bem cuidado, é um dos pontos altos desta edição.

Em matéria assinada por Bruno Rico (‘O baixo clero da literatura’), Marcelo Mirisola não deixou por menos e decretou: ‘Na Flip, os escritores estão todos rendidos, o escritor brasileiro é convidado para qualquer coisa, está indo para qualquer lugar’. Na companhia de outros do baixo clero (como se sabe, uma expressão equivocada), ele participou da Flap (Festa Literária Alternativa à de Parati), que se realiza há três anos na Praça Roosevelt, no Centro de São Paulo.

Mas, nas páginas anteriores, Mariana Nadai (‘Parati, com todas as letras’) informa que mais de 20 mil pessoas, em busca de 39 autores espalhados por 23 mesas de debate, viveram literatura, entre 4 e 8 de julho, quando, mais uma vez, a Flip, como é conhecida, ganhou a mídia.

Os leitores serão os melhores juízes da publicação, mas é preciso lembrar que ela nasce sem os costumeiros espartilhos, que por norma confinam análises a pouco mais de duas laudas. Nesse sentido, lembra a velha Realidade, de saudosa memória. Há espaço mais do que suficiente para que temas e problemas dos brasileiros sejam amplamente analisados, de que dá bom exemplo o publicitário Washington Olivetto em ‘Don’t cry for us, Argentina’.