Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Fernando Rodrigues

‘A reportagem de Andrei Meireles e de Gustavo Krieger na revista ‘época’ representa a quebra do encanto do PT federal. A plataforma de Lula era fazer o ‘governo da mudança’. Agora surgem indícios contundentes de que um assessor que despacha dentro do Palácio do Planalto coletou dinheiro de maneira ilegal, do jogo do bicho, para campanhas petistas. O alto funcionário é Waldomiro Diniz. O nome é irrelevante. é um desconhecido do público. O que importa é a quem ele servia. O PT o demitiu. Tenta circunscrever o problema ao funcionário. Não vai dar certo. Waldomiro foi, desde o primeiro dia do governo Lula, o assessor mais próximo do ministro José Dirceu. Fazia apenas o que o ‘comandante’ ordenava. Antes de estar no governo, Waldomiro participou pessoalmente de quase todas as reuniões e negociações comandadas pelo hoje chefe da Casa Civil para montar o governo Lula em 2002 -o ano em que se envolveu com o jogo do bicho, segundo a reportagem de ‘época’. é possível que o ministro José Dirceu não soubesse da atuação de Waldomiro? O que deve acontecer com Dirceu? Há duas hipóteses: 1) se não sabia o que Waldomiro fazia, Dirceu é um parvo. Deve ser demitido por incompetência; 2) se sabia, pior ainda. Deve ser demitido por Lula e cassado pela Câmara dos Deputados -Dirceu é deputado federal pelo PT paulista. é evidente que Lula conseguirá abafar o caso. Tem ampla base de apoio no Congresso. Em 1997, FHC enterrou a CPI da compra de votos da reeleição na base da fisiologia -deu dois ministérios ao PMDB. Lula é previdente e mais cauteloso: deu os cargos antes da crise.

Escrevo de Austin, Texas, nos EUA, onde participo de um fórum de jornalismo. Até daqui é possível sentir o calor desse escândalo que deixa o PT mais parecido com o simulacro que a sigla já se tornou há tempos.’



Dora Kramer

‘PT instala-se na planície’, copyright O Estado de S. Paulo, 15/02/04

‘O leitor pode apostar: não há a menor chance de prosperar na Câmara ou no Senado uma comissão parlamentar de inquérito para apurar detalhes outros do caso do assessor de primeiro escalão da Presidência da República flagrado em vídeo pedindo dinheiro a um banqueiro de jogo do bicho.

Digamos que a CPI tenha as assinaturas de apoio necessárias e consiga, desse modo, ser criada. Digamos também que os partidos indiquem representantes e a CPI possa, então, ser instalada. Ainda assim, não irá a lugar algum, não vai funcionar.

E o motivo é dos mais simplezinhos. Não interessa a partido algum fazer uma profunda – nem rasa – investigação sobre financiamentos de campanha. Sim, porque ao fim e ao cabo, este seria o tema de um eventual inquérito sobre o escândalo denunciado pela revista Época.

O fato principal está esclarecido. Foi filmado e o acusado confessou.

Portanto, o que sobra diz respeito à natureza da conversa do assessor Waldomiro Diniz com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.

E esta, ao que consta da confissão do réu, deu-se em torno de doações do senhor Cachoeira para campanhas eleitorais.

Considerando que nenhum dos dois se dedicava na cena registrada pela câmera a atividade inédita no mundo da política e que não há partido que possa, neste aspecto, fazer uma crítica ao PT sem correr o risco de sofrer o efeito do revide, é total a carência de rigor ético nessa seara.

O inusitado no caso Cachoeira-Diniz, é o envolvimento explícito de um auxiliar direto da Presidência, subordinado à Casa Civil e com atribuições de confiança absoluta da interlocução com o Congresso Nacional.

No resto, o episódio é banal; escandaliza mais pela comprovação irrefutável do que por qualquer outra coisa. Isso não significa dizer que o hábito justifica a ação e que, se todos fazem, o PT também tem autorização para fazer.

Não é isso. Alegar ‘hipocrisia’ para reabilitar ilegalidades é o velho truque do malfeitor. O notório Paulo César Farias recorreu ao estratagema quando de depoimento na CPI da corrupção no governo Collor, em 1992, para constranger o plenário, atingindo com sucesso o objetivo.

A questão é que desse fruto do pecado, provado em público agora pelo PT, todos se servem com abundância e, por isso, inexiste hipótese de alguém sustentar de verdade uma busca acurada no sistema de arrecadação de fundos de campanha. Ainda mais em ano eleitoral.

Trata-se de um balaio onde não é conveniente mexer. Porque uma coisa é a discussão sobre as formas de financiamento daqui para a frente, a outra é abrir baús de podridões coletivas.

Baseados nessa certeza, parlamentares da situação podem tranqüilamente defender a criação da CPI e continuar posando de vestais diante do respeitável público.

Se houver algum risco, muita gente da oposição, é observar para conferir, vai pedir calma numa hora difícil como essa e alegar prudência cívica para evitar abalos na governabilidade.

Não deixarão os oposicionistas, no entanto, de olhar com ironia o PT como quem diz: ‘Bem-vindo ao clube.’

Soma zero

Não é novidade o uso de requerimentos para instalação de CPIs para efeito apenas intimidatório, sabendo os proponentes que não há chance de sucesso por razões de desinteresse coletivo.

No governo passado ocorreu isso com a proposta da CPI do Fundo de Amparo ao Trabalhador, para investigar transferências de verbas a sindicatos, federações e confederações, algumas patronais.

Nenhum partido queria, já que todos tinham ligações com entidades do gênero.

Sabedor das dificuldades do PT na área, dadas as estreitas ligações sindicais, os governistas de vez em quando ameaçavam ressuscitar a CPI para provocar na oposição recuos em temas ruins para a situação.

Só que ao governo também não convinha tocar o assunto de fato, porque dificilmente sairia ileso de uma investigação sobre distribuição de verbas administradas pelo Ministério do Trabalho.

É sem tirar nem pôr o que ocorre com a proposta da CPI Cachoeira-Diniz.

Via Dutra

PSDB e PFL estão começando a querer falar sério sobre a eleição municipal.

Em torno do tema, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o prefeito César Maia – candidato à reeleição no Rio – ficaram de ter uma conversa para iniciar o acerto objetivo das convergências.

As divergências resultantes da campanha presidencial vêm sendo dirimidas desde o ano passado pelos presidentes dos dois partidos, José Serra e Jorge Bornhausen, em encontros a sós.’



O Estado de S. Paulo

‘Grampo já derrubou ministros e um senador’, copyright O Estado de S. Paulo, 14/02/04

‘O grampo sempre esteve presente na recente história política do País. Quando indicado sucessor do general Ernesto Geisel, o general João Figueiredo já comentava: ‘é mais fácil acabar com o tóxico do que com a escuta telefônica.’ Na Presidência, Figueiredo comprovou a própria tese ao descobrir um grampo dentro do seu gabinete.

Em novembro de 1995, no governo FHC, diálogos gravados no Planalto revelaram tráfico de influência envolvendo o então chefe do Cerimonial do governo, Júlio César Gomes dos Santos, o deputado Xico Grazziano (PSDB-SP), secretário particular do presidente Fernando Henrique, e o ministro da Aeronáutica na época, Mauro Gandra. Surgiu a suspeita de favorecimento à empresa norte-americana Raytheon na licitação do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam).

Em julho de 1998, durante o processo de privatização das telecomunicações, uma escuta levou à demissão do então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e do ex-presidente do BNDES, André Lara Resende. O grampo revelou detalhes de negociações que até hoje a oposição insiste em investigar.

O esquema de escutas não poupou nem quem já havia deixado o governo. Em 2000, a revelação de 117 telefonemas entre o ex-secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge, e o juiz trabalhista Nicolau dos Santos Neto, alimentou o noticiário sobre o desvio de R$ 169 milhões na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo. As acusações, porém, nunca foram comprovadas.

Também no Legislativo, o grampo já fez estragos. Em 2001, a gravação de uma conversa com assessores provocou uma crise no Congresso e custou o mandato do então todo-poderoso senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). ACM teria dito que a colega Heloísa Helena (PT-AL) votou contra a cassação de Luiz Estêvão (PMDB-DF). A votação era secreta e ele foi condenado por falta de decoro parlamentar. Acabou renunciando para evitar a cassação.’



Nelson de Sá


“Passando o PT a limpo”, copyright Folha de S. Paulo, 17/02/04


“O que seria dos governos no Brasil, sem a Globo, ou vice-versa. A revista da Globo, sexta, anunciou em letras vermelhas o ‘Dinheiro sujo’:


– Vídeo mostra homem que cuida dos interesses do Planalto no Congresso negociando com bicheiros o favorecimento numa concorrência.


Brasília entrou em transe. Mas passou o Bom Dia Brasil, o Hoje e nada. Chegou o Jornal Nacional e William Bonner leu a manchete -daquelas que entram para a história, ao lado das diretas e do debate de 89:


– Um bicheiro diz que pagou propina ao chefe das loterias do Estado do Rio, no governo de Benedita da Silva.


Benedita? Mas o que ela tem a ver com isso? Onde foi parar José Dirceu? Mais manchete, com Fátima Bernardes:


– Parte do dinheiro era para campanhas eleitorais.


Pobre Benedita, sempre ela. Volta Bonner:


– O crime -em 2002- foi registrado em vídeo.


E Fátima:


– Após a revelação das fitas, ex-chefe das loterias é demitido do emprego atual…


E Bonner:


– … Subchefe de Assuntos Parlamentares da Secretaria de Coordenação Política com sede no Palácio do Planalto.


O palácio, finalmente.


Mas aí o telespectador, depois de tantos ex-chefes e subchefes e enunciados tortuosos, trocou de canal ou divagou.


No primeiro bloco do JN de sexta, outro assunto:


– O menino Iruan passou a noite com a avó.


Segundo e nada. Terceiro e nada. Quarto bloco, pelo meio, entra a história:v

– A reportagem mostrou que o ex-presidente da Loteria do Estado, no governo Benedita, cobrava propina.


De novo Benedita. Começa o relato e logo:


– Waldomiro Diniz era o presidente da Loterj no governo Benedita.


Muita Benedita, nada de José Dirceu. Surgem os vídeos com os diálogos. Noticiam a demissão de Waldomiro, as investigações. De repente:


– O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, não quis se pronunciar.


O telespectador se intriga: por que ele deveria se pronunciar, se nada até então o vinculava à denúncia?


Foi a única menção a Dirceu -e ainda assim com a imagem de Aldo Rebelo, ‘o atual chefe de Waldomiro’. Depois falaram tucanos, mais petistas etc. Até chegar à última informação:


– A assessoria de Benedita da Silva informa que não localizou a ex-governadora, em viagem de férias, no exterior.


Assim é crueldade.


***


O JN foi outra coisa nos dias seguintes, inclusive ontem. O trabalho estava feito.Mas sempre se pode contar com Boris Casoy. Do âncora do Jornal da Record:

– O fato é o seguinte. Um subchefe da Casa Civil de Lula é flagrado em vídeo e confessa que está tomando dinheiro. Esse senhor, da estatura moral de uma latrina, pede dinheiro para si mesmo e para as campanhas. Esse homem, da confiança do ministro José Dirceu, um amigo dele, que dividiu apartamento com ele, é uma cunha do crime organizado dentro do Palácio do Planalto.
Terminou cobrando apoio do PT à CPI e exigindo passar o Brasil a limpo.”





Helena Celestino


‘Lula enfrenta momento delicado’, afirma NYT’, copyright O Globo, 17/02/04

‘O primeiro grande escândalo do PT recebeu destaque na edição de ontem do ‘The New York Times’. A reportagem foi publicada, com foto, no alto da página 3, sob o título ‘Partido brasileiro é ameaçado por vídeo mostrando suborno’. O jornal exibe uma foto reproduzindo o vídeo em que Waldomiro Diniz está reunido com o banqueiro do bicho Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, chamado de ‘Charlie Waterfall’ na reportagem.


O correspondente Larry Rother informa que ‘o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está enfrentando pesadas acusações de corrupção envolvendo personalidades de seu governo e o partido que ele fundou’. A reportagem conta que Waldomiro foi demitido na sexta-feira, poucas horas depois que um vídeo incriminatório foi exibido na página na internet da revista ‘Época’.


‘Mas a repercussão do escândalo aparenta atingir seriamente o governo esquerdista liderado pelo Partido dos Trabalhadores, que sempre se apresentou como a única força política distante da corrupção no sombrio mundo político brasileiro. Lula é o fundador do partido, concorreu três vezes à Presidência até ser eleito em 2002 e está enfrentando agora o mais delicado momento de sua administração’, avalia Rother.


O jornal informa ainda que líderes da oposição reagiram às denúncias pedindo uma investigação do Congresso e exigindo a renúncia do chefe da Casa Civil, José Dirceu, que já foi superior imediato de Waldomiro Diniz: ‘O presidente do PT, José Genoino, tentou afastar o partido do escândalo e do desgaste que ele está causando alegando que Diniz não é membro do partido, mas jornalistas e congressistas responderam que ele não apenas dividia o apartamento com José Dirceu mas exercia um dos mais delicados postos no governo, o de ligação entre o Executivo e o Legislativo’, informa o jornal.


Outras denúncias contra o PT são mencionadas


Depois de descrever o conteúdo do vídeo, a reportagem lembra outros escândalos que estariam ameaçando a credibilidade do PT e de seus militantes, como o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel, em janeiro de 2002 ( relacionado com contratos municipais ilegais de prestação de serviços) e as acusações de envolvimento de membros do PT com bicheiros no Rio Grande do Sul.’