Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Irreverente estilo gonzo atrai geração millenium

selo_rev_jorn_espmO jornalismo preferido da geração millenium nasceu em 1994, em Montreal, na forma de revista impressa especializada em sexo, drogas e punk music (em vez de rock and roll, talvez para diferenciar-se dos babyboomers).

Agora, a Vice Media opera em todas as plataformas, em particular as digitais, vai faturar US$ 1 bilhão este ano, está em 25 países, tem um público de 181 milhões de pessoas e 4 mil empregados. Cobre guerras, problemas sociais, causas humanitárias, música, turismo, tudo.

O estilo se aproxima do “gonzo”, consagrado por Hunter Thompson (1937-2005) na década de 1970: narrativa em primeira pessoa, muito humor e ironia (inclusive autodepreciativa), sem compromissos com a objetividade, linguagem totalmente coloquial, abordagem crua dos temas.

Vice está no Facebook (7,5 milhões de seguidores), na TV paga (no Brasil via HBO), no YouTube, nos seus websites (o brasileiro é http://www.vice.com/pt_br/) e em dezenas de outros canais, inclusive os de veículos tradicionais (veja abaixo).

Mídia tradicional busca fonte da juventude

Martin Sorrell, 70, CEO do maior grupo de publicidade do mundo, a WPP (3 mil escritórios em 110 países), perguntado sobre como entender o panorama da comunicação atual, respondeu: “Visite a sede da Vice Media; eles sabem”.

Por isso, em vez de combater a Vice, muitos veículos a procuram como se fosse uma fonte de juventude. Entre os que veiculam seu conteúdo e nela investem estão a Fox, de Rupert Murdoch, a A&E Networks (Disney-Hearst), a HBO (Time Warner) e, no Brasil, a Folha.

Desde abril, a Folha passou a postar no seu site os vídeos e fotos da Vice Media. Para o editor-executivo do jornal, “esta é uma parceria do tipo ganha-ganha”.

Mundo de Brian

A ansiedade para atrair a audiência jovem tem feito muitos veículos jornalísticos, principalmente na TV, aproximarem cada vez mais seu conteúdo do formato entretenimento.

O âncora do mais importante telejornal da rede americana de TV NBC, Brian Williams, era exemplo típico, aparentemente exitoso, da abordagem. Nos oito anos em que fez o programa, a NBC foi a líder de audiência no horário.

Assim que Williams assumiu o posto máximo do jornalismo da NBC em 1996, logo se percebeu o contraste com o antecessor, o circunspecto e cauteloso Tom Brokaw.

Tim Russert, outro ícone do jornalismo sério da emissora, dizia que Williams teria sido muito melhor que Chevy Chase, famoso por interpretar um âncora no programa humorístico Saturday Night Live. De fato, Williams aparecia cada vez mais em programas de humor.

Para manter o ritmo e ser coerente com a exigência de narrativas maximamente excitantes a fim de cativar jovens, Williams passou a exagerar seus feitos jornalísticos em entrevistas e encontros com estudantes.

Até que em fevereiro disse, em seu próprio jornal, que o helicóptero em que viajava quando fazia uma cobertura no Iraque tinha sido atingido por um foguete inimigo. Os militares americanos que o acompanharam na missão o desmentiram: outro veículo da frota em que estavam é que foi alvejado.

O episódio virou um escândalo. Investigação da NBC apurou que Williams havia exagerado em outros dez relatos de trabalho. Ele foi suspenso enquanto o inquérito prosseguia.

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Carlos Eduardo Lins da Silva é livre-docente, doutor e mestre em comunicação; foi diretor-adjunto da Folha e do Valor.