Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O tacape-jornalismo e a política do tacape

Na quinta-feira (13/12), o jornal noturno da Rede Bandeirantes de TV deu uma aula magistral de tacape-jornalismo. Minha TV é analógica, mas pude notar que o formato da matéria acerca da rejeição da CPMF no Senado foi bem definido.

A âncora fez a chamada da matéria e comentou que as pessoas ficaram indignadas com a supressão da CPMF quando souberam que a mesma seria utilizada para a saúde. Corte para os populares, que deram rapidamente suas opiniões sem conhecimento profundo do assunto. Novo corte, desta vez para Joelmir Betting, o qual, com muito mais tempo e didatismo, explicou porque a supressão do imposto na verdade beneficia mais as famílias do que as prejudica. Fim da matéria.

O que se exige de um jornal, escrito ou televisado, é equilíbrio. Mesmo que adote uma opinião clara sobre o assunto, espera-se que o órgão de imprensa dê a todos os interessados a oportunidade de se manifestarem. Entretanto, há uma diferença entre manter o equilíbrio ou as aparências.

No caso da CPMF, a Bandeirantes optou por manter as aparências. A matéria deu a impressão que duas opiniões contraditórias foram contempladas. Mas não foi que isto que ocorreu.

Há uma diferença qualitativa entre os populares e o Joelmir Betting. O queridinho da TV Bandeirantes sabe como poucos usar com charme os recursos da TV. Betting, que se apresenta sempre impecavelmente vestido e penteado, goza do privilégio de ser tratado como especialista pelos telespectadores. Intimidados por um meio de comunicação que não usam diariamente, mal-vestidos, estranhos para o público e sem conhecimentos suficientes de economia e finanças públicas, os defensores populares do imposto serviram apenas de papagaio de pirata. A metáfora não foi usada para ofender o Joelmir, é claro.

De abuso em abuso…

Além de suas limitações, os populares tiveram menos tempo que o especialista. Por que isto ocorreu? Por que o Adib Jatene não fez o contraponto ao Joelmir?

Em comparação com a ditadura militar, nossa democracia é maravilhosa. Mas às vezes ela é apenas enganosa. O tacape-jornalismo é, sem dúvida alguma, responsável pela preservação da cultura autoritária. Mas isto não quer dizer que os políticos também não sejam autoritários.

Pouco antes da derrota no Senado, Lula disse que aqueles que defendem o fim da CPMF são sonegadores. Sua incontinência verbal é um exemplo típico da política do tacape.

A Constituição de 1988 garante o direito à liberdade de consciência e de expressão a todos os cidadãos brasileiros. Este direito também é garantido pela Convenção Americana de Direitos Humanos e pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, diplomas internacionais subscritos pelo Brasil. Nenhum dos diplomas mencionados exclui os sonegadores do rol de titulares dos direitos que asseguram. Portanto, até um sonegador tem o direito de se manifestar – o que ele não tem é o direito de impedir o Estado de cobrar o que lhe é devido.

Assim como Lula abusou da retórica, o panfletinho indefinido da Bandeirantes abusou da liberdade de imprensa. E de abuso em abuso nossa democracia capenga continua a capengar.

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Advogado, Osasco, SP