Thursday, 02 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Radiografia oportunista

O que dizer da Veja São Paulo? Deveríamos rir (como devem ter feito os eleitores de José Serra e o próprio), ou deveríamos chorar de raiva (como devem ter feito os eleitores de Marta Suplicy e a própria)? E nós, jornalistas, integrantes de uma classe livre e essencial para a manutenção de um sistema democrático? Há muito que lamentar.

Se ainda existia alguém que duvidava da parcialidade de determinados veículos de comunicação a favor ou contra candidato X ou Y, essa dúvida não deve existir mais. A edição da Veja São Paulo (20/10/2004), com a chamada de capa ‘Radiografia do governo Marta’, é um verdadeiro atentado à inteligência dos leitores. Ação cara-de-pau na tentativa de eleger o candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, José Serra.

Não questiono em momento algum a legitimidade da matéria. Análises de governos sempre foram feitas e continuarão sendo feitas pela imprensa. Porém, o momento em que esta foi feita e publicada não confere com a ética que deveria existir nesse meio. Principalmente pelo leve detalhe de estarmos a apenas duas semanas das eleições do segundo turno da Prefeitura da capital mais importante do Brasil. No mínimo ela deveria ter sido publicada antes do período eleitoral, ou após, no término do mandato do governante.

Ouso comparar o oportunismo da Veja à edição pela TV Globo do debate entre os candidatos à presidência, em 1989, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello, este claramente favorecido: com a ‘ajudinha’ da Globo, se elegeu. O fim dessa história não é preciso contar.

O maior demagogo

Em vez de adotar posição clara nas eleições e declarar apoio ou não a determinado candidato, os veículos no Brasil preferem enganar o leitor e expor suas idéias em matérias tendenciosas. Exceção feita à Carta Capital, que sempre mostrou postura ética e coerente.

A verdade é que, como escreveu o jornalista Eduardo Maretti, na edição 289 do Observatório da Imprensa, no artigo ‘O mito do jornalismo livre e independente’ [remissão abaixo], ‘o que conhecemos como ‘liberdade de imprensa’ não tem nada a ver com o direito do cidadão de receber informações independentes e imparciais, nem tampouco com a liberdade de expressão do jornalista propriamente dito’. O jornalismo fica à mercê do interesse dos proprietários dos grandes veículos e de seus editores.

É triste fazer essa constatação. Aposto que todo jornalista, diante dessa edição da Veja São Paulo, deve ter pensado: ‘Que sacanagem!’ Independentemente de idéias ou ideais.

Muitos jornalistas e veículos acham que podem fazer o que quiserem, atendendo a seus anseios e necessidades. Por mais que sonhemos, que batalhemos, que soframos, o jornalismo livre ainda é um sonho. Como bem classifica Max Weber, ‘o jornalista é o maior dos demagogos’.

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Jornalista, Campinas, SP