Thursday, 02 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Agência Carta Maior

MÍDIA & POLÍTICA
Gilson Caroni Filho

A TV Globo e o feitiço da cidadania, 26/07

‘O jornalismo imita a arte. Tal como no filme ‘O feitiço do tempo’, em que um repórter parte para fazer a cobertura de uma festa e, por algum motivo inexplicável, passa a acordar no mesmo dia, nossa grande mídia parece estar condenada a uma eterna repetição. O tempo passou. A nação reencontrou o caminho da democracia, mas, para boa parte do campo jornalístico, a reconciliação política é algo da ordem do impensável. Perpassada por um caldo de cultura que não admite que a arena do jogo político não comporte mais golpes, nega-se a cumprir sua função fundamental: expressar, com a maior diversidade possível, a complexidade social. Ao não fazê-lo, cerceia o que seria seu fundamento: a liberdade de expressão assegurada no texto constitucional. Torna-se o seu contrário: um obstáculo à efetivação da cidadania.

Quem acompanha a história da imprensa brasileira sabe de suas conexões com interesses dominantes na sociedade fracionada. Conhece, e bem, como são editados fatos e discursos. Tem noção aguda de que a autonomia relativa de uma redação encontra seus limites nos interesses do patronato. Franklin Martins e Helena Chagas estão aí como ‘respaldos de provas robustas’, ‘evidências empíricas que valem seu sal’ como demonstrou, de forma brilhante, Bernardo Kucinski em seu último artigo para Carta Maior.

É de autoria do jornalista Paulo Francis a máxima segundo a qual ‘a história é monótona, a cada minuto nasce um leitor idiota’. Parece que, pelo que temos visto nos últimos anos, a suposta idiotia de leitores e telespectadores é algo datado, sem sinalização concreta nos dias atuais. Ainda assim, convém ficar atento a certas ‘espertezas’ que podem custar caro ao campo democrático-popular. Quando isso ocorre, a direita comemora com blocos editorializados no Jornal Nacional. E, claro, a nau dos insensatos ainda chama de bom jornalismo o que não passa de desabrida propaganda ideológica.

Está faltando pouco para que as últimas edições do JN tenham fundo musical. Afinal são comemorativas e o regozijo com uma suposta falha do adversário é conhecido do torcedor brasileiro. Se servir para ocultar novos estudos que comprovam os avanços do atual governo, melhor ainda. Saímos do campo futebolístico e adentramos a arena da luta de classes. Com a elegância da boa resolução visual e o capricho nas chamadas.

Recentemente, o frenesi com um suposto dossiê elaborado na Casa Civil não durou nem duas semanas. Ante as flagrante falhas de roteiro, foi substituído pelo ‘caso VarigLog’ que, previsto para ocupar páginas e telas por alguns meses, durou alguma horas de depoimento no Senado.Um resultado inesperado para aqueles que, desde 2006, não se conformam com um fenômeno inédito: uma desgaste político, já consolidado no imaginário do eleitorado urbano, não se desdobrou em derrota eleitoral. E pior, à reeleição seguiu-se uma impressionante recomposição simbólica do governo.

O enredo agora é o ‘retorno da inflação’ e seu impacto sobre o núcleo pobre da novela diariamente apresentada por William Bonner e Fátima Bernardes. Em tom solene, o casal anunciou na edição de ontem que ‘O IPCA de 15 de junho ficou acima do esperado: 0,9%. O índice mede a inflação de quem ganha até 40 salários mínimos. Nos últimos 12 meses, a alta foi de 5,89%. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação para os mais pobres, foi de 6,64%.’ O depoimento de uma empregada doméstica serviu como reforço dramático e calculado ingrediente de desinformação funcional: ‘Ivonete Alcântara, que ganha R$ 620 por mês, conhece bem essa realidade’. ‘O que a gente comprava no início do ano, hoje só dá para comprar a metade’

Sejamos francos, só mesmo sendo muito ingênuo para cair no ‘conto dos dossiês’. Qualquer pessoa, com um mínimo de bom senso, farejaria de longe a óbvia ‘trampa’. É o velho jornalismo que, como poucos, sabe servir à direita autoritária e suas lideranças renovadas, habituadas ao jogo em que podem tudo perder, menos os interesses e privilégios. Personagens que se apresentam como novos, ávidos por instaurar um ‘ marco zero’ assustador.

Uma imprensa que ignora o princípio da publicidade, não permite à cidadania controlar a informação. Mais que desinformar, avoca para si uma função que não lhe pertence, pretendendo tomar decisões vinculantes para o conjunto da sociedade. Um parlamento midiático, formado por editores tucano- lacerdistas,respaldados por seguidos pronunciamentos de ministros do STF a lhes prometerem sustentação legal em sua aventura.

Ainda mais, e isso é o muito relevante, desde 2006 há vários dossiês sendo escondidos no noticiário global. O primeiro veio do Pnad (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio). Para desespero dos expoentes da Teoria da Dependência, que agora elegeram a UDN como modelo: o nível de pobreza caiu 19,18% nos três primeiros anos do governo Lula, o maior recuo em dez anos. Somemos a isso a retomada do emprego, estagnada há uma década, segundo Marcelo Néri, coordenador da pesquisa.

Mas o que mais impressionava no ‘dossiê’ a ser ocultado vinha a seguir: ‘Os pobres e ricos tiveram ganhos expressivos de renda’, dizia Néri, coordenador da pesquisa. 50% dos mais pobres aumentaram sua renda em 8,5%, enquanto os 10% mais ricos, depois de cinco anos de perdas, tiveram ganhos de cerca 6%. A classe média teve um crescimento um pouco menor, de 5,5% da renda.’Era esse o governo que privilegiou banqueiros? Com a palavra os editores de economia. Aqueles que deveriam sempre se pautar por evidências empíricas que valem o sal de todo mês.

Passados dois anos, outros ‘dossiês’ continuam sendo discretamente ocultados sob a forma de breves registros, a serem apagados, rapidamente, no dia seguinte à publicação: A taxa de desemprego, anunciada pelo IBGE, caiu para 7,9%, o segundo menor percentual já registrado pela série histórica do Instituto, desde 2002. Certamente há como neutralizar esse ‘escândalo’. O menor número de desocupados só aumenta os riscos de uma inflação de demanda. Para tudo, dirá um bom editor, há um antídoto farsesco.

Outros ‘dossiês’ dão conta de que o volume de crédito cresceu 32% em um ano; que a Previdência tem maior valor médio de benefícios pagos desde 2001; que a desigualdade de renda do trabalho no Brasil, medida pelo Índice de Gini, teve queda de 7%, entre o quarto trimestre de 2002 e o primeiro de 2008.

Mas o direcionamento do noticiário dos conglomerados deve repetir à exaustão, o que a bancada do JN anunciou como o único fato relevante: ‘Os alimentos foram de novo os vilões da inflação. O arroz subiu 17,09%. Alta também no preço da batata, tomate, macarrão, carne e pão francês. ‘O que aumentou é o que o pobre come’, disse uma consumidora’.

Pelo visto, a cobertura jornalística continuará não se ocupando com as análises de políticas públicas, mostrando o que é viável ou não. A telecracia continuará impedindo a discussão política que se impõe. O importante é, através de clara sonegação, informativa continuar trabalhando com velhos e novos fantasmas. Será muito difícil para a imprensa fugir de sua própria danação.

Em ‘O Feitiço do Tempo’, o personagem só pode seguir em frente na vida, se mudar seu caráter. Aqui, justiça seja feita às evidências, a arte não imita o jornalismo.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Observatório da Imprensa.’

 

 

MÍDIA & DEMOCRACIA
Agência Carta Maior

Estudantes promovem ato pela democratização da comunicação, 21/07

‘Estudantes de comunicação do Brasil promoverão um ato pela democratização da comunicação, dia 23 de julho, em Niterói, a partir das 16h, com concentração no Campus do Gragoatá (UFF). A atividade faz parte da programação do Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação (Enecom) e pretende dialogar com a população sobre a fusão da Brasil Telecom com a Oi Telemar. Previsto inicialmente para ocorrer no Rio de Janeiro, o ato mudou e será realizado apenas em Niterói.

Os estudantes pretendem também denunciar à população os problemas enfrentados pelos índios guarani que estão na região oceânica de Niterói. Recentemente, eles tiveram suas ocas incendiadas. Há fortes indícios de que o incêndio foi criminoso, no entanto, pouco tem sido feito a esse respeito. Todas as entidades comprometidas com a luta pela democratização da comunicação estão convidadas a participar da manifestação.

O ato está sendo convocado pelas seguintes entidades: Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação (ENECOS), Centros e Diretórios Acadêmicos de Comunicação da UFF, PUC-RJ, UERJ, UFRJ, Diretório Acadêmico de Estudos de Mídia – UFF e Comissão Organizadora do ENECOM Rio 2008.

Rádios comunitárias

A Central de Desenvolvimento de Rádios Comunitárias do Grande Rio encaminhou ofícios a todos os deputados federais e senadores solicitando que intercedam junto ao ministro das Comunicações, Hélio Costa, ‘em função da absoluta falta de sensibilidade no que tange à radiodifusão comunitária’. A correspondência afirma:

‘Estamos pedindo socorro aos nossos parlamentares, nossas rádios estão sendo fechadas de maneira covarde e arbitrária, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e a Polícia Federal têm interpelado os radialistas de maneira absolutamente irregular, contrariando o capítulo 5° da Constituição brasileira que nos garante a livre expressão’.

A central de rádios comunitárias também encaminhou correspondência ao ministro Hélio Costa, solicitando informações sobre o procedimento para a instalação, operação e legalização das mesmas.

Matéria atualizada em 21/07/2008, às 17h55min.’

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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