Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Briga de cachorro grande na mídia de NY

Poucas brigas empresariais e midiáticas vêm sendo acompanhadas com tanta atenção pelo mundo executivo (e não executivo) americano (e não americano) do que a travada entre o magnata australiano das comunicações Rupert Murdoch, 79 anos, dono do império de mídia News Corp., e Arthur Sulzberger Jr., 59 anos, presidente da New York Times Company. Do ponto de vista econômico, trata-se de uma batalha desproporcional.

Afinal, a News Corp. é um conglomerado global – composto pelo estúdio 20th Century Fox, a TV Fox, o canal National Geographic, uma fatia da empresa de TV por assinatura Sky, os jornais britânicos The Sun e The Times e o americano New York Post, entre outros – cujo faturamento, até setembro deste ano, chegou a US$ 33 bilhões. Já o grupo New York Times Company – dono dos jornais The New York Times, The Boston Globe, International Herald Tribune e do site About.com, entre outros – faturou no ano passado US$ 2,4 bilhões.

Os executivos da Fox costumam brincar que o estúdio ganhou apenas com o filme Avatar, em 2009, tudo o que o grupo New York Times faturou no mesmo ano. No entanto, desde que Murdoch comprou em julho de 2007, por US$ 5 bilhões, o grupo Dow Jones da família Bancroft (dona da empresa por 105 anos) – e seu carro-chefe, o jornal de economia e negócios The Wall Street Journal –, o magnata vem se dedicando ao que ele mesmo definiu como ‘guerra pelo posto de rei da mídia em Nova York’. Para tanto, segundo reportagem da revista Vanity Fair, teria injetado US$ 80 milhões de receitas obtidas com seus negócios em TV e cinema no Journal, com o objetivo declarado de ‘esmagar o Times‘.

Para magnata, Sulzberger é fraco, diz escritor

Em seu melhor estilo provocador, Murdoch não perde um segundo para humilhar Sulzberger – que assumiu o comando do jornal em 1992, a quinta geração da família Ochs Sulzberger, há dois séculos no leme do diário.

Em março, num artigo no suplemento de fim de semana do Journal sobre homens com traços femininos, Murdoch estampou na capa uma foto do sorriso de Sulzberger. Um mês depois, quando o Journal lançou a sua nova editoria, a Grande Nova York, para competir diretamente com o noticiário local do Times, Murdoch mandou Sulzberger ‘arrumar o que fazer’.

– Ele (Murdoch) acha que Sulzberger é fraco, uma garotinha. O ‘Jovem Arthur’ era frequentemente o assunto durante as muitas horas em que conversei com Murdoch quando estava escrevendo sua biografia. Sulzberger era, para Murdoch, um saco de pancadas. Ele até o imitava de forma a sugerir uma certa falta de masculinidade – conta Michael Wolff.

Desde que herdou de seu pai o seu primeiro jornal em Adelaide, na Austrália, ainda em 1952, Murdoch é conhecido por mirar no líder de mercado e não poupar esforços para roubar o posto. Foi assim também na mídia impressa inglesa, com a audiência da TV de notícias a cabo americana (a Fox News tem em média mais telespectadores que a CNN) e, agora, em Nova York, uma cidade que dita comportamento e atitudes ao mundo e se norteia claramente pelo que lê nas páginas do New York Times.

Circulação do Journal é maior do que a do Times

Enquanto Murdoch ataca ampliando o noticiário econômico do Journal com seções de esporte, mais entretenimento e notícias locais – ele promete em breve um suplemento de livros para concorrer com o New York Review of Books –, Sulzberger se defende com o que o Times faz de melhor: reportagens investigativas premiadas e artigos de comportamento que farejam novas tendências, especialmente no inovador mundo digital.

– Murdoch usa uma estratégia arriscada porque o Journal é conhecido internacionalmente pela excelência de sua cobertura econômica – diz Lawrence J. Parnell, professor da Universidade George Washington e especialista em comunicação pública e privada. – Enquanto isso, o Times é um jornal de metrópole, com boa cobertura econômica, mas de perfil diverso do Journal. A guerra de negócios, que envereda pelo lado pessoal, é por uma supremacia na mídia que extrapola a influência em Nova York e entra pelo mundo digital, já que o consumo de notícias segue um caminho não tradicional.

Por ora, Murdoch vem ganhando em circulação. Nos dias de semana, enquanto a circulação do Times é um pouco inferior a um milhão de exemplares (houve queda média de 6% no primeiro semestre), a do Journal é um pouco acima de dois milhões (uma pequena alta de 0,5%). Nos fins de semana, o Times atinge uma tiragem de 1,35 milhão. Em faturamento, os anúncios não pipocaram no Wall Street Journal como Murdoch esperava. Mas quem precisa de recursos de publicidade com um império da comunicação e TVs tão lucrativas? Sulzberger, pelo contrário, vem lutando contra a perda de receitas do Times que migram para a internet. A ponto de, em janeiro de 2009, o milionário mexicano Carlos Slim ter emprestado US$ 250 milhões ao grupo.

Sulzberger vem declarando que não se sente ameaçado. ‘A retórica anti-Times de Murdoch não repercute com nossos anunciantes, não repercute com nossos leitores e, muito francamente, não repercute com o público americano’, disse ele à Vanity Fair.

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Repórter de O Globo