Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Guálter George

‘Amplo noticiário, dois editoriais, três artigos, uma nota oficial e pelo menos sete cartas de leitores. Este era o saldo nas nossas páginas, até ontem, do episódio no qual uma jovem integrante do grupo Crítica Radical, Verônica Maria Rodrigues de Souza, marcou a passagem do ministro Ricardo Berzoini por Fortaleza, no último dia 11, com uma tortada em seu rosto. À parte a ação em si, os leitores do jornal acompanharam um debate paralelo entre O POVO e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Ceará acerca da conveniência de o auditório deste último haver sido cedido para entrevista coletiva da responsável pelo ato. É lógico que o jornal não tinha o direito de criticar a entidade, como o fez, por haver permitido que a apresentação de Verônica, ao lado das líderes do movimento político que integra, Maria Luiza Fontenelle e Rosa da Fonseca, acontecesse em seu auditório. No entanto, é igualmente certo que o sindicato errou o tom na sua resposta ao editorial do O POVO, desprezando os argumentos que lhe pesavam a favor e potencializando ataques à empresa, procedentes ou não, que nada tinham a ver com o ponto em discórdia. Houve, de ambos, uma atitude de intolerância que até assusta, considerando a natureza da atividade à qual estão ligados, jornal e jornalistas que são.

Onde o editorial errou

O POVO, e qualquer outro jornal, tem no seu editorial o espaço legítimo para expressão do seu pensamento institucional. É através dele que se posiciona de maneira oficial acerca dos mais diversos assuntos, dos mais aos menos complexos, dos que marcam um posicionamento cidadão firme àqueles que expõem suas eventuais fraquezas. Portanto, era mesmo no editorial que o jornal deveria expor sua discordância em relação ao ato contra o ministro e suas críticas à forma como pensam e agem os organizadores daquele protesto. No entanto, a manifestação do dia 16 último, sob o título ‘Indigência política’, parece ter ido além disso ao questionar o direito que teria a direção do Sindicato dos Jornalistas de ceder seu espaço para o evento oficial de apresentação da jovem protagonista da agressão contra Berzoini. É lógico, também, e ao contrário do que faz supor aquele editorial, que o fato de a entrevista ter acontecido no auditório não representa que a entidade, necessariamente, esteja concordando com a ação ou o método. De resto, somado este e o editorial do dia 19 – o segundo já uma resposta à nota do sindicato -, O POVO abre uma discussão importante, expõe seu pensamento de maneira clara e, inclusive, incentiva um debate que até ontem estava em suas páginas. E, com certeza, que ainda tende a permanecer por mais algum tempo.

Onde a nota oficial errou

A tentativa de resposta do Sindicato dos Jornalistas Profissionais, publicada na edição do dia 18 passado, à página 18, peca de início. Mesmo dispondo de argumentos fortes para se contrapor à crítica do jornal, feita em tom editorializado, dentro de um outro nível, a direção da entidade optou por escondê-los em meio a uma série de denúncias e acusações contra o jornal. Considerar o editorial arbitrário, ardiloso e inconseqüente, como está posto, estaria dentro de um contexto de resposta esperada e aceitável. No entanto, a maior parte do conteúdo da nota sai para outro eixo, investe contra a empresa, acusando-a de contumaz violadora dos direitos trabalhistas, de querer bajular o governo, de querer jogar este mesmo governo contra a entidade, enfim, opta por um caminho que absolutamente em nada tem a ver com o ponto no qual toca o editorial, inclusive dentro de suas falhas de visão. É claro que o Sindicato não precisa pedir autorização do O POVO, ou de qualquer outra empresa, para ceder seu auditório a quem quer que seja. No entanto, sempre que o faz e quando o fizer para movimentos como a Crítica Radical e dentro do contexto no qual o evento estava inserido, naturalmente que deve estar pronto para arcar com as conseqüências da decisão. Neste caso, pelo menos, demonstrou que não estava.

A jornalista defendeu o sindicato

Artigos e cartas também têm ocupado espaço na manifestação de opiniões acerca do episódio ocorrido no auditório da Federação das Indústrias do Ceará, que teve o ministro Berzoini como vítima. A favor do jornal, deve contar o fato de se ter publicado até mesmo manifestações de crítica ao editorial que gerou a indignada nota do Sindicato. É o caso exemplar do artigo da jornalista Adísia Sá publicado no dia último dia 17, sob o título ‘Editorial equivocado’, onde ela expõe sua divergência em relação ao ponto mais claramente equivocado da posição manifesta pelo jornal. Ela lembra, em tom próximo àquele do editorial e que lhe serve de resposta do mesmo nível, que o espaço do sindicato já serviu em diversos outros momentos a segmentos que o solicitaram para eventos semelhantes àquele organizado pela Crítica Radical. Uma demonstração de que o fato de o jornal ter opinião acerca do assunto não conseguiu contaminar a sua postura editorial diante do episódio. Aliás, como insinua a nota do sindicato, em outro momento de infelicidade, sugerindo que já que a opinião do O POVO é aquela manifestada no editorial sua redação não deveria ter pautado a entrevista de apresentação da responsável pelo ato político de investir com uma torta contra o ministro Berzoini. Este é, talvez, o ponto mais incompreensível e preocupante da manifestação oficial da entidade que representa os jornalistas cearenses.’