Sunday, 13 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1309

Ministro reclama da cobertura

Durante o seminário Cultura de Liberdade de Imprensa, realizado pela TV Cultura [dias 25 e 26/11, em São Paulo], o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Franklin Martins, reclamou do enfoque que a Folha de S.Paulo deu à sua fala no encontro internacional sobre convergência de mídias, promovido por sua pasta.


‘A Folha botou na primeira página que eu tinha dito num tom quase arrogante algo como ‘vai haver controle’ – ou regulação, não lembro exatamente a palavra – ‘com consenso ou sem consenso’’, disse o ministro, que completou em seguida: ‘Eu falei lá exatamente o que falei aqui. Um dos grandes problemas é que temos o hábito de acreditar nos jornais, às vezes não colocamos em dúvida os jornais’.


A reportagem à qual Franklin se refere foi publicada no dia 10 deste mês. Na Primeira Página, a chamada ‘Governo diz que vai regular mídia mesmo sem consenso’ dizia que o ministro ‘afirmou que o governo está disposto a levar adiante a discussão de novas regras para o setor de mídia digital mesmo sem entendimento’.


Segundo Franklin, a Folha distorceu suas palavras e deu a elas um tom ameaçador não por ‘ruído de comunicação’, mas por ‘defeito de apuração’ – ‘com todo o respeito’, acrescentou, ‘antigamente os jornais tinham mais filtros e fazíamos um jornalismo melhor’.


Em seguida, o ministro afirmou ter ficado ‘chateadíssimo’ com a cobertura: ‘Não foi isso que eu falei’.


O ministro releu trechos do discurso proferido no seminário internacional promovido por sua pasta, no qual afirma que o debate sobre um novo marco regulatório para mídias digitais está na agenda e que, se o ambiente de confrontação perseverar, não será bom para ninguém.


‘Nenhum setor, nenhum grupo tem o poder de interditar essa discussão. A discussão está na mesa, está na agenda, ela terá que ser feita. Ela pode ser feita ou num clima de entendimento ou num clima de enfrentamento. Eu acho que é muito melhor fazer num clima de entendimento’, leu o ministro, que comentou: ‘Isso foi dado como agressão. Realmente, não consigo entender’.


Sérgio Dávila, editor-executivo da Folha e um dos participantes do seminário promovido pela TV Cultura, respondeu publicamente ao ministro dizendo que, ‘como ainda não há controle social da mídia, a imprensa é livre até para errar. Se a Folha de fato errou no episódio citado pelo senhor, convido-o a escrever no jornal ou nos dar uma entrevista, que publicaremos com igual destaque’.


A Folha não errou; o ministro de fato disse o que o jornal afirmou que ele disse.


Leia, abaixo, íntegra da reportagem ‘Franklin diz que não recuará sobre projeto’, assinada pelas repórteres Elvira Lobato e Andreza Matais e publicada na versão impressa da Folha no dia 10/11.


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O ministro Franklin Martins (Comunicação Social) afirmou ontem que o governo está disposto a levar adiante a discussão de novas regras para o setor de mídia digital mesmo que não haja consenso sobre o assunto.


Ao abrir um seminário sobre convergência de mídia, promovido por sua pasta, ele disse que ‘nenhum grupo tem poder de interditar essa discussão’ e advertiu que o melhor é fazer o debate num clima de entendimento.


‘A discussão está na mesa, está na agenda, ela terá de ser feita. Pode ser feita num clima de entendimento ou de enfrentamento’, afirmou.


Paulo Tonet, diretor do Comitê de Relações Governamentais da ANJ (Associação Nacional de Jornais), afirmou que ‘o discurso do ministro pode ser interpretado como uma ameaça ou como o jeito dele mesmo’.


Segundo ele, por enquanto a entidade vai apenas ouvir porque a presidente eleita Dilma Rousseff ainda não se manifestou sobre o assunto.


A ANJ condenou, porém, a proposta em estudo pelo governo de criação de uma agência para controlar o conteúdo divulgado por meios de comunicação digital, considerada inconstitucional pelo órgão, o que causou reação do ministro.


‘A ANJ não é a Suprema Corte’, disse Franklin. ‘Se ela achar isso [que é inconstitucional], que vá ao Supremo. Viver é perigoso, como diria Guimarães Rosa.’


Segundo ele, ‘em todos os países existem normas que devem ser seguidas com relação ao conteúdo’, e o Brasil não é uma ‘jabuticaba’ para achar que será diferente.


É preciso garantir, disse o ministro, que os veículos respeitem, por exemplo, a privacidade, a raça e defendam a língua portuguesa.


Franklin disse a uma plateia de dirigentes de agências reguladoras de vários países, de entidades representantes dos veículos de comunicação e de ONGs que, ‘apesar de momentos de fúrias mesquinhas, a nossa sociedade tem vocação para o entendimento’ e, mais de uma vez, pediu que se afastem os ‘fantasmas’ desta discussão.


‘O setor está cheio de motivos para ver fantasmas’, disse Roberto Antonik, diretor da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão). ‘O ministro nunca usou o poder dele para restringir a liberdade de expressão, mas há muitos movimentos sociais com reivindicações nesta linha.’


Entidades como ANJ e Abert, entre outras, enxergam no movimento para criar novas regras para o setor de telecomunicações e radiodifusão uma ameaça de impor censura à imprensa.


O ministro classificou o temor de ‘truque’, segundo ele, ‘porque todos sabem que isso não está em jogo’.


Franklin disse que o país não discute questões como a propriedade de rádios e TVs por congressistas e que ‘é evidente que está errado’.