Thursday, 16 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

A questão nuclear e a pressão sobre os jornais

Com o crescimento do debate sobre os planos nucleares do Irã, jornalistas iranianos sofrem com a pressão para não criticarem seu país na cobertura do assunto. O governo, informa Roxana Saberi [BBC News, 24/3/06], teria alertado aos veículos de imprensa que evitem críticas pesadas sobre política nuclear.

Recentemente, em uma coletiva de imprensa, o ministro da Cultura, Mohammad Saffar-Harandi, deixou claras as orientações do governo quando disse aos jornalistas que eles não devem pôr em risco os interesses do Irã e a segurança nacional. ‘Nos últimos meses, algumas pessoas da imprensa têm escrito as mesmas coisas que nossos inimigos diriam’, afirmou. ‘Isso é muito difícil para mim, então eu peço aos jornalistas que sejam cuidadosos. Não quero que nenhum dos jornais que vemos hoje nas bancas seja fechado’, completou.

Ao mesmo tempo, alguns jornalistas dizem que o Conselho de Segurança Nacional pressiona a mídia para não apresentar os esforços diplomáticos do Irã sobre seu programa nuclear como ‘um fracasso’. Eles contam também que o conselho instruiu a imprensa a não criar ‘medo e incerteza entre os iranianos’.

Conservadores e moderados

Alguns jornais iranianos apóiam o objetivo do governo de construir um ‘programa nuclear pacífico’, mas outros discordam das políticas adotadas pelas autoridades, que consideram agressivas. Diários conservadores acreditam que Teerã não deve desistir de seu direito de possuir energia nuclear, enquanto os moderados defendem a importância da continuidade da diplomacia.

‘Nós não nos opomos ao princípio de ter energia nuclear pacífica’, afirma um jornalista do diário Etemade Melli, que não quis se identificar. ‘Mas eu acho que a mudança de linguagem que veio junto com nosso novo governo aumentou as tensões entre o Irã e o resto do mundo’.

Pressão, onde?

Alguns profissionais, entretanto, discordam da afirmação de que seriam pressionados pelo governo. Tudo depende de suas ‘crenças ideológicas’, nota a matéria da BBC News. O editor do jornal conservador Hamshahri diz que seu jornal não é pressionado pelo Estado. ‘Se eu achar que algo não é verdadeiro, eu não escrevo uma palavra sobre ele’, completa. ‘Não é que eu promova a posição do regime. Se eu não acreditar que a energia nuclear é o desejo da nação, estou certo de que não escreverei algo sobre isso no Hamshahri. Não seria obrigado a fazê-lo e, se algum dia fosse forçado, deixaria este jornal’. O jornal, curiosamente, é publicado pela prefeitura de Teerã.

Outros jornalistas afirmam se sentir limitados pela pressão governamental, mas confusos sobre quais são os reais limites. ‘Este é um dos problemas para os jornalistas iranianos: nós não sabemos quais são as linhas vermelhas’, afirma um repórter de um jornal reformista. ‘Você não sabe até onde pode ir ou criticar’.

Orgulho nacional

As emissoras de televisão e rádio locais normalmente apresentam as posições das autoridades sobre a questão nuclear. Mesmo que alguns iranianos afirmem não acreditar que a cobertura local conte a história completa – e prefiram recorrer a canais por satélite e à internet –, o governo consegue com sucesso passar sua mensagem para a população.

Analistas iranianos afirmam que a cobertura local ajudou muitos iranianos a ver o programa nuclear como uma questão de orgulho nacional – algo que eles devem apoiar apesar da crescente pressão internacional.

‘Não há pesquisas de opinião pública feitas por instituições independentes ou emissoras independentes. Também é difícil encontrar um jornal independente que possa ecoar as opiniões dos iranianos. Esta área da política governamental parece ter funcionado’, resume um analista de mídia – que também prefere ficar anônimo. ‘O regime iraniano conseguiu convencer até a comunidade internacional de que todos os iranianos pensam que a questão nuclear é uma questão nacional e um direito inalienável, e que, se os EUA tentarem tirar deles este direito, todas as pessoas apoiarão o regime’.