Wednesday, 01 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Gavyn Davies, Greg Dyke e Andrew Gilligan pedem demissão

Após a pancada do relatório de lorde Hutton, Gavyn Davies, presidente da BBC, foi o primeiro a pedir demissão, no mesmo dia da divulgação do texto, em 28/1. No dia seguinte, Greg Dyke, diretor-geral, seguiu seus passos. Mais um dia se passou e então Andrew Gilligan, autor da polêmica reportagem, foi a terceira baixa da corporação.

‘Cresci acreditando que não se escolhe seu próprio juiz e que a decisão dele é final’, disse Davies em breve comunicado. ‘Há uma tradição louvável na vida pública britânica de que aqueles que detêm autoridade no topo de uma organização devem arcar com as conseqüências do que acontece. Estou, portanto, escrevendo ao primeiro-ministro hoje para informar minha demissão como presidente da BBC, a partir deste momento’, afirmou.

De acordo com Ciar Byrne [The Guardian, 28/1/04], Davies decidiu levar a culpa por sua insistência em apoiar Andrew Gilligan em sua reportagem.

A vez de Dyke

Chris Bryant, membro trabalhista do comitê de cultura, disse que quem deveria pedir demissão era Greg Dyke. Dito e feito.

As três demissões e o pedido de desculpas que a BBC teve de fazer ao premiê Tony Blair foram o ápice da pior crise na história da corporação.

Para o cargo interino de Dyke, os diretores da BBC indicaram Mark Byford, diretor do Serviço Mundial da BBC. Já para substituir Davies, o escolhido foi lorde Richard Ryder, cujo pedido de desculpas ao premiê, ao contrário do de Dyke, foi aceito por Blair. ‘Em nome da BBC, não hesito em pedir desculpas sem reservas por todos os nossos erros e aos indivíduos cujas reputações foram afetadas por eles’, afirmou o presidente interino. Em breve discurso de seis minutos, Blair acolheu as desculpas. ‘Isso para mim sempre foi uma simples questão de acusação, muito séria e falsa, como lorde Hutton revelou’, disse. ‘Agora, [a acusação] foi retirada. Isso era tudo o que eu queria.’

Antes do pedido de desculpas, Blair foi enfático. ‘Só peço que aqueles que cometeram [o erro] e que o repetiram ao longo de todos esses meses retirem agora [o que disseram], completa, aberta e claramente’. Segundo Chris Tryhorn [The Guardian, 28/1/04], o primeiro-ministro disse que não deveria haver mais ataques ‘injustificados’ aos serviços de inteligência britânicos, agora que o lorde Hutton revelou que o dossiê de setembro refletiu a ‘boa-fé’ da atitude da inteligência no que havia de disponível à época.

A fim de assegurar a credibilidade da BBC, afirmou: ‘Quero deixar claro que respeito totalmente a independência da BBC. Não tenho dúvidas de que a BBC vai continuar, como deveria, a investigar e questionar o governo da maneira adequada’.

O destino de Gilligan

A dúvida sobre o que faria o repórter Andrew Gilligan após o relatório do inquérito durou pouco. Michael Brunson, editor político da ITN, disse que o repórter cometeu ‘um dos piores erros que um jornalista pode cometer’. ‘Trata-se de um ataque grave e infundado ao governo. Não importa o quanto discordem, todos têm que conviver com o que o juiz disse. As conseqüências para a BBC são seriíssimas.’ E acrescentou: ‘Está na hora de a BBC ser abrigada sob o guarda-chuva da Ofcom. O juiz disse que a comissão de diretores falhou em proteger o interesse público’.

Sem querer, Brunson estava prevendo o gesto de Gilligan. No dia 30/1, o repórter pediu demissão e se desculpou pelos erros cometidos na transmissão de maio de 2003. ‘Minha partida é de iniciativa própria’, disse em comunicado divulgado por Jill Lawless [AP, 30/1]. ‘Mas a BBC foi coletivamente vítima de uma grande injustiça.’

Ao justificar sua decisão, disse que ama a BBC e está deixando a corporação para protegê-la. ‘Aceito minha parcela de culpa na crise que desgastou a organização. Mas uma grande parcela deve-se aos julgamentos parciais’ de lorde Hutton, disse Gilligan.

Segundo reportagem da AFP [29/1/04], diversos articulistas e comentaristas consideraram o relatório de Hutton uma camuflagem de erros de Blair, que deve concorrer às eleições em 2005. ‘São Tony – Hutton pinta Blair mais branco que a cor branca’, declarou o jornal Daily Express na primeira página. Ilustrando, uma foto de Blair sorrindo com uma auréola sobre a cabeça.