Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O presente do rádio do futuro

Muito tem se falado sobre a televisão digital. Sobre as novidades que serão trazidas por essa nova mídia. Sobre o futuro de integração com a internet. Sobre a possibilidade de se assistir vídeos on-demand, em sua TV, a partir de uma interface com a web. Mas onde se encaixa o rádio nesse futuro próximo? Se a TV se interligará com a grande rede, o que acontecerá com o áudio?

Pouco se fala sobre o rádio, até porque hoje essa é uma mídia considerada de menor potencial do que a televisão. Mas ainda assim, é preciso ressaltar que é um meio de comunicação de audiência expressiva e de grande alcance, ainda com uma expectativa de vida longa. Por isso, não menos importante é tentar descobrir o que aguarda o áudio no futuro.

Na verdade, não é preciso divagar muito sobre o que espera os ouvintes no futuro, quando ocorrer (e se ocorrer!) uma integração de todas as mídias a partir da internet. Acontecendo ou não a integração total com a grande rede. Acabando ou não a transmissão exclusiva para aparelhos de som e radinhos portáteis, o rádio já convive com o mundo digital.

Para saber como será essa convivência, não é preciso, entretanto, um exercício muito grande de imaginação. Basta navegar na rede. O futuro já acontece. São inúmeros os exemplos de como as emissoras têm feito, cada qual de sua maneira, a disponibilização de seus conteúdos para os internautas.

A uma primeira olhada, seria fácil destacar pelo menos dois modelos distintos de transmissão de áudio pelas webradios (as rádios da web). O primeiro deles seria a transmissão linear da programação, tal qual acontece no rádio tradicional. Para isso, basta clicar no link da transmissão ‘ao vivo’ e escutar o programa que sai do estúdio entra em seu computador, seja através do site de uma rádio tradicional (que também transmite via AM ou FM) ou de uma rádio exclusivamente online (que só existe na web).

O segundo seria um modelo já desenvolvido para a plataforma da internet: o áudio on-demand (ou sob demanda). Nesse modelo, como o nome já sugere, você não tem uma programação linear e ao vivo. A rádio coloca à disposição toda sua programação (ou parte dela) em seu site e o ouvinte/internauta só escuta o conteúdo que ele quer, na hora em que ele quiser, clicando nos links das reportagens, entrevistas ou programas de seu interesse.

Rádio ao vivo

Nesse artigo, procurarei mostrar alguns exemplos dentre os mais variados modelos já adotados pelas rádios na internet. Em uma forma mais primária, por exemplo, de simples transposição do áudio para a internet, podemos encontrar o modelo adotado pela Rádio Manchete AM 760, do Rio de Janeiro.

O site da emissora é constituído unicamente por uma home page com um link para escutar, ao vivo, a programação da rádio. Não há qualquer outro atrativo no site, além do streaming da emissora. Ou seja, não há informações sobre a equipe ou sobre a programação da rádio. É a rádio em sua mais pura essência.

No mesmo caminho, encontramos a Rádio Haroldo de Andrade AM 1.060, do Rio de Janeiro. Apesar de ter uma página mais completa, com dados sobre a equipe e sobre a programação, a emissora tem apenas uma opção, no que se refere ao áudio (objeto de análise deste artigo): o link para a programação ao vivo da rádio (cujo estúdio também pode ser visto, via webcam). Não há aqui disponibilização de reportagens ou programas on-demand.

Ainda no que se refere ao modelo de transmissão linear, um segundo tipo de webrádio é o portal de emissoras, encontrado em exemplos como o norte-americano Shoutcast. Nessa plataforma, vemos a disponibilização de várias emissoras transmitindo ao vivo, em um mesmo site, divididas por perfil de conteúdo. Cabe ao ouvinte escolher a rádio que quer escutar.

Quer escutar heavy metal? A Shoutcast coloca a sua disposição mais de 200 rádios especializadas no estilo. E que tal um pouco de notícia? São quase 400 estações na modalidade talk. Quando fechava este artigo, nada menos de 334 mil ouvintes estavam logados no portal Shoutcast.

Rádio sob demanda

Na modalidade de áudios on-demand vemos emissoras que trabalham com uma plataforma mais adaptada a internet, onde a transmissão linear convive com arquivos de programas/reportagens que podem ser baixados a qualquer hora pelo ouvinte.

Além de colocar links ao vivo para suas emissoras, a CBN, por exemplo, disponibiliza reportagens ou programas exclusivamente em áudio (ou seja, aqui as reportagens ainda não podem ser lidas, apenas ouvidas) para que o internauta possa baixar e escutar o assunto que mais lhe agrada.

Abrindo a página da emissora do Sistema Globo de Rádio, o internauta encontrará uma reportagem principal, a única que vem com um resumo em forma de texto. Abaixo dele, será possível encontrar chamadas para várias reportagens, que já foram ao ar, na CBN, mas que estão disponíveis ali no site para ser escutadas a qualquer hora pelo ouvinte. A Rede Gaúcha adota modelo semelhante.

Já a Rádio Itatiaia, de Minas Gerais, não dispõe de tanta opção de downloads em áudio, mas adota um modelo interessante. Além de ter a transmissão linear ao vivo, a emissora disponibiliza informações escritas para subsidiar o ouvinte, como tabelas de campeonatos de futebol e regulamentos de competições. Há também informações escritas com links em áudio.

Como, por exemplo, os resultados dos jogos, que podem ser lidos logo na tela principal da rádio. Mas, se você quiser sentir a emoção da narração do gol de seu time do coração, existe a opção de ouvir os gols. Eu pude escutar o gol do Cícero, o segundo do tricolor carioca no empate de 2 a 2 com o Cruzeiro, na estréia do Campeonato Brasileiro. Não foi muito emocionante, porque o Fluzão não estreou bem. Mas o que vale é a inovação da Itatiaia. A Rádio Tupi AM 1.360 também adota o mesmo modelo, colocando online o áudio dos gols da rodada.

Rádio para ler e ouvir

A Rede Pública de Rádio dos Estados Unidos, a NPR traz a multimídia em um passo mais adiante. O site coloca no ar notícias exclusivamente texto e outras em texto/áudio, em que é possível ler o conteúdo, na íntegra, ao mesmo tempo em que (ou em vez de) ouvir a reportagem. O modelo tem a vantagem de ser adaptável ao ouvinte/leitor. Se o momento não lhe permite ouvir determinada reportagem, você pode lê-la. Mas se o contrário ocorrer e você não tiver a possibilidade de ler o texto, basta clicar no link e escutar a notícia.

No caso das emissoras Clear Channel, o distanciamento do modelo de rádio tradicional é ainda maior. Aqui o conceito multimídia é levado adiante. Há as notícias em texto e em áudio, como nas rádios acima. Mas há também uma versão que mistura as duas mídias. Nesse último caso, as reportagens trazem o texto escrito e, ao mesmo tempo, sons que complementam a notícia. Não são o texto e o áudio trazendo a mesma informação. São texto e áudio se complementando, com informações distintas.

Há por exemplo, o caso de um policial que passou mal por comer um bolo feito de maconha. O texto da notícia situa o leitor, explicando o que ocorreu. Mas, ao mesmo tempo, é possível ouvir a ligação que o policial fez para o 911 (serviço de emergência dos EUA). O áudio é apenas um plus para o internauta, sem ser essencial para a compreensão da notícia lida. É um bom exemplo de multimídia.

Modelos online

Já é lugar-comum dizer que a internet democratizou a comunicação, permitindo que qualquer pessoa passasse a ser um emissor no processo comunicacional. Com a rádio, o processo permitiu a criação de rádios e programas online, que não conseguiam espaço no dial AM ou FM.

Algumas rádios optaram por um modelo de transmissão linear, tal qual as emissoras de ondas médias e de freqüência modulada, como é o caso da WebRadio Uerj, emissora universitária da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Outras optaram por um modelo híbrido, de transmissão linear e on-demand, como é feito nos sites de grande parte das rádios convencionais. É o caso da Cidade Web Rock, remanescente da antiga Rádio Cidade do Rio de Janeiro, que já habitou o dial carioca em 102,9 FM.

Mas há ainda um novo modelo, criado especialmente para a internet, que rompe com o paradigma linear e opta exclusivamente pelo on-demand. O Portal Terra Podcast é um desses exemplos. No site, o internauta encontra listados oito programas em áudio, que podem ser baixados e escutados no computador ou em qualquer tocador portátil de MP3.

A internet possibilita ainda projetos menos ambiciosos do que a criação de uma rádio. Com um equipamento de gravação e um editor de áudio, é possível, por exemplo, que você crie seu próprio programa em áudio e o disponibilize em um site ou blog, sem a necessidade de se criar uma emissora online.

Bons exemplos disso são os programas Bola nas Costas, disponibilizado em um blog do portal GloboEsporte.com, e Clube do Bolão, mesa-redonda produzida por cinco amigos jornalistas e comunicadores sociais. Os programas são gravados semanalmente e disponibilizados em MP3 para download do internauta, a qualquer hora do dia ou da noite.

Não é possível dizer, portanto, se um dia as emissoras irão parar de transmitir em AM, FM ou via satélite, e se passarão a transmitir exclusivamente pelo computador (o que eu, pessoalmente, acho bem improvável). Mas é certo que já se pode hoje visualizar o futuro do rádio e vislumbrar o que a internet reserva para o ouvinte nos próximos anos.

******

Jornalista, chefe de reportagem da Sucursal Rio de Janeiro da Radiobrás/Rádio Nacional