Sunday, 05 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Presidente diz que seguiu orientação

A respeito do artigo ‘Funtelpa: o ato é errado, ou vil‘, a presidente da Fundação de Telecomunicações do Pará, Regina Lima, enviou carta ao Jornal Pessoal para fazer os seguintes esclarecimentos:

‘Sei que muita gente está surpresa com o encaminhamento que a atual administração estadual deu ao contrato, disfarçado de convênio, entre a TV Liberal e a Fundação de Telecomunicações do Pará (Funtelpa), firmado em 1997 e prorrogado por diversos termos aditivos, o último dos quais em 31 de dezembro de 2006, que deveria vigorar até dezembro de 2007.

‘Por falta de costume, muita gente imaginou que tudo seria esquecido e jogado para debaixo do tapete, que nenhuma apuração seria feita, e o Estado continuaria a ser lesado. Mas o governo agiu rápido, sustou de imediato o pagamento, cuja fatura da Tv Liberal, referente ao mês de janeiro importava no valor de R$ 476 mil, e desta forma estancar a sangria aos cofres públicos. Também decidimos, desde os primeiros dias de gestão, instaurar um Processo Administrativo Disciplinar que concluiu, no dia 07 de março de 2007, pela declaração de nulidade do referido convênio, sendo os autos encaminhados ao Ministério Público do Estado.

‘Em seguida teve início o processo que apura a responsabilidade dos gestores que assinaram o tal convênio e seus atos de prorrogação. Tanto o senhor Francisco César Nunes, como os senhores José Nélio Silva Palheta e Ney Emil da Conceição Messias Júnior foram devidamente citados aos processos, mas ao invés de utilizarem das garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, não atenderam ao chamado dos membros da comissão de processo administrativo.

‘No dia 18 de agosto a comissão encerrou os processos, e recomendou a exclusão do senhor Francisco César de punição por conta de já haver escoado o prazo legal para a sua aplicação, ocorrendo a prescrição. Quanto aos demais ex-presidentes recomendou a comissão a demissão, a bem do serviço público, dos senhores José Nélio Silva Palheta e Ney Emil da Conceição Messias Júnior.

‘Esclareço que seguindo orientação jurídica da assessoria da Funtelpa assinei as portarias aplicando as penalidades sugeridas pela comissão. Mas no mesmo dia da publicação no Diário Oficial, fui alertada, pelo Dr. Ibraim Rocha, Procurador Geral do Estado, que não tinha competência para o ato, que é privativo da Chefe do Poder Executivo Estadual. Assim, imediatamente assumi, publicamente, o erro ao revogar as duas portarias que tratavam de demissão de dois ex-dirigentes da Fundação. O reparo foi feito com 24 horas, tempo suficiente para publicar o ato no Diário Oficial do Estado no último dia 31 de agosto.

‘Porém mantive a aprovação ao relatório da Comissão Processante e em seguida remeti os autos à apreciação da Governadora do Estado. Portanto, não entendo o motivo de tanta fúria do editor do Jornal Pessoal em classificar o episódio como de uma ‘gravidade monstruosa’, como ‘ato vil’ou ainda ‘ato de vingança’ .

‘É dever do administrador público apurar qualquer irregularidade administrativa quando dela toma conhecimento. Se não o faz é omisso. E o Estado não deve apurar apenas a responsabilidade do agente privado que se beneficiou pelo uso de equipamentos públicos, mas também dos que têm a missão de zelar pela guarda do patrimônio público. O ato que beneficiou a TV Liberal foi assinado por um servidor público, investido em função de confiança dos governadores da época.

‘E como o Processo Administrativo concluiu, em março, que o convênio é uma fraude e, portanto, nulo de pleno direito, por ser incompatível com a natureza jurídica dos convênios, qualquer agente particular não pode receber pagamento como contrapartida pelo uso de bens públicos, obtendo vantagens econômicas, como ocorria com a cessão e uso dos equipamentos de transmissão da Funtelpa à TV Liberal, evidentemente que quem se omitiu de cumprir a lei está passível de ser responsabilizado por isso.

‘Ora, se a lei determina um procedimento previsto na lei de licitações e o administrador público não o faz com grave lesão ao erário, e que possibilitou um pagamento indevido de mais de R$ 35 milhões, em valores históricos, com franco prejuízo aos cofres público, é evidente, portanto, que este administrador deve estar sujeito às penalidades previstas no Regime Jurídico Único, Lei n° 5.810/94.

‘Sei que provoca uma reação de surpresa o ato de demitir quem já foi exonerado – e nisto os advogados devem ter a palavra –, mas a penalidade apontada pela comissão de inquérito está baseada na justificativa que a infração administrativa cometida pelos dois ex-dirigentes da Funtelpa é punível com demissão e implica em repercussões que vão além do simples afastamento do servidor até a impossibilidade de retorno ao serviço público estadual. Serve também de subsídio para a caracterização dos ilícitos civis e penais correlatos, a ser perseguida pelo Ministério Público e outras instituições de controle social, como o Tribunal de Contas do Estado.

‘Aproveito também para esclarecer que a simples revogação do aditamento contratual, assinado em 31 de dezembro do ano passado, implicaria dizer que os atos anteriores foram legais, como se tudo que foi pago pelo Estado fora realmente devido. Por isso mesmo, ao declarar a nulidade do convênio, mediante o competente processo administrativo, apesar de mais demorado, tem uma ampla repercussão jurídica, pois significa que o Estado reconhece que todos os atos anteriores foram nulos. Portanto, especialmente os pagamentos foram indevidos, e não apenas os que estavam vencendo.

‘Finalmente gostaria parabenizá-lo pelos 20 anos de bons serviços prestados à Amazônia e ao país pelo Jornal Pessoal.’

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L.F.P. responde

Em primeiro lugar, registro a iniciativa da presidente da Funtelpa de responder à matéria. Devia ser ato rotineiro do servidor público, mas acabou sendo expurgado da agenda dos integrantes dos governos no Pará. Eles substituíram o sábio adágio popular, segundo o qual quem cala, consente, pela tática dos oportunistas, que apostam na memória curta da sociedade. Dão sua efetiva contribuição à desmemoria coletiva e instauram o cinismo como tática e estratégia. A presidente da Funtelpa reagiu de pronto e prestou seus esclarecimentos, como é de seu dever. E se comportou democraticamente na relação epistolar e no contato pessoal com o autor das críticas, que são de fundo e não de superfície. Dizem respeito a temas e não a pessoas.

A presidente da Funtelpa está muito mal assessorada juridicamente no exercício da sua função. Bastou consultar o procurador geral do Estado para ficar sabendo que exorbitaria de sua competência específica ao demitir os dois ex-presidentes da fundação, conforme lhe recomendara o advogado da instituição. Se tivesse tido a cautela prévia, não se veria obrigada a revogar seu ato em 24 horas.

Pelo jeito, porém, o erro não foi apenas formal: se até hoje, passadas mais de duas semanas, a governadora não endossou a sugestão da sua subordinada, é porque o erro é de conteúdo. A governadora tem a competência que falta à presidente da Funtelpa para efetivar as exonerações a bem do serviço público, mas os decretos expurgatórios não foram assinados. E se o forem, incorrerão nos ônus que foram aqui suscitados.

Este jornal partilha a convicção de que os responsáveis pelos atos ilegais devem ser processados e punidos. Mas certamente os três ex-presidentes da Funtelpa não foram depor no inquérito administrativo, instaurado a propósito do vergonhoso ‘convênio’ assinado com a TV Liberal, por orientação de seus advogados. Os dois últimos, Nélio Palheta e Ney Messias, não são servidores públicos. Apenas ocuparam transitoriamente cargos de confiança. O outro, Francisco Cézar Nunes da Silva, deve ter-se reservado o direito de só depor em juízo.

A justiça é que é o local adequado para a averiguação dos fatos e das culpas. A esta altura dos acontecimentos, o delito em causa é a eventual improbidade cometida. A demissão remissiva evaporou do mundo do direito. Se a Funtelpa quer realmente apurar as responsabilidades, tem que seguir orientação mais competente do que a do seu serviço jurídico.

Quanto à melhor maneira de enfrentar o ‘convênio’ com a TV, o futuro logo dirá quem está com a razão: se a Funtelpa ou se este jornal. A prova dos nove virá quando – e se – a TV Liberal, a partir de janeiro do próximo ano, recorrer à justiça para receber o que não lhe foi pago em 2007, durante o qual a Funtelpa colocou o ar a programação da emissora dos Maiorana sem remunerá-la pelo serviço. Poderá ainda pedir ressarcimento e as cominações devidas pelo rompimento unilateral do mal disfarçado contrato, feito pela Funtelpa.

Aí verificaremos se os procedimentos adotados pela fundação estadual de telecomunicações realmente a imunizarão dos efeitos legais dos seus atos. No entendimento deste jornal, seria mais simples e eficaz revogar imediatamente o aditamento de prorrogação por mais um ano da excrescência. Assim procedendo, faria cessar todo e qualquer vínculo com a TV Liberal. Poderia ainda entrar com uma ação de nulidade na justiça, combinada com pedido de indenização e denúncia dos ex-dirigentes da Funtelpa por improbidade.

Adotar os procedimentos administrativos mais drásticos contra o ‘convênio’ e seus personagens e, ao mesmo tempo, continuar a retransmitir a programação gerada pela TV Liberal, me parece uma contradição grave, que deverá ser explorado no próximo local de combate: a justiça. Foi o que já antecipou o recurso administrativo da TV Liberal, cujos argumentos foram ignorados pela governadora, ao rejeitá-lo. Sinceramente, espero que eu esteja errado, não a Funtelpa. Ao menos, me desculparei junto aos leitores, sem causar qualquer dano ao erário – lesão que acontecerá se quem estiver errada for a Funtelpa. Nesse caso, quem pagará o pato? (Lúcio Flávio Pinto)

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Editor do Jornal Pessoal, Belém (PA)