Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Lembrando 1922, de olho em 2022

O 190º aniversário da Independência está sendo lembrado da forma habitual – distraída, na melhor das hipóteses burocrática. O brasileiro torna-se insensível aos grandes frissons coletivos, conforma-se com a limitação das suas expectativas. Mesmo na esfera esportiva – um dos poucos, talvez único segmento capaz de acionar brios – a animação inicial com a realização de dois magnos eventos internacionais está sendo desativada pelo inevitável ceticismo que escorre dos sucessivos escândalos, da omissão e do desleixo funcional dos governantes.

A efeméride de sexta-feira (7/9) nos confronta com outras duas: o primeiro centenário da nossa emancipação em 1922, espetacular evento internacional que projetou o Brasil como nação-surpresa, e o segundo centenário a ser comemorado em 2022, dentro de apenas 10 anos.

Justifica-se o advérbio apenas já que a apresentação da candidatura do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas teve uma antecipação de sete anos e o segundo centenário de nosso nascimento, com um prazo ligeiramente maior, poderá ter significados mais espetaculares, empolgar o país inteiro, e não somente no tocante a avanços logísticos e urbanísticos.

Reação modernista

Até 2022 deverá estar superado o desafio (ou maldição) do “País do Futuro”, este é o nosso deadline. Não é prazo fatal, ao contrário, é um marco vital. Até 2022 o Brasil deverá materializar o seu potencial econômico, as promessas de generosidade social e, sobretudo, confirmar a sua criatividade numa proposta cultural consistente. Em 2022, deverá estar visível ou perceptível, a sonhada civilização brasileira.

A decisão de preparar o Rio de Janeiro como vitrine do Brasil não começou em 1922, mas no início do século 20, quando se decidiu comemorar o centenário da abertura dos portos em 1908 e o fim da reclusão econômica e cultural imposta pela decadente coroa portuguesa. A idéia da Cidade Maravilhosa começou naquele momento com a espetacular façanha do prefeito Pereira Passos reurbanizando a capital num prazo recorde e de Oswaldo Cruz, tornando-a sanitariamente viável.

A discussão sobre os festejos de 1922 preparou o país para uma nova fase. Os grandes jornais celebraram o decisivo papel mobilizador da imprensa na Independência e a escolha do Sete de Setembro de 1922 para marcar a primeira emissão radiofônica em território brasileiro – o início da Era do Rádio – revela a disposição nacional para um grande salto adiante.

Historiadores começaram a questionar a veracidade do próprio “brado retumbante” às margens do Ipiranga (o marco da Independência seria a coroação do Imperador, em 12 de outubro); a Semana de Arte Moderna, de fevereiro de 1922, configurava-se como reação da intelectualidade paulista à hegemonia do Rio de Janeiro (anfitrião dos faustosos festejos do Centenário) e resistência aos paradigmas parnasianos e realistas que imperavam nas artes.

Metas e premências

A Europa ainda não se recobrara da calamidade da Grande Guerra terminada em 1918, a fome devorava a recém-criada URSS, a vertiginosa inflação corroia a economia alemã, o agitador antibolchevique e antissemita Adolf Hitler ainda era um desconhecido das massas, mas o fanatismo da extrema-direita alemã iniciava a derrubada do projeto socialdemocrata da República de Weimar enquanto Benito Mussolini sentia-se preparado para a audaciosa Marcha Sobre Roma, que marcaria o lançamento mundial do fascismo. A rica e amena América do Sul era a alternativa ao ódio que fermentava no Velho Mundo.

As fronteiras alargaram-se, as oportunidades são as mesmas. O Segundo Centenário pode oferecer o imperioso conteúdo que a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos até agora não parecem ser capazes de fomentar. Precisamos de metas e premências: se os “50 anos em 5” de JK são apertados, vamos fazê-los nos próximos dez.