Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O primeiro debate eleitoral na TV

Foi morno o primeiro debate televisivo entre os candidatos à Presidência, na quinta-feira (5/8), na TV Bandeirantes. Embora cercado de muita expectativa quanto a desempenhos capazes de influir decisivamente nas pesquisas de voto, a performance dos candidatos, que em sua maioria denotavam nervosismo, não ofereceu argumentos ou dados novos capazes de lograr tal feito.

A audiência também não empolgou: concorrendo com a semifinal da Copa Libertadores, disputada entre o Internacional de Porto Alegre e o São Paulo e transmitida ao vivo pela Globo, o evento, embora chegasse a registrar 5,5 pontos de audiência, teve, segundo o Ibope, média de 1,85 pontos, ficando atrás da emissora líder (36,9 pontos) e da Record (7,4) e empatando em quarto lugar com a Rede TV (cada ponto corresponde a cerca de 52,3mil domicílios).

Tanto o pouco interesse quanto o desempenho tíbio dos candidatos não chegam a surpreender, ainda mais por estarmos ainda no início da campanha televisiva. Ademais, com raras exceções – o enfrentamento aberto entre Leonel Brizola e Paulo Maluf em 1989, peleja verbal que quase chega às vias de fato; a artilharia incessante de Mário Covas contra o mesmo Maluf nas eleições para governador de São Paulo em 1998 –, os debates eleitorais na TV brasileira não têm uma tradição que prime pela discussão efetiva dos programas dos candidatos ou pelo debate de alto nível sobre as grandes questões nacionais.

A estratégia ‘paz e amor’

Talvez a evidência que melhor corrobore tal premissa seja a constatação de que, no Brasil, a grande referência histórica, no que concerne a debates eleitorais, seja externa ao confronto de ideias na arena televisiva: a edição manipulada das imagens do segundo debate entre Lula e Collor, em 1989, na Globo, que se transformou num estudo de caso clássico, elucidativo da intervenção indevida da emissora na vida político-institucional do país.

Mediado pelo jornalista Ricardo Boechat, o debate da Band, coberto in loco por 210 jornalistas, pecou, uma vez mais, por regras que engessam o debate e atrofiam a elaboração de conceitos e projetos. Como apontou o jornalista João Bosco Rabello no Estado de S.Paulo, sem ‘um mínimo de tempo para abordagem mais profunda de problemas específicos do país, irá prevalecer a má lógica da superficialidade, que premia os menos preparados e submete o espectador/eleitor a uma análise estrita da performance de cada um’.

A dificuldade em limitar suas intervenções ao tempo pré-estipulado foi recorrente para Dilma Rousseff (PT) e para José Serra (PSDB). No mais, a candidata petista não se comprometeu, mas também não empolgou. Ciosa de estar na dianteira nas pesquisas, de ter o apoio de um presidente extremamente popular e de dispor de um amplo mostruário de realizações de um governo apoiado por mais de 70% da população, aparentemente reproduzirá a estratégia ‘paz e amor’ adotada por Lula em 2002, evitando agredir – ainda que isso lhe faça perder oportunidades de marcar posição, como ocorreu mais de uma vez no debate em questão.

‘No radar dos tuiteiros e da imprensa’

Tal como Dilma, Marina Silva (PV) também não teve um desempenho comprometedor, mas o fato de tampouco ter se destacado é, no caso dela, altamente preocupante, já que a etapa televisiva da campanha representa a última esperança sua e de seus correligionários de alcançar, pela primeira vez, os dois dígitos na intenção de votos dos eleitores e credenciar-se como candidata realmente competitiva, com chances de vitória.

Mas talvez o candidato com a pior performance tenha sido José Serra. Embora não tenha recaído em um de seus ataques agressivos contra jornalistas – como esperava parte da blogosfera petista –, também não confirmou a expectativa da militância tucana – expressada de forma incessante na web nos momentos que antecederam ao debate – de que sua experiência e capacidade de oratória ‘arrasariam’ Dilma. A bem da verdade, o ex-governador mostrou-se extremamente absorto: por duas vezes, pediu que repetissem a pergunta, pois estava distraído e, também por duas vezes, chegou a esquecer o que estava falando. Tais lapsos que despertaram inquietações quanto à saúde do candidato peessedebista.

Assim, a estrela da noite acabou sendo Plínio de Arruda Sampaio (PSOL/SP): não obstante octogenário, o veterano político, ex-democrata cristão, ex-petista, soou, para muitos, como se se tratasse de uma ‘cara nova’ na política. Como aponta o jornalista e blogueiro Rodrigo Vianna, em um belo e emocionado texto, no qual tece reminiscências de sua relação pessoal com o candidato, Plínio, dessa forma, ‘entrou no radar dos tuiteiros e da imprensa em geral’.

Momento de estrela

E foi justamente criticando o boicote da mídia à sua candidatura que o candidato do PSOL deu início a uma performance que acabaria por, ocasionalmente, empolgar até a claque de adversários. Embora, a princípio, desse mostras excessivas de rancor contra seu ex-partido, Plínio revelou-se um hábil e ferino esgrimista das palavras, ora atacando Dilma, ora Serra; e, sardônico, chamando Marina de ‘ecocapitalista’.

Trata-se, na verdade, de um impacto que tende a diluir-se à medida em que Plínio deixe de soar como uma novidade – e, não obstante a verve afiada, é muito pouco provável que sua atuação altere substancialmente a votação de um candidato sem chances reais de vitória. Mas, na estreia dos debates televisivos – que tendem a crescer em importância ao longo da campanha, em canais com mais audiência como Record e Globo –, garantiu ao íntegro e incansável Plínio um merecido momento de estrela.

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Jornalista e cineasta, é doutorando em Comunicação pela UFF; seu blog