Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

País é invadido por revistas de fofocas

Por décadas, os franceses evitaram o gosto dos britânicos e americanos por tablóides sensacionalistas e revistas espalhafatosas de celebridades. No entanto, o relatório anual dos dados de circulação de revistas no país revela que, pela primeira vez, as publicações semanais mais vendidas em 2005 foram as chamadas ‘presse people’. Mais de um milhão de cópias deste tipo de publicação são vendidas semanalmente. Enquanto o número de leitores de jornais tradicionais como Le Monde e Libération diminui, a venda das revistas de fofocas como Voici, Public e a mais recente Closer cresce cada vez mais.

Muitos na França acreditam que a chegada de revistas de fofocas baratas revela um mal-estar mais profundo, em parte como resultado de uma inflexível influência da temida ‘globalização’ no estilo de vida local e no idioma francês. No começo, foi necessário pegar emprestado uma expressão da língua inglesa para descrever as novas revistas, mas agora as publicações da categoria ‘presse people’ são parte integrante do cenário cultural e já deram origem a uma variedade de neologismos na linguagem cotidiana. Assim, a mídia francesa passa por um processo de ‘peopolisation’, com o crescimento do sensacionalismo e do culto às celebridades. ‘Uma das razões do nosso sucesso é que a sociedade tornou-se ‘peopolizada’’, opina Jean-Paul Lubot, executivo que lançou a Closer em junho.

Além das revistas de celebridades, outras publicações atraem críticas – e leitores. A última edição de Choc trouxe 114 páginas de fotos coloridas, que mostravam desde corpos no Iraque a um topless da atriz francesa do filme Harry Potter. Lançada há um ano, a Choc vende 370 mil cópias a cada duas semanas e já conta com um número de imitações. O editor Gerard Ponson afirma que sua inspiração veio da revista de fotojornalismo americana Life. ‘O objetivo é ter uma revista que seja lida do começo ao fim, e as pessoas não vão mais ficar parando em páginas com longos textos, não importa quão bem escritos eles sejam. Estamos todos afetados pela globalização’, afirma.

Nem televisão e políticos escapam

O fenômeno atingiu também a televisão. Um dos programas de maior sucesso na televisão tem sido o Star Academy, uma mistura dos reality shows Big Brother e Pop Idol, no qual jovens interessados em fazer carreira no show business são avaliados diante das câmeras. Muitos artigos sobre o programa foram publicados nas revistas Closer e Voici.

Nem a política ficou de fora, destruindo a antiga tradição de separar a vida pública e a vida privada das personalidades francesas. A vida amorosa de Nicolas Sarkozy, o controverso ministro do Interior, foi tema de várias revistas. Fotografias de sua mulher, da qual ele se separou, com um ‘amigo’ nos EUA dispararam as vendas de Paris Match em mais de 500 mil cópias – só a edição com a morte do papa João Paulo II vendeu mais do que isto.

Executivos da Closer revelam que os leitores franceses têm expectativas diferentes dos ingleses. Os da Voici também afirmam que são cuidadosos em se distanciar do mercado anglo-saxão. ‘Nós temos um tom diferente. Não somos vulgares ou indecentes, somos divertidos e impertinentes’, defendem.

Não é esta a opinião de Phillippe Kartzenty, presidente da empresa de consultoria Media Ratings, com sede em Paris. ‘Se os franceses fossem tão intelectuais, eles leriam mais jornais e menos este tipo de revista. Quando você pergunta às pessoas qual canal de televisão elas preferem, todas dizem que é o mais sério e o mais inteligente, mas na verdade os dados revelam que é algo totalmente diferente’, afirma. Para ele, as revistas chamadas ‘presse people’ também têm seu lado positivo: elas foram as únicas a desafiar as elites políticas e culturais do país. ‘Estas revistas são as únicas genuinamente independentes e constituem a única zona de verdadeira liberdade de imprensa. O resto é obediente’, opina. Muitas destas revistas pertencem a empresas estrangeiras, que pagam bem e cujos repórteres estão mais afastados dos políticos do que aqueles que trabalham nas publicações de maior prestígio. Informações de Jason Burke [The Observer, 11/12/05].