Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Uma carta aos jornalistas

O papel da comunicação social é o de transmitir significados entre as pessoas para a integração das mesmas na sociedade, o que se dará necessariamente com a promoção da igualdade entre os grupos que a compõem. Neste contexto, foi divulgada na web, na quinta-feira (13/5), uma ‘Carta aos Jornalistas’ em virtude da passagem do dia que marcou os 122 anos de abolição da escravidão no Brasil – e é também o Dia Nacional de Combate ao Racismo.

Temos como jornalistas responsabilidade social, pois nossa matéria-prima vem das demandas sociais. Com elas lidamos 24 horas por dia, servindo o jornalista e a jornalista de ‘ponte’ entre as reivindicações populares e as chamadas autoridades constituídas, que por isso acabam sendo fiscalizadas pela mídia. Por isso é essencial fazer a nossa crítica interna diária, a fim de não reproduzir em nosso cotidiano as injustiças que retratamos e analisamos.

As Comissões de Jornalistas pela Igualdade Racial ligadas aos sindicatos no município do Rio de Janeiro, no Distrito Federal e nos estados de Alagoas, Bahia, Paraíba, São Paulo e Rio Grande do Sul (onde se chama Núcleo de Jornalistas Afro-Brasileiros) apoiaram o documento redigido pela Cojira-Alagoas, em cujo território abriga-se a Serra da Barriga, local onde o Quilombo de Palmares existiu e resistiu por quase 100 anos às investidas das forças dos colonizadores de então.

Expressões racistas

A luta destes grupos nos campos do trabalho e da educação (como impulsionadora do aprimoramento profissional) tem como objetivos incluir muito mais negros e negras na produção de conteúdo na mídia e influir na qualidade do que hoje é produzido sobre as culturas negras nos meios de comunicação. Isto significa também criticar matérias que não retratam de modo igual as fontes sobre temas que nos interessam mais de perto, como as ações afirmativas e, mais especificamente, a adoção de cotas no ensino superior (especialmente nas universidades públicas).

Na carta, também destacamos que os jornalistas devem no seu cotidiano evitar expressões racistas como ‘lista negra’, ‘línguas negras’, ‘a coisa tá preta’, ‘buraco negro’ (sem conotação científica), ‘páginas negras da história’, ‘samba do crioulo doido’ e vários outros.

Conforme frisamos no documento, temos entre os nossos desafios a tarefa de sensibilizar os jornalistas. E para isso contamos com espaços como este Observatório da Imprensa na internet. Sugiro que no seu espaço na televisão pública e no rádio o OI, em breve, paute para reflexão este tema que é tão caro a milhões de brasileiros.

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Carta aos jornalistas

Por um jornalismo que respeite os direitos humanos e a diversidade étnicorracial.

No dia 13 de maio de 1888, determinou-se a Abolição da Escravidão no Brasil, país que foi líder na realização do tráfico de escravos e um dos países que manteve por mais tempo o trabalho forçado. Mais de 15 milhões de pessoas foram retiradas do continente africano, e as justificativas para mantê-las escravizadas eram que estavam amaldiçoadas e pertenciam a povos inferiores. Sendo assim, vários reinos e famílias foram destruídos. Com a assinatura da Lei Áurea, as negras e os negros livres tiveram como herança a falta de formação educacional e profissional, habitações precárias e dificuldades financeiras. Eis uma mancha expressiva na nossa História!

O Movimento Negro adotou o dia 13 de maio como o Dia Nacional de Combate ao Racismo – dedicado às atividades reflexivas que promovam o debate sobre o cotidiano da população afro-descendente e também às apresentações artísticas que exaltam o legado africano deixado na cultura brasileira. Além disso, os coletivos que discutem as questões étnicorraciais no movimento sindical também contribuem para a propagação de novos paradigmas em diversas áreas.

A Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira-AL) vinculada ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Alagoas (Sindjornal) foi instalada no dia 24 de novembro de 2007. Por meio do seu blogue, twitter, informes afros e a Coluna Axé (veículo semanal que completa dois anos nesta quinta-feira, no jornal Tribuna Independente) vem contribuindo para a interlocução entre os segmentos afros e os meios de comunicação, além de promover a ampliação de pautas que abordem a cultura afro-brasileira e a conjuntura da população afro-descendente durante todo o ano.

Porém, atualmente, os nossos principais desafios são: a sensibilização dos profissionais sobre a temática, especialmente os que estão no dia a dia das redações; a avaliação crítica quanto à existência do racismo e assédio moral nos locais de trabalho; além da conscientização sobre as consequências das expressões preconceituosas nos veículos de comunicação.

Devemos por questão de ética e respeito evitar os termos racistas. Dentre os exemplos que são propagados podemos citar: ‘lista negra’, ‘línguas negras’, ‘a coisa tá preta’, ‘buraco negro’ (sem conotação científica), ‘páginas negras da história’, ‘samba do crioulo doido’ e vários outros.

De acordo com o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, é dever dos profissionais ‘combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza’ (Cap. 2 / Art. 6º / XIV) e ‘não podem usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime’ (Cap. 2 / Art. 7º / V).

Também gostaríamos de lembrá-los(las) que ‘praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional’ é crime previsto na Lei nº 9.459 de 13 de maio de 1997, tem pena de reclusão de um a três anos e multa; caso o crime seja ‘cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza’, a pena pode chegar a cinco anos de reclusão e mais multa.

Nós vivemos 122 anos de abolição inacabada e que traz consequências até hoje! Os estereótipos existem para ampliar o preconceito e desconstruir a sociedade. Os afro-descendentes (negros = pretos pardos) representam hoje mais da metade da população brasileira, ajudaram a formar a cultura deste país, além de contribuir decisivamente para o desenvolvimento sócio-político e econômico.

A COJIRA-AL luta por um jornalismo ético, que contribua para a transformação social e respeite a diversidade étnicorracial, de credos e de gênero! Seguimos em frente, e temos como espelhos os guerreiros quilombolas que enfrentaram seus medos e vários obstáculos em busca de liberdade.

Axé!

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