Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Imposto sobre Google e Facebook pode financiar jornalismo local

(Foto: Geralt/Pixabay)

O diretor e cofundador do respeitado Nieman Journalism Lab, Joshua Benton acaba de propor a criação de um imposto sobre os lucros de empresas como Google e Facebook como uma forma de redistribuir as fabulosas receitas das plataformas digitais [1]. Esta pode vir a ser uma eficiente forma de financiar jornalistas e jornais que atuam em pequenas e medias cidades, num primeiro passo para a adaptação do jornalismo ao ecossistema informativo digital.

A criação de impostos sobre o faturamento publicitário de Google e Facebook, que arrecadam por ano quantias trilionárias, funcionaria como alternativa para acordos entre as plataformas e grandes jornais, como ocorreu na Austrália e agora começa a ganhar seguidores em países como Canadá e Inglaterra.

A estratégia australiana atende apenas aos interesses de grandes conglomerados midiáticos como o comandado pelo bilionário ultraconservador Rupert Murdoch que controla quase 80% de toda a mídia de seu país e ainda grandes jornais na Inglaterra e Estados Unidos. Murdoch tem também forte influência sobre o governo da Australia que funcionou como uma espécie de preposto do grupo News Corporation, na hora de forçar as plataformas a pagarem pela publicação de notícias produzidas por veículos das empresas de Murdoch.

O acordo australiano se baseia numa lei federal aprovada em agosto de 2020 e foi assinado pelas plataformas em fevereiro de 2021. O entendimento foi encarado pela imprensa mundial como um enquadramento de Google e Facebook no complicado cenário informativo internacional. Funcionou também como um alívio temporário nas dificuldades financeiras dos grandes conglomerados midiáticos, outrora conhecidos como um “quarto poder”. O fato concreto é que a lei australiana preserva a aliança informal entre os barões da imprensa, como Murdoch, e as elites governantes.

Irrigando os “desertos informativos”

A taxação das plataformas permite a criação de um sistema, que sem inviabilizar o negócio do Google e do Facebook, poderia garantir uma transferência de renda para os profissionais do jornalismo e para os veículos de comunicação em pequenas e medias cidades, onde a crise no modelo tradicional de negócios da imprensa está provocando a formação de “desertos informativos”, regiões que ficaram sem jornais por conta da crise no setor.

Na sociedade da abundância informativa, o jornalismo local se transformou na porta de entrada das pessoas no processo de transformação das notícias em conhecimentos indispensáveis à sua sobrevivência financeira, cultura, social, emocional e profissional. Os institutos de monitoramento da opinião pública têm assinalado uma clara tendência do público a envolver-se mais com questões comunitárias locais do que com temas abstratos e complexos na economia, política e relações internacionais. Esta tendência contribuiu para um distanciamento crescente entre o público e os grandes jornais, que acabam dependendo cada vez mais da relação com as elites.

Este distanciamento é facilmente perceptível na agenda da grande imprensa brasileira onde há uma clara predominância dos assuntos vinculados à luta pelo poder entre diferentes segmentos de elite política e empresarial.

As plataformas, obviamente, se opõem ao princípio da taxação por meio de impostos, mas sua resistência será muito menor do que a previsível oposição da grande imprensa. Para os grandes jornais e redes de televisão, um acordo como o fechado na Austrália com as grandes plataformas funciona como uma tábua de salvação capaz de compensar a perda de poder econômico e de status político.

Caso a taxação venha a ser adotada, o grande desafio poderá ser a forma como será administrado o dinheiro arrecadado com o eventual pagamento de um imposto sobre lucros das plataformas digitais. Como o governo vai distribuir o dinheiro pago por empresas como Google e Facebook , fica a dúvida sobre como será possível reduzir a enorme carência de notícias locais nos quase 4.500 municípios brasileiros considerados “desertos informativos”, onde vivem cerca de 70 milhões de pessoas.

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Notas:

1- A versão original do artigo de Joshua Benton pode ser acessada aqui.