Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Link bait é fake news?

Espalhar notícias falsas na internet engloba duas possibilidades. A primeira delas — e mais provável — é agir com más intenções. Isto é, denegrir a imagem de algo ou alguém gratuitamente, sem motivos válidos. A segunda vai no embalo da primeira: total ignorância. Aquele que compartilha uma informação sem sequer desconfiar de sua procedência é tão criminoso quanto quem a produz.

Décadas atrás, quando os jornais impressos ainda apareciam como uma das principais fontes de informação, as receitas básicas atinavam a um triângulo relativamente equilibrado: exemplares vendidos, anúncios e classificados. Para tanto, os veículos precisavam de relevância. Logo, investiam em reportagens que chamassem a atenção do público. Certamente houve sensacionalismo em alguns casos, mas nada comparado ao que vemos na era da internet.

Sites e blogs, amparados pelas redes sociais, vivem do número de cliques e anunciantes (os classificados foram praticamente riscados da lista). A diferença é que hoje a competição é muito maior, o que gera um desespero não pela exclusividade necessariamente — pois reportagem é coisa rara — mas sim pela notícia mais chocante ou sensacionalista. Para alguns veículos, pouco importa se você vai ler o conteúdo. O Importante é clicar.

Tem sido bastante comum acessar páginas relativamente consagradas (O portal Terra é um ótimo exemplo disso) e encontrar links “recomendados” com notícias do gênero. O Taboola, a citar, é uma plataforma que espalha notícias “patrocinadas” — e chamativas — que ofuscam a visão do leitor em termos de conteúdo de qualidade. O teor da notícia na capa do veículo nunca justifica a manchete histriônica que a acompanha.

Desespero por views

No YouTube, a situação parece cada vez mais insuportável. Para ilustrar um vídeo no qual explanava mistérios da Antártida, certo youtuber colocou uma foto para lá de peculiar: uma construção supostamente alienígena encontrada em meio ao gelo. A “nave” era um típico design cinematográfico inserido numa foto de uma geleira por intermédio de um programa de edição. O vídeo, é claro, não detalhava o “achado”.

Uma descoberta assim mudaria toda a nossa compreensão sobre o universo, suponho. Estaria na capa dos principais veículos de imprensa. Nada disso. A intenção do vídeo não era essa. A intenção, como na maioria dos casos, era gerar cliques por intermédio de um conteúdo que não apresentava nenhuma prova consistente, apenas especulações conspiratórias. E sabe o que é mais incrível? A capa mentirosa funcionou. O vídeo conquistou mais de 100 mil visualizações.

Desconheço a política do YouTube sobre monetização, mas sei que a plataforma anda fiscalizando com mais eficiência os link baits de produtores de conteúdo ansiosos por views. Se eu comprasse um cachorro e me dessem um gato, eu ficaria chateado, correto? Pois é mais ou menos assim que funciona o link bait. Trata-se de um modus operandi questionável que aguça a curiosidade e depois decepciona o espectador.

Seria o link bait uma espécie de fake news? Guardadas as proporções, sim. Não visa, necessariamente, denegrir algo ou alguém, embora não raramente o faça, mas também gera desinformação. Atrai interesse por motivos escusos. Meu dedo indicador tem clicado bastante em vídeos como esses… Para denunciá-los. Se não agirmos assim, a informação será derrotada por mentiras e manipulações. E isso não é tolerável.

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Gabriel Bocorny Guidotti é escritor.