Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O jornalismo por Otavio Frias Filho

Em 1996, Otavio Frias Filho participou como entrevistado do programa “Roda Viva” da TV Cultura de São Paulo. O programa foi conduzido pelo jornalista Matinas Susuki e, entre os entrevistadores, estavam Alberto Dines, Ricardo Kotscho, Boris Kasoy, Marco Antonio de Resende, Daniela Thomas e Dante Matiusse. O período era de expansão da Folha de S.Paulo tanto em termos de tiragem quanto de importância editorial. Veja algumas frases de Otavio recolhidas no Memória Roda Viva.

Incompletude

“Nós, que trabalhamos com jornalismo, estamos sempre vivendo uma frustração diária, porque os jornais são feitos sob a égide da pressa. Há uma urgência muito grande, há uma premência muito grande, então, a quantidade de falhas, de incompletudes, de deficiências, é sempre muito grande. A gente vive numa permanente insatisfação com os resultados obtidos e este é um dos aspectos — para alguns estimulante e, para outros, muito frustrante — da profissão.”

Projeto editorial da Folha de S.Paulo

“Nós estabelecemos alguns pressupostos em termos de projeto editorial. A gente costuma dizer que está empenhado em praticar um jornalismo que seja crítico, apartidário e pluralista. Ou seja, um jornalismo que exerça uma faculdade de interpelar, de criticar, de questionar as formas de poder em geral. Um jornalismo que, ao mesmo tempo, não se perfile, em termos automáticos, com nenhum tipo de posição no aspecto político-partidário.

Redações

“Acho que uma redação, por mais que ela tenha toda uma interface industrial, e essa interface é cada vez maior, nos dias atuais, ela nunca deixa de ser uma espécie de atelier. Convém que você tenha numa redação pessoas com as formações as mais variadas: desenhistas, filósofos, historiadores, economistas. Eu acho que essas pessoas é que poderiam trazer um aporte de especialização, que permitisse aos jornais exercer esse espírito crítico de uma forma responsável, se você quiser, e por outro lado permitiriam também aos jornais destrinchar esse mundo de tecnicalidades de forma a torná-lo traduzível, apreensível por parte do leitor”.

Perfeccionismo

“Então, para mim, a leitura de qualquer jornal é quase desagradável, por esse lado, assim, de perfeccionismo. E da Folha então é muito desagradável muitas vezes, porque eu assumo como minha toda e qualquer falha que eu puder detectar [gesticulando], todo problema que eu vir. Uma das seções, por exemplo, que eu me recuso, terminantemente, a ler antes dela ser publicada, é a seção ‘Erramos’. Porque eu não quero me aborrecer de véspera. Então eu só leio as retificações que a Folha publica todos os dias na página três. O ‘Erramos’ eu só leio com o jornal impresso, já no dia seguinte. Porque, realmente, tem este aspecto doloroso. É muita responsabilidade.

Escolas de jornalismo

“Eu acho que as escolas de comunicação deviam ter um compromisso de fazer com que o aluno saísse conhecendo e dominando perfeitamente o português, o inglês e história geral. O restante, ao meu ver [leva a mão esquerda ao peito], deveria ser ocupado, em termos de formação universitária, por créditos que o aluno realizasse em outros cursos, a critério de sua própria escolha. Quer dizer, haverá um aluno de comunicações que terá maior inclinação por medicina e nada impediria que ele fizesse a maior parte de seus créditos numa faculdade de medicina da mesma universidade. E outro que tenha interesse por arqueologia, que também será útil na profissão de jornalista. Então, que ele faça a maior parte de seus créditos na faculdade de história ou na faculdade de filologia, ou o que seja, e a faculdade de jornalismo deveria, a meu ver, estar concentrada no ensino das técnicas de jornalismo, que é um ensino bastante elementar, porque o jornalismo, como a gente sabe, não é um saber, não é uma ciência, é meramente uma técnica. E deviam ter esse compromisso, de que, pelo menos, cada aluno saísse de uma escola de comunicações conhecendo bem o português, o inglês, porque é a língua franca, é a língua universal, e história geral, porque a história é a base de tudo, a meu ver.”