Wednesday, 09 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Um incansável defensor das causas cívicas

A história do advogado e jornalista Dario de Almeida Magalhães confunde-se com a do Brasil no último século. Um dos três autores e 92 signatários do Manifesto dos Mineiros – corajoso documento público, de 1943, contra a ditadura do Estado Novo e em defesa da redemocratização do país – ele foi diretor do jornal Estado de Minas e dos Diários Associados, deputado constituinte em 1934 e, mais tarde, advogando em seu escritório, onde bateu ponto até os 95 anos, ficou conhecido por defender causas cívicas.

– Uma das últimas coisas que ele fez foi pedir ao então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, que não se candidatasse à presidência, para não colocar em risco o êxito do Plano Real. Muito atencioso, Fernando Henrique respondeu-lhe que precisava candidatar-se justamente para garantir esse êxito – relembra seu filho, Raphael de Almeida Magalhães, ex-governador do estado da Guanabara, ex-deputado federal e ex-ministro da Previdência de José Sarney.

– Até onde sei, ele era o último signatário do manifesto ainda vivo. O penúltimo foi Lair Tostes, que morreu há cerca de oito meses.

Assinando com Dario o documento estavam nomes como os de Pedro Aleixo, Milton Campos, Artur Bernardes, Afonso Arinos de Melo Franco, Afonso Pena Jr., Bilac Pinto, José de Magalhães Pinto, Mário Brant e Odilon Braga. Todos sofreram sanções econômicas. Magalhães Pinto, Afonso Arinos e Afonso Pena, funcionários públicos, perderam seus empregos, que só puderam ser recuperados em 1946.

Perseguido pela polícia política do então presidente Getúlio Vargas, Dario chegou a ser preso em 1944, juntamente com Austregésilo de Athayde e os advogados Adauto Lúcio Cardoso e Virgílio de Mello Franco – que também assinaram o manifesto – no quartel da Polícia Militar da Rua Frei Caneca. Na ocasião, todos os advogados do Rio requereram habeas corpus para o grupo. Foram milhares de assinaturas.

Ganho de causa

Dario ficou preso por uma semana. Mineiro de Belo Horizonte, Dario apoiou a Revolução de 1930 e veio para o Rio em 32, assumir os Diários Associados, quando Assis Chateaubriand foi exilado. Lá, foi o primeiro chefe de Millôr Fernandes, na época seu contínuo.

Tornou-se deputado constituinte pelo Partido Republicano Mineiro (PRM) em 1934, permanecendo no Congresso até seu fechamento, em 1937. Ficou no PRM até 1941, quando rompeu com Chateaubriand e voltou a advogar. Foi fundador do Partido Republicano (PR), pelo qual se candidatou a deputado federal em 1946, sem se eleger. Depois, secretário-geral do PR, foi indicado para o Ministério da Educação do então presidente Eurico Gaspar Dutra. No entanto, teve seu nome vetado, depois que Chateaubriand fez publicar, na primeira página de um de seus jornais, que era possível afirmar que ele não seria ministro. Nunca mais se candidatou.

Dario também protagonizou uma espetaculosa briga com Chateaubriand, que, bem ao seu estilo, depois do rompimento entre os dois, fez publicar durante anos, na primeira página de um dos seus jornais, um anúncio na época de Natal dando o endereço do ex-amigo para uma suposta distribuição de presentes – o que levava milhares de pessoas à porta da casa do advogado, causando grandes transtornos.

No início da década de 50, começou a estreitar relações com Carlos Lacerda, que na época escrevia a coluna Tribuna da Imprensa no Correio da Manhã. Foi Dario quem formulou o estatuto do jornal de Lacerda, que ganhou o nome da antiga coluna. Segundo Raphael, num discurso, o ex-governador da Guanabara chegou a dizer que tinha a honra de ter Dario como companheiro, porque na verdade ele deveria estar em seu lugar.

– Papai constituiu um conselho consultivo composto por Sobral Pinto, Alceu Amoroso Lima, Gustavo Corção e Adauto, além dele mesmo – conta Raphael. – Ele defendeu a Tribuna quando o jornal sofreu censura do estado.

Também foi advogado de Nelson Rodrigues quando seu livro O casamento foi apreendido por ordem do então ministro da Justiça de Castello Branco, ganhando a causa em plena vigência do Ato Institucional número 2. E foi muito amigo do pai do ex-presidente Fernando Collor de Mello, tendo tentado defender seu mandato na ocasião do impeachment.

Dois filhos, seis netos

Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) desde 1938, Dario de Almeida Magalhães assumiu diversos mandatos alternados até 1958. Famoso por suas petições – consideradas incomparáveis, elas tinham estilo peculiar por serem muito calorosas, sempre escritas com paixão – Dario ajudou a formar uma série de profissionais. Teve em seu escritório nomes como os do advogado Sérgio Bermudes, do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence e do ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Cláudio Lacombe.

Dario também foi membro do Instituto dos Advogados Brasileiros e auxiliar do advogado-geral de Minas Gerais, além de presidente do Banco do Estado da Guanabara e do Banerj. Ele morreu na segunda-feira [12/3], aos 99 anos. Já havia sofrido um derrame há cerca de três anos e meio e, em meados de outubro do ano passado, teve um enfarte. Viúvo de Elza Hermeto de Almeida Magalhães – com quem teve os filhos Raphael e Thereza – desde 1976, casou-se novamente com Maria Imelde Pessoa Farah. Deixa seis netos.