Naquilo que foi considerado inédito para a televisão estatal egípcia, uma mulher apresentou um noticiário no domingo (9/9) com um véu cobrindo a cabeça, quebrando um código de trajes seculares que, há décadas, impede o uso de vestes islâmicas. Fatma Nabil, a âncora do programa, vestindo um casaco escuro e um hijab claro que lhe cobria o cabelo e o pescoço, apresentou as manchetes do noticiário de meio-dia do Canal 1, uma das várias emissoras estatais.
A grande maioria das mulheres egípcias usa algum tipo de véu islâmico. No domingo à noite, entretanto, ocorreu um debate online sobre os trajes de Fatma poderiam representar um avanço num esforço, pelo presidente Mohamed Morsi – ex-líder da Irmandade Muçulmana –, para incentivar uma maior sensibilidade islâmica nos noticiários e na sociedade.
Mulheres com véu vêm apresentando os noticiários há anos nas televisões por satélite privadas, inclusive Fatma, que antes trabalhava para a estação por satélite Misr 25, da Irmandade. Sua presença no Canal 1 foi anunciada no sábado (8/9) pelo recém-nomeado ministro da Informação, Salah Abdel-Maqsoud, membro da Irmandade Muçulmana, que disse a um repórter que o uso do hijab por Fatma representaria a “aplicação do princípio da justiça no campo da mídia” no espírito da revolução egípcia, segundo a agência de notícias oficial, Mena.
Segundo Abdel-Maqsoud, três outras mulheres irão usar o véu na televisão estatal, inclusive a apresentadora da previsão do tempo, o que representa uma mudança dos padrões adotados desde a fundação da televisão estatal, há 50 anos. Embora não fossem explicitamente proibidos, na prática os véus eram tolerados somente para empregadas que não aparecessem na tela. “Por que o uso do véu é denunciado no Egito se 70% das mulheres egípcias o usam?”, perguntou Abdel-Maqsoud, segundo o jornal Al Masry Al Youm. “É uma vergonha que mulheres com véu apareçam nos canais árabes e internacionais, e não no Egito.”
Sob os regimes autoritários seculares que precederam Morsi, a televisão estatal funcionava como porta-voz do governo. Até recentemente, os veículos de mídia estatal pareciam estar em campanha contra Morsi, com uma cobertura amplamente favorável aos líderes militares que por influência com o presidente islâmico. Em uma manobra que consolidou seu poder, no mês passado Morsi obrigou os líderes militares a se aposentarem e cancelou uma declaração, pelos militares, que retirava da presidência grande parte de seu poder. Informações de Scott Sayare [New York Times, 4/9/12].