Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O repórter que mudou a cobertura da Suprema Corte

Morreu na semana passada (25/3), aos 85 anos, de complicações de insuficiência renal e cardíaca, o jornalista aposentado Anthony Lewis, ex-repórter e colunista do New York Times que ajudou a transformar a cobertura do sistema judiciário americano. Nascido em Manhattan, Lewis entrou para o Times em 1948 e passou quase toda sua carreira no diário, onde cobriu a Suprema Corte, trabalhou como chefe da sucursal de Londres e, por mais de 30 anos, assinou uma coluna na página de opinião do jornal. Ganhador de dois Pulitzer, o jornalista se aposentou em 2001.

Aos 28 anos, em 1955, ganhou seu primeiro Pulitzer, no tabloide vespertino The Washington Daily News, por uma série de artigos sobre um membro da Marinha injustamente acusado de ser um risco de segurança. Naquele mesmo ano, voltou para o Times, contratado pelo chefe da sucursal de Washignton, para cobrir o Departamento de Justiça e a Suprema Corte. Em 1956, o repórter foi enviado à Escola de Direito de Harvard com uma bolsa da Fundação Nieman para estudar Direito “com ênfase na Suprema Corte”.

Especialista

Lewis era conhecido pela defesa apaixonada de dois temas: a justiça e o papel da imprensa na democracia. Foi pela cobertura da Suprema Corte que ele ganhou o segundo Pulitzer, em 1963. O jornalista também escreveu diversos livros, dois deles sobre decisões importantes do juiz Earl Warren, que comandou a Suprema Corte de 1953 a 1969.

“Ele trouxe contexto à lei”, diz Ronald K. L. Collins, professor da Universidade de Washington que compilou a bibliografia do trabalho de Lewis. “Ele tinha um talento incrível para fazer do Direito não apenas algo compreensível, mas também atraente”.

Antes de Lewis começar a cobrir a Suprema Corte, as notas na imprensa sobre as decisões do tribunal eram registros apáticos feitos por jornalistas com nenhum ou pouco conhecimento jurídico, e raramente questionavam os motivos das decisões ou examinavam seu contexto ou consequências. O conhecimento de Lewis sobre o trabalho da Corte mudou isso: seus artigos eram claros e abordavam as mais diferentes questões, tornando temas complexos acessíveis ao público.

“Há um tipo de lucidez e retidão na prosa dele”, afirma Joseph Lelyveld, ex-editor-executivo do Times. “Você aprendia um monte de coisas sobre Direito apenas lendo os relatos de Tony Lewis”.

Sem privilégios

Ao longo dos anos, Lewis acabou se desentendendo com amigos e colegas jornalistas por conta de seus pontos de vista sobre a Primeira Emenda da Constituição dos EUA. Ele questionava o tamanho da liberdade que a Primeira Emenda dava à imprensa para proteger fontes anônimas. Lewis não achava, por exemplo, que ela deveria permitir que jornalistas resistam a intimações por causa de suas fontes confidenciais. Também não acreditava que a cláusula sobre a liberdade de imprensa dá às organizações de notícias estabelecidas status especial diante da lei.

“É um grande erro da imprensa colocar a si mesma em uma posição privilegiada”, afirmou Lewis em uma entrevista concedida em Harvard em 2006. Segundo ele, a referência à “imprensa” na Primeira Emenda – que diz que o Congresso não pode limitar a liberdade de imprensa – dizia respeito aos produtos impressos; palavras escritas e não palavras faladas. Assim, defendia, ela não determina que os jornalistas tenham direito absoluto a proteger suas fontes. Em 2005, Lewis escreveu na New York Review of Books que a Primeira Emenda é, fundamentalmente, uma proibição da censura do governo. Pedir que faça mais do que isso “não se encaixa em seu principal propósito”.