Wednesday, 24 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Como jornalistas devem cobrir casos de estupro

Recentemente, o mundo acompanhou a história das americanas Amanda Berry, Michelle Knight e Gina DeJesus, libertadas em Cleveland após terem sido sequestradas pelo mesmo homem, há cerca de 10 anos, quando eram adolescentes. Todas são sobreviventes de uma vida roubada e de uma investigação policial fracassada. Segundo investigadores, elas sofreram abuso sexual repetidamente durante o tempo em que ficaram sequestradas – junto com Amanda Berry estava sua filha, de seis anos, nascida em cativeiro.

Ao contrário da maior parte das vítimas sexuais, Amanda, Gina e Michelle são o oposto do anonimato na mídia. Os seus nomes são parte central e, na medida em que novos detalhes do caso vêm à tona – por meio de acusações formais, documentos investigativos, entrevistas e vazamentos –, jornalistas devem decidir que nível de privacidade deve ser concedido às sobreviventes.

Segundo artigo do Instituto Poynter, uma das dicas para se cobrir o caso de maneira conveniente e equilibrada é usar linguagem clara quando tratar do estupro. Jornalistas geralmente têm o hábito de tornar as vítimas atores do ato, como modo de descrever a situação de maneira mais suave. Por exemplo, escreve-se que uma jovem “fez sexo oral”, em vez de “ele colocou à força a genitália na sua boca”. As palavras e a estrutura das frases fazem diferença em matérias sobre estupros.

Além disso, deve-se descrever as acusações de relações sexuais sem consentimento como estupro – nada menos do que isso. Nenhuma pessoa racional iria sugerir que essas mulheres foram cúmplices da situação, mas alguns repórteres minimizam o trauma do estupro ao descrevê-lo como “sexo” ou “relação sexual” se não envolver violência física que requer atenção médica.

É importante ficar atento a detalhes que possam implicar que se está responsabilizando as vítimas pelo que sofreram. Descrever o que uma jovem estava vestindo (como uma saia curta ou decote) ou como ela fez determinada escolha pode ser visto como culpá-la. Deve-se evitar, ainda, fornecer detalhes lascivos ou gratuitos sobre agressões sexuais. Algumas vítimas de estupro dizem que se sentem “revitimizadas” quando jornalistas descrevem partes de seus corpos nas matérias.

Divulgação dos nomes

Quando as vítimas de agressão sexual não são identificadas, a intenção é poupá-las da vergonha de estarem associadas ao crime de estupro. Mas, em alguns casos, não é possível não divulgar os nomes das vítimas, especialmente quando esta identificação é central ao caso.

Histórias como a de Cleveland têm o poder de mudar o entendimento comum do estupro. Quando o estupro é acompanhado de outros crimes, como sequestro, parece que há menos discussão sobre a culpabilidade da vítima. Os nomes de Amanda Berry, Michelle Knight e Gina DeJesus foram divulgados pela mídia e, na maior parte das vezes, as pessoas nem imaginam o motivo. Devido à magnitude da provação pela qual passaram, elas não serão sujeitas ao questionamento e à dúvida pelas quais muitas vítimas passam. Ao longo do tempo, talvez suas histórias ajudem a ampliar o conhecimento de sofrimento a outras vítimas que têm uma experiência completamente diferente.

O Poynter oferece gratuitamente em seu site um curso sobre como jornalistas devem cobrir casos de violência sexual.