Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A mídia deixou o palco

 

José Sergio Rocha (*)

Abra a Veja despreocupado. Esqueça que você tem opiniões diferentes, esqueça que a cobertura da marcha em Brasília teve como principal personagem o celular do Lula, os impropérios contra Brizola e a corrente de opinião que representa.

Esqueça as exaltações ao caçador de marajás e a entrevista do irmão caçula que o detonou. Faça como FHC e esqueça tudo o que foi escrito em Veja. Não pare nem para ler o textinho sobre dom Hélder Câmara, no qual somos “informados” de que o estado de Pernambuco é habitado por gente tão atrasada que ainda pensa um mundo dividido entre esquerda e direita.

Apenas abra a revista e vá diretamente à matéria principal da edição de 8 de setembro, “A idade verdadeira”. Veja sabe que todos gostamos de fazer testes para saber se estamos mais magros, mais gordos, mais felizes, mais inteligentes etc. Com certeza, o livro do médico americano Michael Roizen, no qual se baseou a matéria, venderá como banana da terra em nossa república idem, depois da força que Veja lhe deu.

Até aí, tudo bem. Se fosse nos anos 40 ou 50, veríamos em O Cruzeiro mais uma fotomontagem de discos voadores ou o último plano comunista para sufocar as liberdades no Brasil. Mas estamos nos estertores dos 90 e a agenda de preocupações do fim do milênio reserva lugar de honra à busca da eterna juventude. Continue lendo e se divertindo. Êpa! O que a Sandy e o Júnior fazem no meio disso aí? Que importância tem, para os que buscam o rejuvenescimento, se a idade física ou mental dos meninos cantores de Goiás é pouco maior ou menor do que as que constam das respectivas certidões de batismo?

Eu estava assim, como você, lendo a revista sem preconceito, até bater o olho no mais marrom de seus parágrafos, que diz textualmente: “Se assim fosse, o governador Itamar Franco poderia rejuvenescer a tal ponto que sua idade física finalmente se equipararia à sua idade mental.”

Reli a frase, o parágrafo inteiro. Não tive mais dúvidas de que o objetivo da revista, do editor e da autora da matéria foi mesmo ofender – gratuitamente! – o ex-presidente da República. Li muito O Cruzeiro. Não sei por que um texto sobre rejuvenescimento me fez lembrar das campanhas dos Diários Associados contra o governo Goulart.

Veja já entrou em campanha eleitoral. Será que deixou de fazer em algum momento? Imagine se Veja existisse há mais tempo? Que revista brasileira daria mais destaque ao Plano Cohen, à Carta Brandi, aos conluios subterrâneos para instalar os comunistas no poder e a outros documentos enganosos, medíocres e falsificados que ajudaram a mergulhar o país no Estado Novo de 1937 e na ditadura militar de 1964?

Veja devia se submeter ao teste do doutor Roizen. Pena que alguns leitores chatos se sintam ludibriados com o recheio excessivo do pensamento político da autora, de seu editor e do patrão de ambos num assunto que devia ter leveza e boas intenções, em vez da gordura rançosa e saturada do ressentimento. Passaram do ponto mais uma vez. Deve ser por isso que Veja, apesar dos 32 anos de idade física, exibe um corpinho de 72.

(*) Jornalista

 

 

M. C.

Recebemos um release anunciando que em outubro chega às bancas uma nova revista: Focinhos, a cara dos bichos.

A publicação vai mostrar o “estilo de vida” dos animais de estimação dos… ricos e famosos. “Cães, gatos, aves, peixinhos, tartarugas, cavalos, iguanas e tantos outros que, diante das lentes dos fotógrafos da revista, revelarão todo o glamour que existe no universo dos bichos de estimação”, diz o release.

Que continua: “O charme da Focinhos está em buscar sempre animais de donos famosos. Vários atores, atrizes e apresentadores de TV, astros da música, personalidades do mundo dos negócios e socialites já posaram ao lado de seus bichinhos para as páginas da nova revista.” Acompanham instruções para cuidado dos animais – tudo em papel couché, formato 20,8cm x 27,4cm, 64 páginas, 4 cores. Publicação da Fractal Edições.

Gostaram?

 

 

Fabrício Francis (*)

Indiscutivelmente, ser pobre no domingo é cada vez mais difícil. Os programas humorísticos são uma ofensa à maioria dos brasileiros. O humor funciona em piadas envolvendo pessoas de poder aquisitivo baixo.

Miguel Falabela, em Sai de baixo, no papel de Caco Antibes, ironiza os pobres com piadas engraçadas para uma minoria… os ricos. Brinca com o dia-a-dia do pobre sem o menor respeito. Ironiza o cotidiano dos explorados. Assim como existe uma lei que previne o racismo, deveria existir também uma lei que defenda essa classe. Vivemos num país em que os pobres estão ficando mais pobres e os ricos mais ricos. As leis não dão conta de tantas injustiças.

A TV é um simulacro da realidade, a ilusão do real. Mostra a perfeição, como o corpo belo, as roupas mais bonitas, o carro do ano. Aos pobres, só resta a revolta com a própria situação. E o que é pior, ouvindo piadas. Pobre é boneco nas mãos dessa classe que domina a economia brasileira.

E a TV é seu porta-voz.

(*) Estudante de Jornalismo do Centro Universitário do Triângulo Mineiro