Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A (péssima) viagem do economista

TERROR & ANTIGLOBALIZAÇÃO

Sinclair Maia (*)

Dia desses lia o Estado de S. Paulo e deparei-me com um artigo assinado por Gustavo Franco, intitulado "Terror e (anti) globalização". Frente ao título e aos fatos, ou ao fato, parecia não ser mais um daqueles textos de economia que eu tanto detesto, cheios de truísmos incompreensíveis, dados longínquos e palavras complicadas.

O interesse está nos três últimos parágrafos do artigo de Franco, onde ele abandona a pseudoneutralidade, ancorada na mera descrição de fatos, e dobra "à direita". É necessário lê-los.


Há certamente uma linha divisória entre o que faz parte da paisagem da Democracia e o que é assunto de polícia. Mas não há nada de claro com esta linha, e a notável ascensão do ?politicamente correto? tornou as coisas ainda menos claras. Cresceu muito a movimentação e a petulância de ONGs e movimentos ?antiglobalização?, e tem havido uma grande dose de condescendência com relação à violência por parte desses agentes. A baderna de Seattle chegou a ser saudada como ?vitória das ruas?. A depredação de uma lanchonete McDonald?s, ou de uma plantação de soja transgênica, ou uma invasão de uma fazenda, parecem coisas normais, quando não deveriam ser. O fato de o dano ser apenas material não diminui sua ilegalidade e sua violência. E dessas pequenas violências facilmente nasce uma grande.

Há um problema de causa e efeito, é claro. Será o terrorismo apenas um produto mais radical do caldo de cultura antiglobalização? Um protesto da parte dos ?excluídos? apenas equivocado quanto aos métodos de luta? Ou uma barbaridade perpetrada por um grupo de lunáticos?

Independentemente do que faça o presidente Bush, o atentado deve nos proporcionar uma reflexão sobre os limites da ação política, e sobre esta estranha ?liberdade para depredar? de que desfrutam os movimentos antiglobalização.


Não me admira nem indigna Gustavo Fraco dobrar à direita ? é seu direito. Mas a analogia que ele faz entre a Terça Negra ? como Alberto Dines a batizou ? e os movimentos antiglobalização é absurda. É o mesmo que dizer que comunista come criancinha. Se ele quer atingir a esquerda que o faça de uma forma política, não vil e oportunista.

Tenho acompanhado (não constantemente) o trabalho do Observatório e sei que é preocupado com o que dizem por aí em microfones, colunas, noticiários etc. A crítica da imprensa, não sei, talvez seja a mais importante. Mas não é só isso. Escarafunchando o Jornal do Brasil, encontrei "A culpa é das vítimas", de Dines e, pasmem, o décimo segundo parágrafo parecia ser feito sob medida, sem tirar nem pôr. Vamos a ele:


Nas avaliações ora em curso está sendo esquecido um dado elementar: os atentados não foram acompanhados de manifestos, ultimatos, condições ou exigências. A ausência de proclamações ou autoria indica uma guerra indiscriminada contra todos, contra a humanidade. Os mandantes do crime não são de esquerda, sequer progressistas. Também não são agentes do capitalismo selvagem, ou revolucionários, reformistas, ecologistas, terceiromundistas ou antiglobalização. Não querem um Estado forte ou mínimo. Não querem Estados, leis, códigos, normas de convivência ou respeito. Além de matar indiscriminadamente estão empenhados em semear ódios, acender fogueiras, exacerbar suspeitas, inflamar vinganças, cercear qualquer possibilidade de entendimento, aproximação ou tolerância.


Não compreendo as mentes conservadoras e não cogito como Gustavo Franco foi capaz de tal blasfêmia. Tamanho disparate não é digno de jornal tão importante como o Estado, apesar de ser um artigo de opinião. Dentre muitas questões importantes que necessitam estudo, avaliação e providências na imprensa brasileira, ficou exposta a do conhecimento especializado. Franco, ao que me parece, é um economista. Saiu de sua especialidade e viajou na maionese.

O jornalismo talvez seja a única profissão na qual não há exclusividade. Qualquer um que escreva relativamente bem pode se meter a formador de opinião. E não é só. Quem tem boa dicção, desenvoltura e um rostinho razoável pode se arriscar na TV. Não tem faltado gente assim, e, para nossa infelicidade, são na maioria repórteres. Todavia não se vê alguém construindo prédios só porque era prodígio nos bloquinhos de montar quando criança. Até que ponto elementos importantes do jornalismo, como a ética, dizem respeito tanto aos aventureiros como aos de conhecimento especializado?

(*) Estudante de Jornalismo em Teresina

    
    
                     

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