Sunday, 05 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

A TV e os direitos humanos

DOMINGO ILEGAL

Luiz Sérgio Henriques (*)

Não vi o programa do Gugu Liberato. Espero que o debate em torno da ética nos meios de comunicação seja amplo e que se faça justiça, embora não tenha claro se basta a multa, se convém suspender o programa etc. Até aí disse generalidades, mas quero aproveitar este momento para também dizer algo a respeito do tema dos direitos humanos.

Uma experiência comum, cotidiana, que qualquer um de nós já deve ter feito muitas vezes, é levantar o tema dos direitos humanos em circunstâncias banais da vida: pegando um táxi, comprando algo numa mercearia, conversando com alguém numa fila. Já fiz isso várias vezes, como uma espécie de sondagem empírica, pessoal, destituída de qualquer pretensão “científica”, e o resultado foi desolador. A expressão “direitos humanos” levanta ódio, sarcasmo, intensa oposição, e esse tipo de reação tornou-se como que um senso comum em pessoas das mais variadas posições sociais e profissionais. 

A pergunta que fica é em que medida conhecidos programas policiais, guiados por repórteres que exploram, de modo quase sempre oportunista, o caráter extremamente violento que hoje marca as nossas grandes cidades ? a pergunta, repito, é sobre a responsabilidade que esse tipo de mídia detém na difusão dolosa, deliberada, de uma percepção equivocada dos direitos humanos entre nós. Raramente este padrão oportunista e, por vezes, abertamente debochado é rompido.

(Aliás, no caso de Chan Kim Chang, cidadão brasileiro de origem chinesa, barbaramente trucidado no Rio de Janeiro, houve uma cobertura isenta e precisa, com a justa dose de indignação, por parte da maioria da imprensa, o que contribui, sem dúvida, para uma visão racional dos direitos humanos como a mais adequada proteção para todos num Estado democrático.) 

Pergunto, ainda, se não valeria a pena acompanhar mais de perto aqueles programas sensacionalistas ? uma missão para o Congresso, as comissões de direitos humanos das Assembléias Legislativas, o Ministério Público, as instâncias de auto-regulação da profissão, a OAB, as diferentes ONGs etc. ?, punindo os casos, não raros, de incitação contra os direitos, de violação da legalidade, de exploração sensacionalista e abusiva das situações cotidianas de violência.

Creio que o episódio do programa do SBT, tal como leio em várias descrições, seja apenas a ponta de um problema muito mais vasto e que não podemos mais ignorar. 

(*) Editor do sítio Gramsci e o Brasil <http://www.gramsci.org/>