Thursday, 03 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Elena Corrêa

REALITY SHOWS

"A invasão de bichos nojentos na telinha", copyright O Globo, 28/04/02

"Há anos os Titãs já cantam: ?Bichos escrotos venham enfeitar, meu lar…?. Hoje, a presença de animais, digamos, pouco atraentes em provas de programas na TV virou rotina. No ?Hipertensão? tem acontecido todos os domingos. Na estréia, os participantes tiveram que degustar um drinque com seis minhocas, quatro tenebras e uma barata. Na semana passada, o desafio era ficar amarrado numa cova com 300 ratos passeando pelo corpo. Se para alguns telespectadores assistir a provas deste tipo pode parecer um prato indigesto – embora isso não afaste a maioria da frente da televisão – produzir o quadro não chega a exigir estômago de ferro.

– O nosso ponto de vista é impregnado de raciocínio. A prova não tem esse efeito que tem para os outros. Fazemos de uma forma que cai no bizarro, dá nojo, mas sempre sem apelo. Nós preparamos, testamos e quando vamos gravar já estamos acostumados – afirma Carlos Magalhães. – Embora às vezes dê um friozinho no estômago…

No ?Hipertensão? de hoje, os seis participantes terão que, literalmente, comer poeira. A primeira prova consiste em cada um ficar amarrado a um cavalo por uma corda e ser arrastado pelo animal por um percurso de 50 metros.

A segunda, para não perder o costume, será naquele estilo: controle seu medo… E o nojo! Aqueles que tiverem passado pela prova do cavalo terão que ter muito equilíbrio emocional para mergulhar num tanque cheio de cobras e tentar pegar frutas que estarão depositadas no fundo. Mas, não há répteis venenosos lá dentro, não é?

– São cobras normais (risos) – diverte-se o diretor.

E não é só a coragem de anônimos que será posta à prova em ?Hipertensão?. A última edição, que vai ao ar dia 12 de maio, contará com um grupo de celebridades.

– Estamos trabalhando para reunir seis pessoas, alguns artistas do elenco da casa, esportistas e cantores – adianta o diretor-geral do programa, Carlos Magalhães, acrescentando que a idéia ainda depende da aprovação da direção da emissora.

Segundo Magalhães, o especial terá o mesmo formato: três provas, duração de 45 minutos e prêmio de R$ 50 mil, que deverá ser doado a uma instituição.

Resta saber se as celebridades convidadas terão sangue frio para encarar cobras e lagartos…"

 

"Vai ser arte ou marketing?", copyright Folha de S. Paulo, 22/04/02

"Prepare-se , o inverno vem aí. Aturdidas pela derrocada de gêneros musicais populares nas lojas de discos e nos programas de auditório, gravadoras e emissoras de TV unem forças e fragilidades para forjar um novo modelo de sucesso, do qual dependem dramaticamente para restaurar a saúde de seus lucros.

Se já vinha causando incômodo a nova fábrica instantânea de ?reality músicos?, que vem revelando gente até aqui inexpressiva (se não inexistente), tipo Patrícia Coelho, Mário Velloso, Lulo, André ?Big Brother? (!), Mariana Kupfer (!!), a coisa agora pode tender ao espasmo, se se intensificar em ?Fama? e ?Popstars?.

No projeto global, há a propaganda de que os participantes tomarão aulas sérias de música e a promessa de revelação de novos e reais talentos (a presença no elenco de Andrea Marquee, de carreira intensa no underground paulistano, pode ser pista a favor). Mas a lista de ?jurados? escalados reduz a expectativa a quase zero.

Guto Graça Mello, por exemplo, é produtor da antiquíssima, que hoje orienta bethânias e robertos e há muito deixou de primar pelo faro de descobridor de talentos. Ivo Meirelles é bom músico ligado à Mangueira e ao grupo black Funk?n?Lata, mas seu último sucesso foi a inominável ?Boquete?. Hélio Costa Manso, executivo da Som Livre (pela qual inventou Lulo), usou nos anos 70 o pseudônimo Steve McLean, sob o qual cantava hits melosos de novela, como se fosse um ídolo romântico internacional. Ou seja: mercado, mercado e mais mercado.

Já o elenco de jurados montado pelo SBT é híbrido e ambíguo, variando de Liminha (ex-Mutantes, produtor número um do rock nacional dos 80 e hoje diretor artístico meio perdido da Sony) a Rick Bonadio (propulsor de efemeridades mercadológicas como Mamonas Assassinas) e, santa paciência, uma tal ?cantora de publicidade? chamada Iara Negrete. Tudo isso para descobrir, ai, ai, ai, as novas e tupiniquins Spice Girls, quando nem as originais conseguem convencer mais ninguém.

O momento é de um imenso ponto de interrogação, pois. Há forças por vezes contrárias agindo nos dois projetos, mas acima delas todas uma sede voraz de encontrar a nova onda musical, dane-se se com ou sem qualidade artística. Nosso futuro próximo está, de novo, nas mãos deles."