Tuesday, 15 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1309

Guarda Belo e a chicana pelo ibope

RECORD & REDE TV!

Claudio Julio Tognolli (*)

Desde a semana retrasada, o toma- lá-dá-cá da briga pelo Ibope gerou, como diria Simone de Beauvoir, um "clima de opinião" entre as emissoras Rede Record e Rede TV! Tudo começou com a ida de José Luiz Datena para a última emissora, onde estreou em 7 de maio passado. Datena Repórter Cidadão, noticiário que foi ao ar das 18h às 19h31, alcançou média de 7 pontos ? 3 a mais do que a emissora costuma atingir no horário. Mas o programa não conseguiu vencer sua ex-atração, o Cidade Alerta, da Record, agora comandado por Ney Gonçalves Dias, que registrou 8 pontos de média de audiência, das 17h40 às 19h24, no dia da estréia de Datena.

A ida incontinenti de Datena para a Rede TV! e uma suposta negativa de João Kleber a um suposto convite da Rede Record criaram esse clima de opinião. Na semana retrasada, por exemplo, este observador recebeu um telefonema arfante de uma produtora do programa da apresentadora Claudete Troiano, na Rede Record. Dizia ela: "Você tem de vir aqui falar da fraude que o João Kleber põe no ar!". "Que fraude?", pergunto. Ela dispara: "Temos informações de que ele teria contratado uma agência de modelos para montar as suas reportagens com câmera oculta, e pagaria para cada encenador uma diária de 140 reais". Ao ouvir a negativa ao convite, a produtora volta à carga: "Você teria os nomes de outros jornalistas que possam vir aqui meter o pau no João Kléber?" Sem dúvida, desculpem o pleonasmo, Claudete Troiano vinha montando um presente de grego aos convidados: a ordem, vulgo pré-pauta, era meter a boca no João Kléber.

O apresentador João Kléber, por sua vez, enviou um comunicado oficial à imprensa em 23 de maio passado para rebater as acusações do programa Note e Anote, da Record, segundo o qual ele teria enganado o telespectador ao exibir uma história falsa em seu programa Canal Aberto, na Rede TV!.

A íntegra do comunicado:


"O programa Note e Anote da TV Record, nesta quarta-feira, exibiu matéria com intuito de macular a credibilidade do programa Canal Aberto, da RedeTV!. Trata-se de um engodo, visto que, diariamente, a TV Record vem perdendo seus preciosos e mínimos pontos no ibope. Tanto que, na tarde de hoje, conseguiu, com uso indevido da imagem da concorrente, atingir o pico de 11 pontos no ibope.

Alguns veículos de comunicação, atualmente, utilizam todas as armas possíveis para atingir seu maior objetivo: o ibope. É público e notório que o programa Canal Aberto é mais um sucesso. Exibido diariamente, ao vivo, seus principais objetivos são denunciar desmandos e prestar serviços aos necessitados deste País. Mas o programa também é passível de ser ludibriado, visto que, pessoas inescrupulosas podem utilizar seu espaço na mídia, sem que se tenha condição de perceber.

O Sr. Osnei Medes da Costa procurou nossa produção para pedir ajuda. Segundo ele, estaria sendo agredido pelo filho. É importante frisar que, tanto ele quanto o filho, assinaram termos de responsabilidade, atestando a veracidade de suas alegações. É de conhecimento de todos, que os participantes dos programas televisivos recebem cachês simbólicos, a título de gratificação, pelo uso da imagem e voz.

O contra senso é que, recentemente, a própria TV Record me convidou para integrar seu quadro de artistas. Não conseguindo seu intento, utiliza de expedientes contra minha dignidade e decoro, na intenção de conseguir preciosos pontos no ibope. Trata-se de um ledo engano. É com verdade e competência que se conquista o êxito.

Para não ficar obscuro e pairar dúvidas sobre a integridade do Canal Aberto, tomaremos as medidas judiciais cabíveis para o caso. João Kleber".


Ameaças de processos começaram a sair das bocas de Claudete Troiano e de João Kléber. Mas a briga pelo Ibope, quando deveria ser briga pela qualidade da informação jornalística, não parou por aí. 

No sábado, 1? de junho, o substituto de Datena, Ney Gonçalves Dias, pôs uma "bomba" no ar, bem no finalzinho da tarde, em seu Cidade Alerta. Referiu ter recebido uma ligação do celular do ex-empresário do cantor Belo, procurado pela polícia sob suspeita de envolvimento com o narcotráfico carioca. Gonçalves Dias conta que o ex-empresário do cantor, Hamilton Pereira, teria-lhe confessado que Belo estaria se entregando ao 3? Distrito Policial, na rua Aurora, centro de São Paulo, após ter passado mal. Estaria hospedado no Hilton Hotel, no centro da capital paulista. E teria sido atendido no Hospital Santa Isabel, também na região central da cidade.

Tanto bastou. O "furo" de Ney Gonçalves Dias levou uma legião de repórteres e cameramen às portas da delegacia, do hospital e do hotel. Ney referia que o telefone celular fora checado, e que seria mesmo do tal empresário Hamilton Pereira. Mas era uma barriga homérica. Mobilizou profissionais de imprensa e policiais de plantão. Na porta do hospital, os famosos "populares" garantiam de pés juntos que haviam visto o cantor Belo entrar ali, num Jeep Cherokee, "agachado e com um um tiro na barriga, apalpada pela mão direita dele". A Rede Record garantia que o próprio secretário da Segurança Pública de São Paulo estaria no local para negociar a rendição de Belo ? quando na verdade ele se encontrava no interior do estado entregando carros policiais na companhia do governador Geraldo Alckmin.

A barriga que se apresentou não foi aquela imaginária, do Belo, vista pelos populares. Foi uma bem palpável: a de Ney Gonçalves Dias.

Na mesma hora, José Luiz Datena mete a boca na sua antiga TV, condenando a colocação de informações "não checadas" no ar.

No domingo (2/6), outra série de especulações: Datena põe no ar uma fita que lhe teria sido fornecida pelo advogado do cantor Belo, Alberto Louveira. Nela consta uma conversa entre Belo e um ex-advogado do cantor, Sílvio Guerra. A fita, constante do processo que apura os supostos crimes de Belo, traz diálogos entre o cantor e Guerra ? nos quais este solicita a venda do automóvel Audi de Belo. O dinheiro seria para pagar ? diz o advogado Silvio Guerra, na fita ? suposta propina exigida pelos delegados cariocas Ricardo Hallack e Álvaro Lins, que investigam Belo.

Sem dúvida um "furaço", que poderia ter custado caro a José Luiz Datena ? já que as acusações contra os delegados eram aquilo que os advogados costumam chamar de "chicana" (em bom português, armação).

Antes que o furo de Datena se convertesse numa barriga à la Ney Gonçalves Dias, aquele consegue ouvir, por celular, o advogado Silvio Guerra, que estava em Natal (RN). E confessa a Datena, no ar, que as acusações contra os policiais cariocas eram na verdade uma forma de pressionar Belo para que este lhe pagasse os honorários devidos por serviços de advocacia. Agora, tanto o advogado Alberto Louveira quanto Silvio Guerra querem se enfiar processos.

De José Luiz Datena, pode-se dizer: vende uma atrabiliária e repassada paixão no credo de que matar bandido resolve a criminalidade (sem cogitar, no ar, que Nova York, por exemplo, só deixou de ser a cidade mais violenta do mundo quando a economia norte-americana cresceu). Usa ternos Giorgio Armani, risca-de-giz, e nutre paixão pelos homens de farda. Tem um olho a piscar e outro que agita. Mas nessa briga entre os "guardas Belo" de plantão, em que a gincana pelo Ibope virou a chicana pelo Ibope, Datena conseguiu checar a informação que colocara no ar e desmenti-la, oxigenando todo o processo do jornalismo declaratório. Agiu com precisão e ao vivo ? prática que, salvo muito esforço, digamos quase sobre-humano, deve ser detonada pela competição entre Record e Rede TV! pela "chicana pelo Ibope"

(*) Repórter especial da Rádio Jovem Pan, professor das Fiam (SP) e ECA-USP

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