Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Luís Nassif

JUSTIÇA & IMPRENSA

"A indústria dos processos", copyright Folha de S. Paulo, 30/04/02

"Finalmente imprensa, empresas, Ministério Público e Justiça começam a se dar conta de um conjunto de distorções que acabou tornando os quatro poderes reféns de um jogo comercial de características pesadas.

As distorções do processo permitiram a proliferação de ?empreendedores de ações jurídicas? -pessoas que aprenderam a trabalhar com as distorções existentes no relacionamento entre mídia e partes interessadas em disputas comerciais.

Os ?empreendedores? montam suas estratégias de disputa, nas quais a ação judicial é apenas uma peça do processo. Nem é necessário ter razão na ação. Às vezes a simples demora no julgamento torna mais barato para a outra parte aceitar um acordo desvantajoso.

Esse jogo teve início quando a disputa entre órgãos de imprensa levou-os a desarmar os processos internos de controle de qualidade da informação. Aceitava-se qualquer churrasco de gato, desde que garantisse a manchete de impacto, ainda que fosse desmentida pelos fatos nos meses seguintes. O álibi era a defesa do bem público, não o compromisso expresso com a objetividade dos fatos.

Essa falta de critério amplo prescindia de confirmações futuras sobre a veracidade das matérias. As falsas simplesmente desmanchavam no ar e eram esquecidas, sem nenhum risco para o veículo ou para seus autores. Com a porteira aberta, passou todo tipo de boi e de boiada, de dossiês a grampos.

Essa falta de critério abriu espaço para um segundo tipo de manipulação, muito empregado por alguns procuradores do Ministério Público Federal de Brasília e também por policiais. Vazavam-se para a imprensa partes do processo ou opiniões em ?off? e, com base nas notícias plantadas, tentava-se pressionar os juízes. Muitas liminares foram obtidas desse modo.

Mais uma vez, usava-se o álibi da defesa do bem público. Com as boas intenções justificando todos os abusos, abriu-se a exceção e, com ela, espaço para uma indústria terrível, cujos principais personagens começam a aflorar agora, mas que estavam atuantes desde o início.

Parte deles veio do submundo, chantagistas, grampeadores, egressos da comunidade de informações, que passaram a trabalhar como free-lancers para as partes envolvidas.

Na área da mídia, surgiu uma nova modalidade, a assessoria de imprensa barra pesada, especializada em missão de guerra, ganhando rios de dinheiro para praticar dois tipos de trabalho pouco ortodoxos. O primeiro, colocando os chantagistas em contato com jornalistas, atraídos pela cenoura de furos, grampos ou meros boatos. O segundo, atacando os recalcitrantes, jovens repórteres, com ameaças contra sua reputação, brandindo intimidade com chefias ou partindo para ataques frontais.

Hoje em dia, as empresas que recorreram mais pesadamente a essas assessorias são, não coincidentemente, as de pior imagem na mídia. O Ministério Público está sendo alvo de enorme quantidade de ações de indenização, por vazamento de informação, infelizmente atingindo procuradores sérios, que ficaram expostos pela ação dos irresponsáveis. A mídia esbarra em problemas de credibilidade, especialmente na área que utiliza mais intensamente notas sem critério técnico.

Há mudanças. Do lado da mídia, há menos espaço para dossiês, grampos, especialmente depois de esse expediente ter sido levado ao exagero absoluto nas últimas vezes em que foi utilizado. Entrar nesse jogo já foi grande negócio jornalístico. Hoje em dia, suscita suspeita. Do lado do MP, há uma tendência ao esvaziamento dos procuradores de Brasília, que só mantêm poder graças ao espaço que conservam na mídia. Do lado das assessorias de comunicação, foi criada uma entidade cujo primeiro desafio será implantar um código de ética na categoria.

Falta apenas cair a ficha nas grandes corporações."

 

NP EM LIVRO

"A história sensacional do ?Notícias Populares?", copyright Valor Econômico, 23/04/02

"?E tem jornal popular que/ Nunca se espreme/ Porque pode derramar?, cantava Tom Zé em ?Parque Industrial? (1968), indicando que o ?Notícias Populares? tinha lugar cativo no bazar tropicalista, na ?geléia geral? que definia o país. O jornal circulou entre 1963 e 2001, baseando sua estratégia na exploração sensacionalista do crime, do sexo e de tudo o que fosse inusitado. Com manchetes desmedidas e bem-humoradas, o NP, como era conhecido pelos leitores, marcou época. Contar sua história é recompor uma vertente da imprensa paulista menosprezada pelos bem pensantes.

A pesquisa começou como um trabalho de conclusão de curso de jornalismo, apresentado pelos autores em 1999, na Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero. Com o fechamento do jornal, eles resolveram ampliar o texto e transformá-lo em livro. Foi acrescentada a incrível saga do romeno Jean Mellé (1910-1971), o fundador do jornal. Para isso, os autores entrevistaram Herbert Levy (1911-2002) – dono do NP até 1965, quando foi vendido para o Grupo Folha -, seu filho Luiz Fernando e Giulietta Mellé, a viúva do fundador.

A trajetória de Mellé, o nascimento e os primeiros anos da publicação são os pontos altos do livro. Nos anos 40, quando ainda vivia na Romênia, Mellé criou ?Momentul? (o momento), o jornal mais popular do país. Com a ascensão do regime comunista, em 1947, Mellé foi deportado para a Sibéria, onde ficou dez anos. Libertado em 1958, veio para o Brasil, onde já vivia o irmão Victor.

Mellé foi trabalhar no ?Última Hora? e tornou-se o principal colunista internacional do jornal dirigido por Samuel Wainer. Descontente com a orientação política do ?Última Hora? – jornal popular tradicionalmente alinhado com o populismo, que no começo dos anos 60 flertava com a esquerda -, Mellé se demitiu e começou a trabalhar no projeto de um jornal popular de linha conservadora.

Com o projeto debaixo do braço, procurou Herbert Levy, deputado da UDN, banqueiro e dono da ?Gazeta Mercantil?, para convencê-lo a financiar o jornal. Com a crescente aproximação de Jango com a esquerda, era muito oportuna para as elites conservadoras a criação de uma publicação voltada para a despolitização das camadas populares. Os anos passados na Sibéria tornaram Mellé especialmente sensível a tudo o que se referisse à esquerda. ?Ele disse a Levy que, se não bancasse o jornal, em três meses os russos invadiriam o Brasil e levariam todo mundo para a Sibéria. Levy aceitou no ato a proposta?, conta Celso de Campos Jr.

Tribuna política reacionária voltada para a derrubada de Jango, o NP ainda não era o jornal na linha sangue e tripas. Em 1965, Levy vendeu o jornal, considerando inútil mantê-lo depois do golpe militar. ?Apesar de ser um sucesso editorial, derrubando o ‘Última Hora’, o jornal não andava bem financeiramente, pois não era bem organizado em termos empresariais, dificultando a amortização dos investimentos feitos para criá-lo?, diz.

No período seguinte, Mellé pôde implantar seu projeto, escorado numa cobertura particularmente enfática do noticiário policial, dos esportes e da vida dos artistas. O jornal acompanhou como nenhum outro a emergência da Jovem Guarda. ?O jornal badalou muito Roberto Carlos, Wanderléa e companhia. Ajudou-os a se tornar populares e eles ajudaram o jornal a cativar de vez o leitorado menos instruído?, nota.

A segunda metade dos 70 foi a época áurea do jornal, que destacou figuras legendárias, como o bebê-diabo, o vampiro de Osasco e a loira fantasma. Bateu recordes de vendagem em banca. Nos anos 90, o NP sofreu uma profunda reforma, diminuindo a dose de sensacionalismo, para ganhar credibilidade. Além da remodelação gráfica, o jornal reforçou a cobertura da economia, com ênfase nas notícias sobre sindicatos e aposentados. ?Há uma contradição nisso, pois o jornal acabou apelando para as manchetes mais escabrosas visando a aumentar suas vendas?, diz. No início do novo século, o Grupo Folha decidiu fechar o NP e concentrar seus investimentos no recém-criado ?Agora?."

 


"?O Clone? faz campanha por clínica para viciados", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 24/04/02

"?Além de implementar uma série de inovações na imprensa brasileira, foi o primeiro jornal a falar a língua do povo?, conta Dênis Moreira, um dos quatro autores do livro ?Nada Mais Que a Verdade – A Extraordinária História do Jornal Notícias Populares?. Resultado de uma pesquisa feita para a conclusão do curso de Jornalismo da Faculdade Cásper Líbero, a publicação, escrita também pelos colegas Celso de Campos, Giancarlo Lepiani e Maik Rene Lima, foi lançada nesta terça-feira (23/4), em São Paulo.

Moreira recorda que ele e os colegas sempre gostaram muito de ler Notícias Populares, apesar de o diário ser considerado aquele que espreme e sai sangue. ?Nos divertíamos muito lendo as manchetes?, diz, referindo-se aos títulos como ?Espírito de porco baixa em macumba? e ?Broxa torra o pênis na tomada?.

O jornal despertou o interesse dos autores quando eles perceberam que não havia informações sobre a história do NP. ?Também descobrimos que o Notícias Populares foi muito mais do que um jornal cujo estereótipo é conhecido por todos nós. Poucos sabem isso?. Os autores descobriram que o NP foi o primeiro periódico a valorizar as manchetes e utilizar textos curtos com fotos grandes e ilustrativas, além de abordar a economia popular. Começou a fazer a cobertura da vida das celebridades, quando deu destaque à Jovem Guarda, ajudando Wanderléa, Erasmo Carlos e Roberto Carlos a se tornarem populares. Também foi o primeiro órgão de imprensa a ter uma coluna voltada exclusivamente para os homossexuais, o ?Espaço Gay?.

Além de lerem quase todas as edições do NP, os autores entrevistaram jornalistas que passaram pela redação do diário. Conversaram também com Herbert Levy, dono da Gazeta Mercantil, que financiou o jornal, seu filho Luiz Fernando Levy e Giulietta Mellé, viúva do criador.

História

A idéia de criar o NP partiu de Jean Mellé (1910-1971), um romeno que chegou ao Brasil em 1958. O fundador foi trabalhar no Última Hora, onde escrevia uma coluna para a editoria Internacional. Mas ele se demitiu porque não aceitava a orientação política do periódico, que era alinhado à esquerda. Com o projeto do NP embaixo do braço, Mellé procurou Levy e conseguiu convencê-lo a investir.

A proposta do NP era combater o esquerdismo através de matérias voltadas para as camadas populares. Tornou-se um vespertino anticomunista. ?Caprichavam com reportagens sobre sexo, crimes e assuntos sobrenaturais?, lembra Moreira.

Em 1965, logo depois do golpe militar, Levy, militante da UDN, decidiu vender o jornal para a dupla Octávio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho. Mellé continuou na redação trabalhando como editor. Foi nessa época que o NP passou a enfatizar notícias policiais, esportivas e sobre a vida das celebridades.

Mas foi na década de 70, mas precisamente em 1975, que o períodico bateu o recorde de venda em bancas, quando publicou histórias sobre o bebê-diabo, que virou um marco no jornalismo brasileiro. Os leitores tanto acreditaram na figura lendária que a redação criou uma saga para ela. Durante 27 dias, o bebê-diabo esteve na primeira página. Algumas pessoas chegaram até a ligar para a redação dizendo que tinham visto a figura.

A partir de 1983, Notícias Populares passou a destinar colunas a minorias, fossem elas religiosas ou étnicas. Foi então criada uma seção GLS. Os jornalistas também fizeram questão de destinar um espaço para a ?Coluna do Machão?. Na mesma página, ficava a também pioneira coluna ?Tudo sobre sexo?.

Em 1990, as principais matérias eram voltadas para sexo e sensacionalismo. As manchetes são chocantes: ?A morte não usa calcinha?, ?Bicha põe rosquinha no seguro? e ?Aumento de merda na poupança?.

Até Zé do Caixão foi correspondente do NP. Em 1994, ele foi fazer a cobertura do GP Brasil de Fórmula 1. Chamou tanta atenção durante os treinos que a Associação dos Construtores cassou sua credencial. Uma das grandes gafes do Senhor das Trevas foi ?benzer? o carro de Roland Ratzemberger. No texto, ele informava que tinha exorcizado a Simtek do piloto com ?a força das trevas?. O piloto acabou não se classificando para a corrida e, dois meses depois, sofreu um acidente em Imola e morreu a bordo da Simtek.

O lançamento do Agora S. Paulo, em 1999, desprestigiou Notícias Populares. Não havia dinheiro para melhorar sua estrutura ou produzir grandes campanhas. ?Acho que dentro do Grupo Folha o NP era visto com uma certa desconfiança. O jornal era diferente, exagerado nas reportagens?. O grupo descontinuou o diário a 20 de janeiro de 2001.

?Nada Mais Que a Verdade – A Extraordinária História do Jornal Notícias Populares? foi publicado pela Carrenho Editorial. O livro tem 280 páginas e custa R$ 32"

 

COLEÇÃO VIDA DE REPÓRTER

"Aventuras jornalísticas que merecem virar livro", copyright O Estado de S. Paulo, 27/04/02

"Em cena, os bastidores da notícia. Resgatar num depoimento pessoal aquilo que o exíguo espaço de um jornal ou revista não permite – a emoção do repórter, os riscos, os percalços, os golpes de sorte, tudo o que envolve uma grande reportagem. Esse é o objetivo da coleção Vida de Repórter, da Geração Editorial, cujos quatro primeiros livros – Viagem ao Mundo dos Taleban, de Lourival Sant?Anna; Viva o Grande Líder! Um Repórter Brasileiro na Coréia do Norte, de Marcelo Abreu; Direto da Selva, As Aventuras de um Repórter na Amazônia, de Klester Cavalcanti e Vida de Repórter, de José Maria Mayrink – serão lançados amanhã, às 15 horas, na Bienal do Livro.

Foi um golpe de sorte – a amizade com um motorista e guia paquistanês – que ajudou Lourival Sant?Anna, repórter especial do Estado, a tornar-se o único jornalista brasileiro a entrar no Afeganistão dias após o atentado de 11 de setembro e, principalmente, o único a entrevistar integrantes do regime Taleban. Até então, só uma jornalista inglesa entrara no país, mas estava presa. Na manhã em que Lourival faria a segunda tentativa de cruzar a fronteira com o Afeganistão, um jornal local informava que ?os taleban haviam emitido uma ordem, na véspera, para a população matar qualquer estrangeiro que encontrasse no país.? O repórter conta que ?engoliu em seco? e repetiu o seu lema: ?Vamos encontrá-los antes que eles nos encontrem.? Pegar ?inimigo? de surpresa era o plano – bem-sucedido.

Perplexidade – Lourival inicia seu relato pela manhã do dia 11 de setembro que prometia ser um dia rotineiro, até ele ouvir a notícia do atentado terrorista no rádio do carro. Já na redação do Estado, em meio à perplexidade provocada pela queda das torres do World Trade Center, decide-se mandar um repórter para Jerusalém. Na mesma tarde, ele embarca num vôo para Zurique, de onde tomaria outro avião para Tel-Aviv. Vôos cancelados, tensão no aeroporto – começa cedo a aventura do repórter.

Antes de partir para Jerusalém, Lourival consulta o experiente jornalista Moisés Rabinovich, também do grupo Estado e expert em cobertura de guerras no Oriente Médio. Um apoio necessário. Bem menos experiente, ele parte para o epicentro do conflito entre Israel e Palestina, depois para o Paquistão e daí para o Afeganistão sem conhecer ao menos os idiomas locais. O que poderia parecer fragilidade, acaba se transformando em virtude. Antes de mais nada porque a dependência extrema de um bom guia e intérprete acabou provocando a amizade com o motorista Iqbal Afridi, um aliado precioso na travessia da fronteira com o Afeganistão. Mas principalmente, no caso do livro, porque essa fragilidade torna sua narrativa interessante para o leitor comum. Curioso, Lourival compartilha, no livro, suas surpresas e perplexidades diante do que ia encontrando pela frente, observando costumes e entrevistando pessoas que talvez não chamassem atenção de um correspondente culturalmente ambientado.

O repórter coloca ponto final na sua narrativa no caminho de volta ao Brasil, no aeroporto de Paris, quando toma conhecimento do início dos bombardeios sobre o Afeganistão. Para ele, e para o leitor, não é mais uma massa anônima que está na mira das bombas. Mas gente com que se conviveu, ao longo do relato, cujas razões, emoções, contradições e histórias foram ouvidas e compreendidas.

Estopim – Pela urgência do tema, Viagem ao Mundo dos Talebans foi o estopim para o lançamento da coleção. ?Há um ano eu havia entrado em contato com Marcelo Abreu, autor de Viva o Grande Líder!, e fiquei interessado na sua publicação, mas felizmente esperei por um momento mais oportuno?, conta o jornalista e editor Luiz Fernando Emediato, responsável pela Geração Editorial. No início do ano, quase que simultaneamente, tomou conhecimento dos outros três livros. ?Pelo tema, o livro do Lourival pedia publicação imediata. Quando percebi, estava diante de uma coleção. Não foi idéia minha criá-la. Ela se impôs.?

Emediato ressalta que o objetivo da série não é ?reproduzir? reportagens publicadas na imprensa, o que acaba sempre resultando numa publicação datada. ?Esses livros vão perdurar porque trazem uma reflexão sobre a experiência dos repórteres. E também pela linguagem, atraente tanto para o aficionado por aventuras quanto para o estudante de jornalismo. Para esses, então, essa coleção é uma aula. Tanto que pensei em chamá-la de ?Lições de Jornalismo?. Mas além de arrogante, seria redutor. Acabei roubando o título do Mayrink.?

Coincidentemente, é também numa manhã de 11 de setembro que começa uma das muitas aventuras relatadas por José Maria Mayrink, atualmente também repórter especial do Estado, em Vida de Repórter. O ano era 1973 e nesse dia, também pelo rádio do carro, ouviu o anúncio do golpe militar contra o presidente Salvador Allende, no Chile. Ele chegava em casa, trazendo as filhas da natação. Tempo de arrumar as malas e partir para Santiago. Mais riscos e golpes de sorte. Ele fazia cobertura pelo Jornal da Tarde e pelo Estado estava seu colega Clóvis Rossi, atualmente articulista da Folha de S. Paulo. No dia 25 de setembro, Mayrink cancela uma entrevista e vai cobrir o enterro do poeta Pablo Neruda, que havia morrido na véspera. Rossi vai entrevistar um assessor econômico de Pinochet. O enterro de Neruda acaba por se tornar a primeira manifestação pública contra o ditador e Mayrink publica a reportagem no Estado e no JT.

São muitas as histórias como essa relatadas em Vida de Repórter, um balanço de 40 anos de profissão, o único da série que se diferencia dos outros justamente por não se ater a uma única reportagem. Como bom mineiro, Mayrink é um excelente contador de casos. São muitos e saborosos ao longo de mais de 200 páginas, desde os mais prosaicos, como publicar o nome de Pelé como ?Joaquim Arantes do Nascimento?, quando ainda era um iniciante, até experiências mais dolorosas, como o corajoso capítulo cuja primeira frase é ?sou um fura-greve?, no qual relata a divisão da categoria na greve de 1979.

Privilégio – ?É um livro dos outros?, diz Mayrink, que resgata com essa publicação um pouco da memória do jornalismo, relembrando coberturas e a atuação de colegas nos diversos jornais e revistas em que trabalhou. Defensor ferrenho do lema ?lugar de repórter é na rua?, num tempo em que as notícias chegam às redações pelas agências, Mayrink argumenta: ?Por menor que seja o conhecimento de um repórter sobre o conflito entre Israel e Palestina, se ele estiver hoje em Belém estará num situação privilegiada com relação a qualquer um de nós na redação.?

Privilégio também do leitor que, por meio dessa coleção, pode acompanhar aventuras insólitas como a vivida por Marcelo Abreu. Foram dois anos de preparativos até que conseguisse entrar na Coréia do Norte, não como repórter – eles não são bem aceitos lá – mas disfarçado de membro de uma organização humanitária. Foi o primeiro jornalista brasileiro a entrar no país, um dos últimos ?linha-dura? do regime comunista, onde pôsteres de líder Kim II Sung dominam a paisagem.

Em Direto da Selva, o pernambucano Klester Cavalcanti narra as aventuras vividas em dois anos como correspondente da revista Veja na Amazônia. Numa delas, no dia 8 de março de 2000, foi seqüestrado, encapuzado e abandonado amarrado a uma árvore no meio da floresta. Não fosse a lição aprendida com um soldado durante uma operação para apagar uma queimada em Roraima, jamais teria sido vivo da mata. ?Quero ter 40 como esses na coleção. Todo jornalista que tenha um bom making of pode me procurar?, avisa Emediato."