Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Mídia desperdiçou a chance do debate

 

Roberto Takata (*)

Batalha braba lá na terra de Bill Clinton. Em 11 de agosto, o Conselho de Educação de Kansas, EUA, decidiu eliminar o ensino da evolução do currículo ? embora não o tenha proibido, não mais se poderá incluir questões sobre o tema nos testes escolares. A imprensa americana reagiu prontamente contra o disparate ? foi ouvir biólogos do porte de Stephen J. Gould, atual presidente da Sociedade Americana para o Progresso da Ciência , de Richard Dawkins e outros, além de cientistas de outras áreas e, principalmente, educadores. Para acompanhar com detalhes um bom local é: <http://fullcoverage.yahoo.com/fc/US/Education_Curriculum_and_Policy/>.

A pergunta que se poderia fazer é: e daí? O que a decisão tomada lá no interior dos EUA tem a ver com o Brasil?

Certamente mais do que as fofocas envolvendo astros pop americanos e a transmissão de eventos esportivos como hóquei e beisebol do lado de lá do equador. A imprensa brasileira demorou uma semana, mas finalmente resolveu prestar mais atenção aos desdobramentos da história, pelo menos no caderno Mais! (Folha de S.Paulo, 20/8/99) e na IstoÉ (25/8/99) ? muito provavelmente em vista do destaque dado ao assunto pelo The New York Times e outras publicações de expressão nos EUA.

Recebi uma série de e-mails de um senhor acusando (em termos mais brandos) a imprensa brasileira de macaquear o que foi lá divulgado por uma mídia “neodarwinista radical”. Bem, não acho que os criacionistas não devam ser ouvidos, mas o caso é que claramente um dos lados está com a razão ? nominalmente, os defensores da manutenção do ensino da Teoria da Evolução no currículo escolar de Kansas.

Seria uma boa deixa para a imprensa colaborar com a cultura científica, pois várias questões poderiam ser levantadas: o que é a Teoria da Evolução? Qual o papel dessa teoria na Biologia e na Ciência? O que é o Criacionismo e por que ele está errado? O que é uma teoria científica? E um fato?

Se temos cadernos culturais e revistas eletrônicas para nos mostrar o que um artista faz em suas horas de lazer, como se faz um pato fricassé com molho bechamel e o que é in e out no mundo das indumentárias tribais urbanas, não vejo por que não aproveitar o gancho e expor algumas noções básicas em Ciência; aproveita-se e se desmistifica a idéia da verdade científica como irrefutável, perene e imutável. Idéia tão comum quanto a oposta e também falsa: a Ciência como coisa do diabo, que afasta as pessoas da espiritualidade etc.

Temos divulgadores científicos muito bons, como o veterano José Reis, e um pouquinho mais de espaço de vez em quando seria muito bem-vindo, uma prestação de serviço ao leitor e ao telespectador, auxiliando-os a se defenderem de promessas de cura milagrosa para o câncer, a celulite e a gordura localizada, entre outros engodos. Ajudaria o público a analisar criticamente os prós e os contras das novas tecnologias, que afetam diretamente a vida dos cidadãos: por exemplo, os organismos transgênicos e a terapia genética.

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