Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Mídia mais cautelosa no “Midiagate, fase 2”

DEPOIS DO COMPORTAMENTO vexaminoso em fins de janeiro no primeiro round do caso Monica Lewinsky a mídia, agora, está se comportando com maior contenção e senso de responsabilidade.

É a conclusão de uma matéria do New York Times (31/7/98), assinada por um de seus repórteres da área de mídia, Robin Pogrebin. Steven Brill, que recentemente denunciou na sua revista os métodos levianos da primeira fase, classificando-os como “pressgate“, declarou que houve uma pequena melhora na atitude dos veículos.

Embora muitos dos responsáveis pelas primeiras matérias continuem achando que não erraram, muitos executivos das maiores empresas de mídia declararam que a crítica veiculada na própria mídia obrigou-os a agir com maior cautela.

O NYTimes, no entanto, afirma que muitos veículos continuam servindo-se de fofocas fornecidas por fontes anônimas.

Um complicador, segundo Leo Wolinsky, editor-chefe do Los Angeles Times, é que os jornalistas continuam usando fontes contraditórias. Procuram dar guarida a informações de outros veículos para se garantirem.

Dan Rather, o âncora da CBS, declarou que continua a favor do princípio “melhor ser o último do que estar errado”. Segundo ele, a mídia continua operando num mercado altamente competitivo, o que pode embaralhar critérios e decisões.

Bill Kovach, curador de um projeto de excelência jornalística na Universidade de Harvard, concluiu: “Está claro que a imprensa foi usada por certas fontes, o que levanta sérias dúvidas sobre o seu grau de independência. Se eu fosse um editor, evitaria publicar matérias sobre depoimentos que ainda não foram feitos.”

A FOLHA TEM uma editoria de Ciência atenta e responsável. Não costuma ir na onda sensacionalista, tipo “pátio dos milagres”. O mesmo pode-se dizer do noticiário internacional, embora extremamente reduzido (as duas áreas funcionam em conjunto).

Mas na edição de 30/7/98 alguém perdeu a cabeça e resolveu “fazer barulho” na pagina de abertura (1-13) com uma manchete destinada a converter-se em tema de todas as conversas. Desprezaram o voto de desconfiança no gabinete de Netanyahu, as conversas entre Índia e Paquistão no Sri Lanka, a tragédia do Sudão e, na área da ciência, a comprovação de que as terapias do dr. Di Bella eram milagreiras.

E resolveram privilegiar com a principal matéria do noticiário internacional um estudo divulgado por uma revista australiana de urologia informando algo de tremenda importância: o clitóris é maior do que se supunha.

Não contentes, os almanaqueiros de plantão ainda despacharam repórteres para ouvir ginecologistas e obstetras locais. Uma das entrevistas foi taxativa: esses resultados, “apesar de interessantes, devem ser encarados como sendo preliminares. Um estudo anatômico confiável precisa basear seus achados em centenas, ou mesmo milhares de casos”. Em outra está dito que os novos dados “reforçam ainda mais a importância do estímulo do clitóris na sexualidade feminina”.

Nada que já não se soubesse. Mas como a página estava armada deixaram como estava. Mudar tudo, daria muito trabalho.

Todos os demais jornais registraram a sensacional revelação da Folha com a reserva que merecia: em notas de uma coluna.

O TRE DE S. PAULO multou o programa de Hebe Camargo (e o SBT, que o veiculou) pelo manifesto apoio a Paulo Maluf e ao seu candidato ao Senado, o jogador Oscar Schmidt.

Mas os TRE do país não têm condições de fiscalizar as milhares de emissoras de rádio e os respectivos apresentadores que, ao longo das 24 horas, fazem propaganda ostensiva em favor de seus preferidos.

Isso é tarefa para a sociedade. Cada eleitor deve ser fiscal dos abusos eleitorais cometidos pela mídia eletrônica.

MAIS TRÊS ASSASSINATOS na periferia da capital – a esta altura o número de pessoas mortas, 191, já é quase 18% maior do que o de 1997 (162 mortes em 47 chacinas). E ainda estamos em agosto, faltam quatro meses para o fim do ano.

A maioria das chacinas, segundo informa a PM paulista, está relacionada com o tráfico de drogas.

A cobertura da mídia paulista é pequena, reativa e intermitente. No caso do Rio, dá o mesmo. O assunto só cresce quando o número de vítimas é grande (considera-se chacina a liquidação de três ou mais pessoas simultaneamente). No dia seguinte, o assunto desaparece por completo. A maior chacina do ano em S. Paulo, com 12 vítimas, ainda não foi esclarecida nem a imprensa se importa com isso.

O nosso Vietnã só vai acabar quando a imprensa brasileira – como fez a americana nos anos 70 – transferir-se à linha de frente. Não se faz reportagem de polícia no telefone da redação.

(Ver abaixo remissão para anúncio do seminário internacional sobre Mídia e drogas.)

PARECE BEM-INTENCIONADO mas é perverso. Veja adotou a técnica quando, a pretexto de desmentir a onda de fofocas sobre a família de Glória Pires, publicou extensa matéria esmiuçando o caso na capa.

Agora, foi a Folha, no seu caderno esportivo (22/7/98, p. 3-11). Com a desculpa de impedir a proliferação das futricas sobre a namorada de Ronaldinho, o jornal expõe o caso inteiro.

Decididamente, esta não é a melhor forma de buscar a verdade.

 

LEIA TAMBEM

Mídia e drogas: atitudes, cultura e investigação

O Estado de S. Paulo, Entre aspas

Folha de S. Paulo (de Notícias Populares),