Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Mídia parece querer clima de histeria

Os meios de comunicação brasileiros parecem querer criar um clima de histeria em torno da visita do presidente Clinton ao país. Uma viagem de pouca substância material e caráter mais de cortesia do que de negócios está sendo tratada como prelúdio de uma crise nas relações bilaterais.

Medidas corriqueiras de segurança se transformam em atentados contra a soberania nacional e manuais burocráticos de instruções para empresários que desejam investir no Brasil são lidos como ofensas à honra do país.

Tudo para tentar transformar um encontro protocolar e de conteúdo prático reduzido em assunto capaz de atrair a atenção do público. Pelo pior caminho possível.

Se Clinton estivesse vindo com o fast track (a legislação que lhe permitiria negociar acordos de comércio bilaterais com desenvoltura), esta excursão teria algum sentido político. Aí, talvez, os nacionalistas brasileiros tivessem razão para se preocupar com ela.

Não porque o serviço secreto se incomoda com as emas soltas nos jardins do Alvorada ou porque a Casa Branca alerta aos enviados especiais ao Brasil que eles podem contrair hepatite A com mais facilidade aqui do que em casa.

O real problema que Clinton poderia causar ao Brasil seria enfiar uma cunha para dividir o Mercosul, tentando atrair a Argentina para o Nafta e, assim, isolar o país no continente. Sem fast track, ele não tem condições para isso.

O resto é literalmente bobagem. Quem tem mais poder exige mais e quem tem menos se submete. Quando FHC visitou Angola, a caminho da África do Sul, muitos angolanos também se queixaram do que consideraram arrogância brasileira com seus irmãos de língua portuguesa na África. E os jornalistas brasileiros que o acompanharam foram advertidos para os riscos de saúde que corriam.

(Copyright Folha de S. Paulo, 13/10/97.)