Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Márcio Moreira Alves

LIÇÕES DE JORNALISMO

“Falar aos jovens”, copyright O Globo, 20/08/02

“Sílvio Ferraz, um excelente repórter, encaminhou-se para a vida acadêmica e dirige o curso de jornalismo da Univercidade. Convidou-me para dar a aula de abertura do período letivo, tarefa que aceitei com um certo receio da responsabilidade de falar aos jovens futuros colegas. É sempre delicado falar a quem está no limiar da vida profissional, cheio de esperanças e ilusões.

A primeira coisa que lhes disse aplica-se a qualquer profissão, embora tenha uma importância especial para os jornalistas:

– Não se esqueçam nunca do que somos. Não somos americanos nem europeus. Somos brasileiros e, se quiserem expandir a identidade, somos latino-americanos. Isso quer dizer que somos pobres, mesmo que alguns consigam ganhar dinheiro. Somos também bombardeados todos os dias pelas idéias geradas nos Estados Unidos e na Europa. Temos, portanto, que fazer uma filtragem dessas mensagens que procuram anular a nossa própria cultura e nos fazer pensar no rumo que interessa aos donos do império. Aprender a pensar com a nossa própria cabeça e segundo os nossos interesses de brasileiros e de latino-americanos é um exercício permanente e indormido. Qualquer distração nos faz cair na armadilha dos desenvolvidos.

– A segunda tarefa é saber onde estamos. Estamos num país imenso, com grandes riquezas potenciais no seu povo e na sua terra. Este país é o único do mundo entre os que chamam de países-baleia, que têm uma só língua e uma única religião, a cristã. Essa unidade lingüística, uma vantagem relativa, traz consigo uma responsabilidade dobrada para que tem a profissão de informar e comunicar, como nós, jornalistas. Implica que nos esmeremos em conhecer o mais profundamente que pudermos o nosso instrumento básico de trabalho, que é a língua portuguesa.

Só conheço uma maneira de se adquirir intimidade com a língua portuguesa: é ler, ler muito, especialmente os romancistas e os poetas. A escolha é ampla, mas tenho especial preferência pelos romancistas que nos ensinam coisas do Brasil com a sua ficção. Aprendi quase tudo o que sei da história do Rio Grande do Sul lendo ?O tempo e o vento?, de Érico Veríssimo, e a história da Bahia através de ?Viva o povo brasileiro?, de João Ubaldo Ribeiro. Nenhum historiador conseguiu transmitir melhor a tragédia das secas nordestinas do que Rachel de Queiroz, com ?O quinze?, e Graciliano Ramos, em ?Vidas Secas?. Este ano comemora-se o centenário da publicação de ?Os sertões?, de Euclides da Cunha, cuja leitura continua a ser indispensável e atual. Uma língua inventada, mas de absoluta verossimilhança é a de Guimarães Rosa, que é, também, um grande contador de casos e um observador imbatível da flora, da fauna e da psicologia do homem dos sertões dos campos gerais das Minas Gerais. Duvido que algum leitor deixe de se emocionar com o menino Miguelim, quando, pela primeira vez, lhe dão óculos que lhe permitem ver as formas com nitidez e as cores com toda a beleza do mundo.

Sabendo quem somos e onde estamos, temos ainda que conhecer o nosso passado. Sou de opinião que a História do Brasil deveria ser ensinada, especialmente a jornalistas, a partir dos dias de hoje, seguindo para trás. É que as informações contemporâneas nos são mais úteis. Assim, começaríamos com os mandatos de Fernando Henrique, passando por Itamar, Collor, os generais da ditadura, o golpe de 1964 e assim até onde fosse possível chegar. É que a ignorância dos jovens em relação ao passado recente é uma barreira ao bom jornalismo e até ao entendimento de alguns termos. A palavra cristianização, muito usada nesta etapa eleitoral, teve de ser explicada porque quase ninguém mais sabia quem fora Cristiano Machado, abandonado por seu partido na disputa com Getúlio Vargas.

Procurar conhecer o passado é parte de uma das qualidades essenciais do repórter: a curiosidade. Quem não gostar de ser repórter não será jornalista. Poderá ser administrador de empresas, artista gráfico, mas não jornalista. A outra condição essencial do repórter é não ter preguiça. Por mais longe que a notícia esteja, é preciso buscá-la e apresentá-la ao leitor informando o que aconteceu, quem fez, onde, como, por quê.

Finalmente, a nossa missão política. Nós, jornalistas, só podemos exercer plenamente nossa profissão em ambiente de liberdade. Qualquer tentativa de suprimir a liberdade é uma agressão à profissão e, pessoalmente, a cada um de nós. Deve ser denunciada e resistida com todos os recursos de que dispomos. Como ensina o grande libertador paulista Gofredo da Silva Telles. ?Sempre a liberdade. Haverá algo mais importante do que ela? Tenho para mim que dela depende a definição do homem.?

Espero que as minhas palavras ajudem os jovens a caminhar na profissão.”

 

JORNALISMO EM LIVROS

“A história escrita nas redações”, copyright Jornal da Tarde, 18/08/02

“Os jornalistas Moacir Japiassu, José Alencar, Olavo Luz, José Maria Mayrink, Lourival Sant?Anna, Luís Edgar de Andrade e Villas-Bôas Corrêa narram em livro, cada um, os encontros e os fatos históricos que relatam como repórteres

Eles passaram por algumas das mais importantes redações do Brasil. Dessa experiência e dos encontros com personalidades ou testemunhas de acontecimentos históricos importantes, retiraram material que julgavam merecer um meio menos perecível que as páginas dos jornais e revistas.

Os autores – José Maria Mayrink, Lourival Sant?Anna, Olavo Luz, Moacir Japiassu, Luís Edgar de Andrade, Villas-Bôas Corrêa e José Alencar – chegam às livrarias cada um com uma obra diferente moldada em diferentes experiências.

Luís Edgar de Andrade e Moacir Japiassu privilegiaram os relatos ficcionais.

Andrade com um romance passado na Guerra do Vietnã, que o jornalista cobriu num dos piores momentos do conflito. Japiassu retomou uma história antiga que publicava em capítulos num jornal paulista e escreveu um folhetim, cheio de peripécias e personagens.

Luz preferiu retratar a vida de um dos mais importantes personagens da vida pública brasileira, o economista, ministro e senador Roberto Campos, de quem foi assessor nos últimos anos.

Villas-Bôas e Alencar passam a limpo a larga trajetória na reportagem. O primeiro relembra mais de 50 anos como repórter e colunista político, que acompanhou o poder desde o governo de Eurico Gaspar Dutra. Alencar, com muito bom-humor, narra como a sorte e o faro foram determinantes para suas melhores matérias.

Mayrink e Sant?Anna integram a ?Coleção Vida de Repórter?, em que jornalistas contam suas experiências. Mayrink optou por suas memórias, que abarcam 40 anos de profissão, enquanto Sant?Anna refaz seu caminho como correspondente no Afeganistão depois dos atentados do dia 11 de setembro nos Estados Unidos.

Moacir Japiassu, autor de ?A Santa do Cabaré? (Globo, 257 págs., R$ 26) foi para o interior depois de décadas de profissão. Lá retomou um antigo romance-folhetinesco cuja trama rocambolesca se passa no Nordeste.

O making off das grandes matérias

As mais de quatro décadas de atividade jornalística de José Maria Mayrink, que trabalha como repórter especial do jornal O Estado de S. Paulo, estão resumidos no livro que escreveu para a coleção ?Vida de Repórter?, da Geração Editorial (256 págs., R$ 25). No texto, Mayrink detalha o making off de suas melhores reportagens, muitas delas agraciadas com prêmios jornalísticos.

Retrato raro de Roberto Campos

Olavo Luz conheceu Roberto Campos quando trabalhava no ?Jornal do Brasil?. Tornou-se amigo e assessor do economista, que morreu no ano passado. Em ?Retrato Pouco Falado? (Ed. Campus, 180 págs., R$ 20) revela a intimidade de Campos.

Romance de um repórter no Vietnã

Luís Edgar de Andrade foi correspondente de guerra no Vietnã. Em 1968, um dos anos mais sangrentos do conflito, Andrade esteve na selva ao lado de outros colegas de várias partes do mundo. De volta, ele resolveu escrever um romance – ?Bao Chi, Bao Chi? (Objetiva, 230 págs., R$ 29) – no qual muitos fatos e personagens são reais. Bao Chi é o termo, em vietnamita, que designa a imprensa.

A história do País vista dos bastidores

Um dos jornalistas mais experientes do Brasil, Villas-Bôas Corrêa finalmente coloca seus mais de 50 anos de profissão em livro. Em ?Conversa com a Memória? (Objetiva, 284 págs., R$ 36,90) o colunista político revela os bastidores do poder brasileiro, desde o governo de Eurico Gaspar Dutra até os anos de FHC, Villas-Bôas passeia pela a história do País cheio de informações.

Com os talebãs depois de setembro

Lourival Sant?Anna, repórter especial do Estadão, foi um dos raríssimos jornalistas do mundo a entrar no Afeganistão após os atentados do dia 11 de setembro nos EUA. Detalhes dessa aventura, ao lado de um guia e intérprete afegão, estão em outro livro da série ?Vida de Repórter? (264 págs., R$ 25), da Geração. Sant?Anna esteve a 100 km de Kandahar, sede dos talebãs

Jornalista precisa de muita sorte

José Alencar reuniu em ?Muita Sorte & Pouco Juízo? (Ateliê Editorial, 192 págs., R$ 20) 30 anos de jornalismo, passando por 40 redações. No livro ele conta os bastidores de suas maiores reportagens, com muito humor.”

 

MÍDIA SEM MÁSCARA

“Novo site quer reunir liberais”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 14/08/02

“Está no ar desde a semana passada o site Mídia Sem Máscara, idealizado pelos jornalistas Olavo de Carvalho e Diego Casagrande. A página é um empreendimento praticamente familiar e conta com o apoio de um punhado de colaboradores e articulistas, todos eles sem espaço na grande imprensa, hoje como sabemos sob severo controle esquerdista no Brasil.

Para esclarecer a linha editorial e os objetivos do MSM, publico abaixo entrevista com a editora-chefe do site, Maria Inês de Carvalho, filha do Olavo:

Sandro Guidalli – O que motivou a criação do site?

Maria Inês de Carvalho – Em primeiro lugar, o fato de não haver nenhum veículo com as mesmas propostas (seja impresso, televisivo ou virtual) num país que precisa disso como nenhum outro. Só para dar um exemplo, os Estados Unidos têm o Media Research Center, um projeto de quase vinte anos cujo propósito é parecido com o nosso, embora muito mais amplo. O Media Research se tornou profissional: hoje, vende conteúdo para a FOX Television, e isso mudou a cara da mídia norte-americana.

Em segundo lugar, a completa ausência de vozes liberais e conservadoras na influência da opinião pública. Hoje, Ciro Gomes é o candidado da ?direita?, mas é de uma direita imaginária, fictícia, criada. A direita real no Brasil faz uma falta tremenda. O primeiro debate entre os presidenciáveis, transmitido pela TV Bandeirantes, mostrou a quem quis enxergar que não há mais debate político neste país: o que há é uma opção generalizada pela esquerda, e direita é uma categoria inexistente.

Não há mais divergência. Hoje o que você vê é o Lula brigando com o Garotinho para ver quem dos dois é mais ?puro? e fiel aos princípios da esquerda. E o pior é que é esse tipo de castidade que o povo brasileiro tem buscado. Quando não busca a castidade, então, é pior ainda: busca o ?centro?, acreditando ingenuamente que ele exista. Então busca José Serra, Ciro Gomes. Mas nós sabemos que esse centro é uma das máscaras mais felizes que já se inventaram na história deste país. E veja: não somos idiotas de achar que esquerda é só PT. Quando falamos em esquerdismo, nos referimos a todo o establishment da mídia, da política, da economia. Os poucos anti-esquerdistas que existem não têm voz política, e nem jornalística.

Em terceiro lugar, o fato de que, há algum tempo, muita gente das mais distintas áreas de atuação começou a enviar aos nossos editores artigos e matérias absolutamente relevantes, em sua maioria não veiculados em lugar algum, senão em seletas listas de e-mail. Tínhamos conteúdo para preencher esse espaço, e então a urgência de abri-lo ficou evidente. Se isso não acontecesse agora, era capaz de não ter acontecido nunca.

SG – Qual é a linha editorial do site?

MI – A preferência será dada aos artigos e matérias que tratem os assuntos de maneira mais direta, citando inclusive as fontes consultadas. Isso porque o site é também de crítica, mas pretende, acima de tudo, ser um ?media watch?.

SG – O Brasil tem um ?media watcher?, organizado pelo veterano jornalista Alberto Dines. Qual será a diferença entre o MSM e o Observatório da Imprensa?

MI – Ao que me parece, o Observatório da Imprensa cumpre satisfatoriamente seu papel. Recentemente, aliás, mostrou que sabe ser efetivamente pluralista ao publicar artigos de Alceu Garcia, Percival Puggina e o manifesto iniciado pelo prof. Denis Rosenfield (os três, aliás, colaboradores do Mídia Sem Máscara). O que falta ali é uma fiscalização mais severa desde o ponto de vista ideológico, que é o ponto crucial hoje em dia, pois as distorções da mídia não são em geral causadas por pura incompetência ou por interesses comerciais das empresas, e sim pelo viés ideológico imperante nas redações – e isto o Observatório não quer ver. No fundo, me parece que o próprio Observatório observa a imprensa com olhos de esquerda, ou seja, tendo como padrão princípios da ideologia esquerdista, o que não é nenhuma novidade, pois se tornou absurdamente generalizado em nossa imprensa.

Os valores liberais e conservadores não são ali representados, e o que diferencia o Mídia Sem Máscara é precisamente isso: é um veículo que se propõe a dar lugar a vozes que têm sido caladas. A liberdade de imprensa subsiste para nós como princípio, e princípio, como sabemos, não é retórica. Não temos aquele papo de liberdade como ética: nossa liberdade é liberdade sem rabo preso. Daí também não querermos nos envolver com patrocínios, que podem por vezes representar gravíssimas restrições.

SG – Por qual ângulo ou aspecto os colaboradores do MSM irão analisar a mídia?

MI – O problema para nós não é a mentira em geral, e não nos propomos a fazer análise minuciosa, tecnicamente correta e completa de tudo o que há de podre em nossa mídia. Seria uma causa muito ampla, para a execução da qual não teríamos como captar recursos, ao menos não neste momento. Dada essa escassez, foi necessário estabelecer um alvo, uma meta que restringisse os objetivos, mas não o impacto que queríamos causar. Nesse momento, decidimos que a atenção se concentraria na propaganda esquerdista, nesse viés que está em toda parte, em tudo, mascarado ou não. Nossa prioridade é desmascará-lo e a todas as suas manifestações, presentes e sobretudo passadas. A intenção é, portanto, contar a história que não foi contada; a história que foi omitida e censurada pela nossa imprensa.

SG – Quem sustenta o MSM? Existe um modelo de negócio?

MI – Somos uma família de classe média e, mesmo sem muito dinheiro, custeamos tudo. O Mídia Sem Máscara não é subsidiado por empresas, bancos nem fundações: é sustentado apenas por nossa família e por amigos que compreenderam e compartilharam de nossa causa. Embora tenhamos uma série de restrições no que diz respeito a patrocínios, aceitaremos colaborações informais, num futuro próximo, tendo em vista a assinatura de jornais e revistas nacionais e estrangeiros, o que passará a ser indispensável para a execução de um bom trabalho.

Os banners, principalmente os animados, poluem o ambiente da tela, e por isso serão preferencialmente evitados. O site procurará manter seu formato atual, bem limpo e sem anúncios. É claro que, se a situação ficar difícil, esse será um expediente a que recorreremos antes de acabar com o site. Preferiremos corrompê-lo a extingui-lo: o mais importante é mantê-lo funcionando, mesmo que feio, se preciso for. Mas creio que isso não será necessário, graças a Deus, dada a boa receptividade que o site tem tido.

SG – Quais os critérios usados na escolha dos colaboradores?

MI – Em primeiro lugar, nossos colaboradores estão todos preocupados com o estado de calamidade da mídia nacional. Não conseguem mais ler jornal ou assistir TV com naturalidade, tamanha a estupidez que encontram em toda parte. Um colaborador do Mídia Sem Máscara precisa estar atento a esse tipo de jogo. Uma pessoa que acha que está tudo normal e que esse é o curso natural das coisas não serve. Cumpridos os critérios mencionados, o que determina a participação de uma pessoa é sua vontade de se juntar a nós.

SG – Então qualquer jornalista que se sentir afinado com o MSM poderá colaborar?

MI – É claro. Nesse caso, ele deve mandar um pequeno currículo e alguns artigos para o exame dos editores.

SG – Existe uma meta de usuários a ser obtida ao longo de certo tempo?

MI – Existe já um número bem grande de assinantes em nossa newsletter. Dá para perceber que há um genuíno interesse por grande parte de nosso público. Não saberia te dizer exatamente – isso seria predizer o futuro, coisa que não sei fazer -, mas creio que, com o sucesso que o site tem demonstrado, não será difícil termos um mailing de cinco mil endereços dentro de três ou quatro meses.

SG – Para finalizar, o MSM tem como característica o fato de reunir pessoas que escreviam separadamente, em várias publicações ou em listas de discussão. O MSM tem como meta tornar-se ?a? referência de verdadeiro ?media watcher? na Web brasileira?

MI – De fato, esse é o nosso maior trunfo. A primeira prioridade do MSM será exatamente essa: reunir toda a comunidade liberal e conservadora do país, que não consegue espaço nenhum na mídia, ou consegue fragmentariamente, limitadamente, e mesmo assim com dificuldades. Até meu pai, que já rompeu uma série de barreiras, tem sofrido uma censura sistemática nessa imprensa que se pavoneia de ser ?livre?. Gostaríamos de não ser ?a? referência de verdadeiro ?media watcher?, a única referência, mas o fato é que, sem fazer esforço, já somos o único site brasileiro na categoria.”