Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Notas sobre A síndrome da antena parabólica, de Bernardo Kucinsky

Alberto Dines

 

O

livro de Bernardo Kucinsky A síndrome da antena parabólica: ética no jornalismo brasileiro (São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, 1998) é, na realidade, uma coleção de trabalhos jornalísticos. Critica da mídia em cima da bucha. Apesar de professor da ECA-USP, não se deixou seduzir pelo caminho fácil das reflexões teóricas e indolores. Põe o dedo nas feridas. Diz as coisas como elas são, dá nome aos bois.

Anotei algumas injustiças que gostaria ajudar a corrigir:

À página 77 está dito que o projeto liberal de Cláudio Abramo deu à Folha a página três, de debates e idéias, e um papel proeminente na abertura democrática. Na minha opinião, mais importante do que a criação da página três foi a da página dois, pouco antes – ela marcou efetivamente a virada da Folha e também do jornalismo diário. A Folha não tinha opinião nem página de opinião. A não ser um comentário político diário de Rui Lopes, chefe da sucursal de Brasília, que saía sem página determinada, num box, perto do noticiário. Cláudio pensava em restabelecer a tradição do jornalismo de opinião, bem escrito e forte. E conseguiu através da Dois. Sua criação teve grande impacto, mostrou que aquela era uma outra Folha. Deu enorme mexida dentro e em volta do jornal porque os articulistas contratados dispuseram-se a dizer o que não se dizia na grande imprensa. Todos os jornais tinham suas páginas de opinião mas a Dois da Folha foi um estrondo. Em outra ocasião contarei todos os detalhes do episódio. Alguns divertidos. Por ora, vale dizer que o diretor do jornal era o Boris Casoy, que sequer foi consultado. A Três foi uma conseqüência natural, saiu fácil porque no Brasil não existia a “op-ed page” (página oposta aos editoriais). Quando a concorrência viu o que a Folha havia feito correu atrás para copiar. Aliás, foi a primeira de uma série de imitações da Folha e talvez a mais salutar.

À página 89, no capítulo sobre Paulo Francis, Kucinsky menciona que foi editor-assistente de Senhor, a melhor revista produzida no Brasil, dirigida por Luiz Lobo e Newton Rodrigues, etc. Francis foi editor-assistente mas Senhor, certamente a melhor revista cultural que já tivemos, foi criada e dirigida por Nahum Sirotsky. Em fases posteriores teve outros proprietários e diretores. Luiz Lobo, Newton Rodrigues, assim como Francis (e outros), tiveram destacada atuação na equipe organizada e comandada por Sirotsky.

Numa próxima edição Bernardo Kucinsky deveria esmiuçar algumas passagens da maior importância que aqui apenas aflorou. Exemplo: o grupo de jornalistas em torno de Golbery. E a greve de 1979 – ela foi a alavanca para a fundação da ANJ e a construção do modelo de jornalismo e de empresa jornalística que agora está falindo.