Thursday, 02 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

O conflito nas TVs árabes

ISRAEL-PALESTINA

O mundo árabe nunca viu algo assim. Tanto em canais privados quanto nos estatais, de noticiários a programas religiosos e esportivos, a causa palestina invadiu a TV. "Há um fluxo de informação constante agora, sempre da mesma perspectiva", diz o especialista em mídia árabe Hussein Y. Amin, da Universidade Americana no Cairo. "Está na mídia nacional, local, via satélite. A cada segundo, há novas notícias e uma única mensagem: solidariedade com os palestinos."

Segundo Tim Golden [The New York Times, 16/4/02], a cobertura televisiva tem sido um fator crucial de incentivo ao ódio contra Israel e seus aliados, em especial os Estados Unidos. Mas é também um sinal de que as coisas estão mudando na região: mesmo os líderes mais autoritários parecem incapazes de abaixar o volume destes canais.

Analistas de mídia comparam o impacto da história sobre as TVs árabes à cobertura da Guerra do Vietnã, que abalou os americanos na década de 60. Embora a violência hoje não ultrapasse a das guerras árabe-israelenses de 1967 e 1973 ou a invasão do Líbano por Israel em 1982, a atual ofensiva está entrando nas casas árabes, o que aumenta a hostilidade há muito existente.

O jornal Jerusalem Post (19/4/02) reclama que jornalistas ocidentais, "auto-intitulados guardiões da verdade", são rápidos para relatar fantasias, mas menos ligeiros ao corrigi-las. Como exemplo, os correspondentes se mostram dispostos a aceitar sem questionamento a versão palestina de que houve um massacre em Jenin, transformando o campo em peça de propaganda contra Israel.

Segundo o jornal, as forças israelenses e grupos independentes de ajuda teriam encontrado um número total de mortos de "apenas" 40, bem longe das 500 vítimas declaradas por palestinos. O Post explica que o Estado tomou todas as medidas possíveis para minimizar os danos contra a população civil: "Os soldados, sob grande perigo, conduziram buscas por armas e suspeitos casa por casa, uma tática que sem dúvida contribuiu para a morte de 13 deles em um dia." E lembra: "Israel poderia facilmente ter jogado sua força aérea sobre os guerrilheiros palestinos, transformando Jenin em estacionamento, da mesma maneira que os EUA parecem ter feito com vilarejos no Afeganistão." Mas isto causaria muitas mortes civis, algo que as forças israelenses "procuram evitar a todo custo".

A matéria prossegue afirmando que os repórteres, ao contarem a versão dos palestinos, não inspiram confiança na qualidade de jornalismo que praticam. "Objetividade e parcialidade são mais do que apenas apresentar os dois lados da história. Quando um é flagrado mentindo, é dever da mídia responsável dizer isto. Até agora, a maioria da mídia ocidental falhou nesta tarefa básica."

"Eu cobri o Oriente Médio durante a guerra. Cobri durante a paz. Mas agora cubro a guerra depois da paz, e é um mundo totalmente diferente… Estou desorientado… Sem fala. Não sei o que pensar."

Palavras de Thomas Friedman, comentarista do New York Times especializado em Oriente Médio e vencedor de três Prêmios Pulitzer. Em entrevista a Alicia Mundy [Editor & Publisher, 19/4/02], o colunista que virou referência no assunto para leitores e líderes mundiais, repetiu a palavra "desorientado" muitas vezes, para descrever jornalistas, diplomatas e a si mesmo.

A boa notícia é que ele acha que a maioria dos jornais está cobrindo o conflito de forma objetiva. A má é que é difícil determinar, neste ponto, o que objetividade significa. "Você sempre encontra exceções, inclinando para um lado ou para outro, mas de forma geral, lendo os grandes jornais e revistas, sinto que estamos recebendo uma visão honesta e justa do que está acontecendo."

Friedman acha que a nomenclatura e a linguagem são verdadeiros campos minados à espera de editores e repórteres pressionados pelo prazo de fechamento. E a maioria dos jornais não dá espaço para que os jornalistas expliquem os fatos complexos que levaram à crise atual, como o tradicional ódio árabe a palestinos e israelenses.

O comentarista recorre a especialistas para perguntar se acertou nos textos: sua fonte mais freqüente é Stephen Cohen, acadêmico do Fórum de Política Israelense em Nova York. Friedman se pergunta, por exemplo, se não está sendo duro demais com os palestinos; no entanto, diz acreditar que existe um eleitorado israelense a favor do Estado Palestino, e não vê o mesmo ocorrer do outro lado. Para Mundy, é uma ironia que ele tenha recebido o primeiro Pulitzer, em 1983, justamente pela cobertura da destruição dos campos libaneses de Sabra e Chatilla, comandada por Ariel Sharon.