Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

O Estado de S.Paulo


“Passados oito meses do início das negociações com as redes de televisão, o secretário nacional de Direitos Humanos, José Gregori, continua acreditando que as emissoras estão dispostas a melhorar a qualidade da sua programação. Em nome da teórica boa vontade da TV aberta, freqüentemente desmentida pelo baixo nível de certos programas que, diariamente, constrangem os telespectadores, o governo prorrogou o prazo até 20 de setembro para que as emissoras apresentem seus manuais de qualidade. A intenção da Secretaria Nacional de Direitos Humanos é que a partir daí as emissoras levem em consideração os princípios de respeito à ética, à dignidade humana e de cumprimento aos objetivos culturais e educativos na elaboração de sua programação.

As emissoras deveriam ter apresentado a proposta dos seus códigos de qualidade no começo deste ano, mas, de fato, não o fizeram. Mesmo assim, em recente entrevista no programa Roda Viva da TV Cultura, o secretário José Gregori afirmou que a receptividade por parte das emissoras ao seu projeto de qualidade para a TV é boa. O senador Pedro Simon, também presente ao debate do Roda Viva, fez uma autocrítica em nome do Congresso que, a seu ver, nada tem feito para que as emissoras respeitem as normas estabelecidas pela Constituição sobre a responsabilidade social da televisão.

Na verdade, o novo prazo para a entrega dos manuais de qualidade é mais um capítulo de uma novela que se arrasta há anos. Do seu enredo já participaram vários ministros, parlamentares e representantes da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). Em março deste ano o Grupo TVer, criado pela sexóloga e ex-deputada federal Marta Suplicy para estudar sugestões para mudar a orientação das emissoras, encomendou pesquisa à empresa CPM Market Research. Constatou-se, então, que 71% das 842 pessoas ouvidas das classes A, B, C e D, entre 14 e 39 anos, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, acham que o governo deve intervir de alguma forma na programação da TV. O recado da pesquisa foi muito claro: a maioria moralmente sadia da sociedade brasileira está indignada com as conseqüências da guerra de audiência entre as principais redes de televisão. Curiosamente, o conteúdo do Jogo Aberto, o novo programa da ex-parlamentar na TV Bandeirantes, tem apresentado um tom e algumas temáticas que o aproximam do formato apelativo de certos talk shows que têm sido duramente criticados pelo Grupo TVer.

A contradição de alguns e a tibieza das autoridades têm criado a sensação de que se assiste a um jogo de faz-de-conta. De fato, o problema não está na falta de instrumentos, mas na sua ineficácia. Levantamento feito pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa, ligado ao Ministério da Justiça, mostra que é farta no País a legislação referente à exploração, por emissoras de rádio e televisão, de situações degradantes, violência, abuso sexual, racismo e outras formas de discriminação. Entre estatutos, códigos, leis e decretos, existem 11 mecanismos de defesa à disposição do telespectador ou de entidades representativas das emissoras contra abusos da TV e da radiodifusão. O problema, insistimos, não reside na escassez de mecanismos, mas na falta de vontade de acioná-los.

Está na hora de dar um basta nesse jogo de faz-de-conta. Trata-se, tão-somente, de implementar o que já está previsto no artigo 221 da Constituição. A norma constitucional, no seu inciso IV, determina que a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão deverão atender ao princípio do ‘respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família’. A proteção dos valores morais, sem os quais a sociedade entra em decomposição, não pode ser confundida com procedimentos censoriais. É, apenas, um ato de legítima defesa da sociedade. Afinal, a democracia, sistema que mais genuinamente respeita a dignidade humana, reclama a preservação desses valores.

Não cabem mais procedimentos dilatórios num quadro de tamanha gravidade.”

“Mais um capítulo da novela da TV”, Editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 24/8/99

 

“A televisão é o maior e o mais veloz instrumento formador de opinião no Brasil e isso só amplia a responsabilidade de quem dirige e produz televisão no País. Dados demonstram que a televisão de canal aberto atende hoje, principalmente, às classes C, D e E. Mas ao contrário do que se esperava, ela traz para sua programação o conceito de que a arte imita a vida, mostrando um verdadeiro mundo cão na TV. Isso tem comprometido significativamente seu papel social que é funcionar como um elemento de transformação da sociedade.

Vale lembrar que programas que não contribuem para a formação da cidadania, que utilizam crianças de forma indiscriminada e cometem outros excessos conhecidos, não são exclusividade brasileira e batem recordes de audiência tanto no País quanto no exterior. É um fenômeno de mídia existente em vários países e que tem no lucro seu objetivo fundamental. Apesar de ter compromisso exclusivamente comercial, esses programas têm público. A TV que comove, que choca e que apela para o sentimentalismo das pessoas, muitas vezes abusando da fragilidade de outras, infelizmente, tem seu lugar. E surge então outra provocação para o debate: as emissoras de televisão devem oferecer ao espectador o que ele quer ver ou o que deveria ou precisaria conhecer?

Torna-se necessário enfatizar que a televisão é uma concessão pública e o que se espera dos detentores dessa concessão é o exercício da vocação pública, ou seja, da promoção da cidadania e da qualidade de vida. Finalidade essa já praticada pelas emissoras públicas, as chamadas TVs Educativas.

Um importante passo para a afirmação do papel público da televisão foi a transformação da TVE Brasil (Rio) em uma organização social. Atento à necessidade de fortalecimento das emissoras públicas no Brasil, o governo federal apresentou uma solução dentro de sua reforma de Estado. A aprovação da Lei Federal 9.637 (publicada em 18 de maio de 1998) possibilitou a criação das organizações sociais – um novo modelo em que a empresa tem caráter público, lógica e práticas de empresa privada para mais bem desempenhar sua missão estratégica. A Associação de Comunicação Educativa Roquette-Pinto (Acerp), mantenedora da TVE, é a primeira experiência prática nesse sentido, saindo do assistencialismo e da subordinação ao governo para tornar-se uma empresa privada, prestadora de serviços públicos, com missão e metas definidas em contrato de gestão, administração autônoma, responsabilidade e, principalmente, gestão por meio de um conselho de administração, integrado por representantes do Estado e da sociedade civil. Outro passo decisivo foi a formação da Rede Pública de Televisão (RPTV), a partir da integração entre a TVE e a TV Cultura de São Paulo, atingido um universo de 938 emissoras em todo o País. Uma televisão pública que contempla a diversidade cultural brasileira, voltada à ampliação do acesso à informação, à inclusão social e ao exercício do papel público de formar cidadãos livres e independentes, é a alternativa legítima para as redes comerciais de canal aberto. Exatamente por isso, as classes C, D e E respondem por aproximadamente 80% da audiência da TVE. Para atender a esse novo perfil de telespectador, as TVs públicas ratificaram a necessidade do estabelecimento de um código mínimo, um parâmetro ético para definir suas programações. Desde abril, a RPTV tornou público o conjunto dos dez princípios éticos que sempre nortearam a produção e exibição de seus programas, antecipando-se às TVs comerciais. Não temos dúvida de que, mais cedo ou mais tarde, esses novos cidadãos brasileiros saberão também cobrar a parte de responsabilidade social que cabe às demais emissoras de TV.”

“Informação e responsabilidade social”, copyright O Estado de S. Paulo, 14/9/99

 

“A televisão é um fenômeno da segunda metade do século 20. Ela surge num momento de crise dos paradigmas democráticos, fortemente abalados pela ascensão do nazi- fascismo e rigorosamente confrontados com as promessas de bem estar social gerada s pelo estado soviético. A guerra retardou por alguns anos a consolidação da TV como veículo de comunicação de massa hegemônico, especialmente na Europa. A BBC, por exemplo, que foi ao ar pela primeira vez em novembro de 1936, ficou sem transmitir durante quase sete anos por causa da guerra. Ela saiu do ar no dia 1o de setembro de 1939, quando vinte mil residências já possuíam aparelhos de televisão em Londres e só voltou a operar no dia 7 de junho de 1946 (LEAL FILHO, 1997: 48).

A democracia, com alguns sustos e percalços, consolidou-se em grande parte do mundo. A idéia da divisão dos poderes e do permanente controle operado entre eles está na base do regime. Há democracias com forte participação popular e efetivo controle social e há outras que funcionam apenas de forma aparente. De qualquer mo do, umas e outras, buscam se legitimar pela idéia roussoniana da soberania absoluta da maioria, com todos os cidadãos tendo direito de voto e, através dele, a capacidade de controlar os poderes constituídos. E a democracia liberal burguesa em pleno funcionamento.

Quando esse sistema de organização política estava se recuperando de um conflito armado que quase lhe destrói as bases, surge, cresce e se consolida um novo poder, paralelo aos três poderes clássicos. E a televisão ocupando um enorme espaço político e impondo sua agenda a toda a sociedade. No dizer de POPPER (1995:29), A democracia consiste em submeter o poder político a um controle. E essa a sua característica essencial. Numa democracia não deveria existir nenhum poder político inconsolado.

Ora a televisão tornou-se hoje em dia um poder colossal; pode mesmo dizer-se que e potencialmente o mais importante de todos, como se tivesse substituído a voz de Deus’. E quanto mais frágil a democracia, mais forca possui a televisão. No caso brasileiro, os exemplos de interferência da TV – particularmente da Rede Globo – no processo democrático se multiplicam. Desde o apoio incondicional a ditadura militar , passando pelas tentativas de manipulação das apurações nas eleições para governador no Rio de Janeiro em 1982 e pela edição fraudulenta do debate Collor-Lula em 89, até a divulgação de pesquisas desatualizadas às vésperas do primeiro turno das eleições para o governo de São Paulo, em 1998, a televisão tem procurado modificar segundo seus objetivos os resultados do jogo democrático, quase sempre com sucesso.

As muitas faces da TV

Mas a televisão, com suas múltiplas faces, não e um fenômeno que permita análises fáceis e definitivas. Como lembra DAHLGREN (1995:24) a TV assemelha-se a um prisma, do qual vemos e entendemos alguns lados, mas não todos ao mesmo tempo. No caso deste artigo estamos tratando da televisão como indústria e fenômeno sociocultural. São duas faces do prisma que nos remetem a questão do controle e do financiamento da televisão. Ou de forma mais simples a idéia corrente de que quem paga controla e ao controlar, determina os padrões da programação, o seu ritmo, sua organização, impondo, por exemplo, uma absoluta falta de limites entre jornalismo, publicidade e relações públicas.

Mas porque deve ser assim? Não é possível desvincular o financiamento do controle Para responder essas questões é necessário recorrer ao conceito de serviço público. E ele que vai impor limites ao poder absoluto que o concessionário de um canal de televisão tem sobre o conteúdo da programação. A idéia do rádio – e depois da TV – como serviço público e dos anos 20 e localiza-se na Europa Ocidental. Foi a forma encontrada para evitar, ao mesmo tempo, o comercialismo que já tomava conta do rádio norte-americano e o estatismo soviético.

O objetivo era manter o rádio independente tanto dos negócios, como da política. E para isso só havia uma forma: cobrar licença de uso dos radiouvintes, prática que se mantém até hoje em vários países europeus, estendida para a televisão. No Brasil, embora o rádio tenha surgido com a pretensão de ser instrumento de cultura e ciência, numa das expressões do seu fundador, o antropólogo Edgard Roquette Pinto, ele logo se comercializou, levando a TV a seguir no mesmo rumo. Só com a Constituição de 1998 e que idéia do serviço público no broadcasting brasileiro aparece de forma clara. Em seu artigo 223, a Carta diz que deve haver um ‘princípio de complementariedade dos sistemas privado, público e estatal’ de rádio e teledifusão. Mas da letra a pratica a distância e grande. Cidadania e cultura

O conceito de serviço público, tal como foi formulado na Europa Ocidental pressupõe o atendimento de necessidades fundamentais da população. Dessa forma, os serviços de rádio e televisão se equiparariam aos de água, telefone, energia ou correio, por exemplo. E teriam duas vertentes básicas: a referente a cidadania, procurando elevar as condições de participação dos cidadãos na vida democrática e a da cultura servindo como disseminadora da riqueza lingüística, espiritual, estética e ética de povos e nações (LEAL FILHO, 1997:18).

Para executar com autonomia esse serviço público, as emissoras devem manter distância das interferências do Estado e dos negócios. Por isso, em praticamente todos os países da Europa Ocidental, parte do financiamento das emissoras de televisão vem da taxa cobrada dos telespectadores. Ao mesmo tempo em que essa cobrança garante a autonomia das emissoras, ela estimula também o telespectador a exigir qualidade dos produtos que recebe em casa. Os mecanismos existentes para o exercício desse controle variam de país para país. Na Franca, por exemplo, a responsabilidade cabe ao Conselho Superior de Audiovisual, formado por nove membros, indicados pelo Presidente da República, pelo presidente do Senado e pelo presidente da Assembléia Nacional; na Itália existe o ‘Gerente della Editoria’, uma espécie de defensor publico nomeado pelo Parlamento, alem de um código de auto-regulamentaçao implantado recentemente; no Reino Unido a tarefa e dividida entre os Conselhos Diretores da BBC e da Televisão Independente, que contam com o controle externo de uma Comissão criada pelo Parlamento com mandato para acompanhar o nível das programações e servir de canal de comunicação entre os telespectadores e as emissoras, encaminhando críticas e sugestões. Além disso, pelo fato de se constituir num serviço público, a televisão tem a obrigação de oferecer programações diversificadas e complementares.

Um anti-exemplo clássico e dado por um jogo de rugby transmitido simultaneamente por oito emissoras de televisão de uma mesma região dos Estados Unidos (SENDALL ,1982). No Brasil, ocorre a mesma coisa. Quando uma emissora comercial encontra uma formula de sucesso, com grande audiência, logo e copiada pelas concorrentes, tirando do telespectador qualquer tipo de escolha. Se no entretenimento essa pratica leva a rotina e a monotonia das ‘escolhas iguais’, no jornalismo cria situações de unanimidade, perigosas para a vida democrática. Argumentos fracos

O argumento de que as programações são determinadas pela audiência e falacioso. Ao buscar índices cada vez mais elevados de audiência as emissoras estão apenas oferecendo produtos para serem consumidos no mercado. Ao mercado, por definição, só se oferece o que e vendável. E quem disse que só o que e vendável tem qualidade? Existem inúmeros produtos culturais valiosos que não são oferecidos aos telespectadores apenas por não encontrarem espaço no mercado. E mais, ‘pode-se e deve-se lutar contra o índice de audiência em nome da democracia. Isso parece muito paradoxal porque as pessoas que defendem o reino do índice de audiência pretendem que não ha nada mais democrático (…)

O índice de audiência e a sanção do mercado, da economia, isto…é, de uma legalidade externa e puramente comercial(…) A televisão regida pelo índice de audiência contribui para exercer sobre o consumidor supostamente livre e esclarecido as pressões de mercado, que não tem nada da expressão democrática de uma opinião coletiva esclarecida, racional, de uma razão pública, como querem fazer os demagogos cínicos’ (BOURDIEU, 1997:96). Se essa preocupação já esta presente na Europa, apesar de todos os mecanismos d e controle antes mencionados, no Brasil a falta de um debate mais rigoroso dessas questões leva a demagogia, mencionada por Bourdieu, a limites perigosos. Diretores e apresentadores de televisão, comprometidos com o modelo comercial descontrolado, chegam a considerar o meio absolutamente neutro. Para eles a TV seria apenas um eletrodoméstico e seu papel cultural comparável a uma janela. Dessa forma, o problema estaria na paisagem e não na janela. Como se a televisão não escolhesse entre milhares de paisagens aquelas que, segundo seus critérios, servem para dar mais audiência. Ou pior, não forjasse situações que nem na paisagem estão. São cenas falsas, vendidas como verdadeiras, apenas para atrair espectadores incautos. Aqui vale lembrar o primeiro diretor geral da BBC, John Reith, dizendo já na década de 20 que ‘uma coisa e uma audiência inteligente sendo insultada. Outra coisa e uma audiência que não sabe que esta sendo 7 insultada (CASHMORE, 1994:25).

Outro argumento a favor do descontrole da televisão vem dos fascinados pelas novas tecnologias. Elas nos conduziriam ao melhor dos mundos e isso ocorreria quando , em casa, diante de milhares de ofertas, o telespectador pudesse montar a sua própria programação a partir do seu livre-arbítrio. E até possível que se chegue perto disso nos países do capitalismo central, com baixa concentração de renda e alta taxa de escolarização. Na periferia do sistema a tendência e oposta. A televisão por assinatura esta ampliando o fosso que divide a população minoritária de alta renda, da grande maioria sem recursos para ingressar no mundo do cabo ou do satélite.

No Brasil já é possivel se falar em duas televisões: a dos ricos, segmentada e um pouco mais diversificada e a dos pobres, aberta e monocórdica. As respostas da sociedade A situação chegou a níveis tão dramáticos que começou a provocar anticorpos. A sociedade brasileira, ainda que de forma fragmentada e tímida, tem dado demonstrações de descontentamento com essa situação. Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha revelou que 75% dos telespectadores querem um controle sobre as programações das TVs (Folha de S.Paulo, 9/11/97). Nesse índice incluem-se conservadores ferrenhos, saudosos da censura prévia, e grupos de cidadãos preocupados com a amplitude do poder que as TVs vão adquirindo sobre a sociedade. E preciso ter clara essa diferença, porque os beneficiários do atual modelo gostam de confundir controle democrático com censura, o que não deixa de ser também totalmente falacioso. Hoje quem exerce a censura são os concessionários dos serviços públicos de televisão e seus propostos colocados em cargos de direção. São eles, e apenas eles, que decidem o que a sociedade quer ver e ouvir. Portanto, a luta não e pela volta da censura, uma vez que ela continua existindo. Saiu das mãos da policia e caiu no colo dos ‘donos das emissoras’, como os concessionários gostam de se auto-intitular. São eles que impõem gostos e padrões a grande maioria dos brasileiros. ‘O Brasil se conhece e se reconhece pela televisão, e praticamente só pela televisão, que reina absoluta sobre o público nacional, com um peso muitas vezes superior aos outros veículos’ (BUCCI; 1998:1).

Estima-se hoje em mais de 40 milhões o numero de domicílios com aparelhos de televisão no Brasil (a mais recente Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicilio do IBGE realizada em 1995 indica a existência de 38 ,9 milhões de domicílios com televisão no país). Mas apesar de toda essa forca e dos números de audiência exibidos pelas emissor as, o público mostra-se descontente com o que recebe em casa. Outra pesquisa, realizada com jovens entre 14 e 20 anos, mostra que a maioria rejeita programas que ‘tiram sarro da cara das pessoas’ e afirma que a ‘TV não se preocupa em informar, só em ganhar audiência’.

O mais importante da pesquisa está na revelação de que os jovens mais críticos em relação a TV são os das camadas de renda mais baixas. Só 18% dos que tem renda familiar igual ou inferior a R$ 850,00 gostam de programas que ridicularizam as pessoas e exploram brigas e bate-bocas. Quando a renda sobe para a faixa de R$ 1.600,00 a R$ 2.500,00 o interesse por esses programas passa para 23% e quando chega a R$ 9 3.750,00 ou mais, a aceitação e de 28%. Uma das explicações possíveis para esses números e a percepção que o jovem de renda mais baixa tem da importância da TV com fonte complementar de informação, alem da escola. Por isso ele encararia a televisão com maior seriedade, esperando dela programas que auxiliassem na sua formação, diferente dos jovens de renda mais alta, para os quais a TV e apenas uma forma de lazer e entretenimento. (O Estado de S.Paulo, pág. D1, 17/11/98).

Dados como esses vão formando a base que começa a sustentar o debate em torno d a qualidade da televisão brasileira e da necessidade da criação de mecanismos democráticos de controle sobre sua programação. A tendência observada até aqui e da ampliação constante desse debate em foros distintos: no Parlamento, na Imprensa, nos Colégios e Universidades e em grupos organizados da sociedade civil.

E essa discussão, amparada em pesquisas de opinião e em estudos científicos, que começa a formar a massa crítica necessária para reverter o quadro atual, onde a televisão reina como um poder sem controle.”

“TV, um poder sem controle”, copyright Tver <http://www.tver.org.br>. Laurindo Lalo Leal Filho é sociólogo, jornalista e professor livre-docente da Escola de Comunicação e Artes da USP

 

Bibliografia

Bucci, Eugenio (1997), Em busca dos direitos do telespectador

Observatório da Imprensa <www2.uol.com.br>, 20/1/97.

Bourdieu, Pierre (1997), Sobre a televisão, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor

Cashmore, Ellis (1994), …and there was television, Londres, Routledge

Dahlgren, Peter (1995), Television and the Public Sphere, Londres, Sage 10

Publicações

Folha de S.Paulo, “Maioria quer controle da TV”, Caderno TV Folha, São Paulo, 9/11/97

Leal Filho, Laurindo Lalo (1997), A melhor TV do mundo, São Paulo, Summus Editorial

O Estado de S.Paulo, “Jovens da classe C rejeitam brigas na TV, diz pesquisa”, Caderno 2, página D1, 17/11/98

Popper, Karl e Condry, John (1994), Televisão um perigo para a democracia, Lisbo a, Gradiva

Sendall, Bernard (1982) Independent Television in Britain (Vol. 1) Origin and Foundation, 1946-62 Londres, Macmillan