Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Por que subiu? Por que caiu?

PESQUISAS ELEITORAIS

Rachel Moreno (*)

A estranha magia que os números exercem sobre os compradores de pesquisa estende o seu sortilégio, inexplicavelmente, sobre os editores de jornais ? algo inexplicável, porque a mídia é predominantemente feita de palavras, textos, escritos, lidos ou recitados.

A pesquisa, como sabemos, utiliza-se de duas grandes vertentes metodológicas e das combinações possíveis entre elas: a qualitativa e a quantitativa.

Em anos anteriores, tivemos pesquisa qualitativa eleitoral divulgada pelo jornal a Folha de S.Paulo. Este ano, li e ouvi vários jornalistas e comentaristas respeitáveis declararem publicamente o seu encanto ante a importância e riqueza de informações que a pesquisa qualitativa oferece para a interpretação do cenário eleitoral ? entre eles, nomes como os de Eliane Cantanhêde, Dora Kramer e José Toledo e outros).

Os marqueteiros e candidatos nem precisam falar a respeito: utilizam-na direta e continuamente, para a orientação da campanha eleitoral. Mas essa percepção não parece ter atingido os editores de jornais. E não chegam ao conhecimento do eleitor. Isto porque os editores teriam certo "preconceito" com relação à pesquisa qualitativa, ou consideram-na cara ? embora, na ponta do lápis, seu custo seja infinitamente menor do que uma quantitativa com dimensão de amostra que lhe dê certa representatividade.

Preconceito ou conveniência?

Leio as últimas pesquisas eleitorais divulgadas. O candidato X parou de crescer. Será por causa das acusações feitas sobre a atuação anterior de seu vice? Os responsáveis pela pesquisa são entrevistados. E são cautelosos: "tanto pode ser, como pode não ser". Os jornalistas opinam, categóricos ? foi isto ou foi aquilo.

Um procedimento simples poderia pôr fim ao festival de especulações sobre as causas das mudanças e das instabilidades ? bastaria fazer e divulgar uma pesquisa qualitativa, para entender, a partir do próprio eleitor, os motivos que o levam a mudar sua intenção de voto (quando já a tem definida); ou as razões de sua indecisão, quando não se pronuncia ante a cartelinha com os nomes dos candidatos.

Simples, com certeza. E fundamentado. Não mais especulação, interpretação ou achismos, mas dados, informação e a opinião do próprio eleitor, em nome do qual se tecem tantas teorias e explicações. Uma ação dessas refrearia a especulação e a divulgação de leituras que convenham a fulano ou beltrano, elevadas ao nível de verdade impressa, e magnificaria o trabalho interpretativo correto e necessário de jornalistas e de especialistas.

Ano que vem

A grande vedete do cenário eleitoral deste ano é a especulação, em suas diversas formas. E nada nem ninguém parece interessado em detê-la, ou oferecer-lhe subsídios de realidade, para sua melhor fundamentação.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) finalmente entendeu o mecanismo usado para especulação financeira e posicionou-se claramente a respeito. Passou a exigir o registro das pesquisas encomendadas e se dispõe a acompanhar ? "se houver indício de algum movimento anormal" ? o comportamento da instituição financeira que encomendar alguma pesquisa eleitoral para divulgação pública. E isto porque "a utilização dos resultados de uma pesquisa antes da sua divulgação pode configurar uma prática não-equitativa [vantagem indevida para um participante do mercado]", segundo entrevista publicada pela Folha. No entanto, embora louváveis, tais medidas valem só para quem divulgar os resultados da pesquisa e só poderão vigorar a partir de 2003.

Diante da especulação gerada em torno das interpretações das variações dos resultados eleitorais, os editores continuam alimentando o seu preconceito contra a pesquisa qualitativa. A mídia prefere a magia dos números.

(*) Pesquisadora do Instituto Opinião e presidente da SBPM (Sociedade Brasileira de Pesquisa de Mercado, Opinião e Mídia)