Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Renato Franzini

ELEIÇÕES 2002

“Lula e Serra melhoram imagem após propaganda”, copyright Folha de S. Paulo, 30/08/02

“A percepção que os eleitores têm das imagens que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e José Serra (PSDB) passam na TV melhorou depois do início do horário eleitoral gratuito, na terça passada.

Ao mesmo tempo, a imagem de Ciro Gomes (PPS) apresenta tendência negativa, e a de Anthony Garotinho (PSB), de estabilidade.

Essas conclusões estão no rastreamento feito pelo Datafolha com eleitores que têm telefone fixo -pesquisa que representa a opinião de cerca de 54% do eleitorado e tem margem de erro de três pontos percentuais para mais ou para menos.

Para medir a imagem, o Datafolha criou dois índices: o IIP (Índice de Imagem Positiva) e o IAP (Índice de Aprovação da Propaganda). O IIP mede a imagem que o candidato passa na TV, e o IAP, a qualidade técnica de sua propaganda. Nos dois casos, o nível máximo é 100%.

De acordo com o Datafolha, nos quatro primeiros programas, o IIP de Lula subiu de 31,1% para 35,2% e seu IAP, de 26,8% para 30%. No mesmo período, o IIP de Serra subiu de 25,6% para 28,3%, e o IAP, de 21% para 24,2%.

Já o IIP de Ciro oscilou negativamente de 34,4% para 31,7%, e seu IAP, de 22,7% para 21,9%. No caso de Garotinho, seu IIP passou de 13,7% para 14,8%, e seu IAP, de 10,2% para 11,1%.

O Datafolha ressalta que Serra é o único dos quatro cuja curva de intenção de voto está abaixo de suas curvas de IIP e IAP.

Nas próximas pesquisas, é necessário observar se essa melhora de imagem vai ?puxar? sua curva de intenção de voto, já que existe uma tendência de uma curva estar ?colada? à outra.”

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“Horário na TV perde fôlego e tem queda de audiência”, copyright Folha de S. Paulo, 31/08/02

“A audiência do horário eleitoral gratuito teve uma queda expressiva em sua segunda semana de exibição, indo de um patamar de 40% dos entrevistados para 25%, de acordo com rastreamento telefônico feito pelo Datafolha.

No rastreamento, o instituto faz três pesquisas por semana -sempre nos dias seguintes às exibições dos programas eleitorais dos candidatos à Presidência.

Entre outras questões, o Datafolha indaga se o entrevistado viu alguma das propagandas no dia anterior, seja de dia ou à noite.

Na série de cinco programas até anteontem, o primeiro (exibido no dia 20) e o segundo (dia 22) tiveram audiência de 40%.

No programa de sábado (dia 24), a audiência caiu para 24% -o que é considerado normal para o dia da semana, mas foi agravado por problemas de sincronia entre som e imagem.

A queda se tornou significativa nos programa de terça (dia 26), que registrou audiência de 29%, e quinta (dia 28), de 25%.

Esse movimento pode ter beneficiado o candidato José Serra (PSDB), que iniciou ataques a Ciro Gomes (PPS) já no primeiro programa, com o bordão ?Ciro. Mudança ou problema??.

A resposta mais contundente de Ciro, classificando os ataques de Serra de ?golpes baixos?, veio no sábado, quando a audiência já havia caído.

Como o rastreamento é feito só com eleitores que têm telefone fixo em casa -são cerca de 54% do eleitorado brasileiro-, ele não representa a opinião de todos os eleitores. No caso da pesquisa de audiência, a margem de erro é de quatro pontos percentuais para mais ou para menos.”

“Serra critica ?antecipacionismo? e ?pesquisismo? no processo eleitoral”, copyright JB Online (www.jbonline.com.br), 31/08/02

“Durante a reunião com lideranças do PMDB, na capital gaúcha, encerrada agora à tarde, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, criticou o que chamou de ?antecipacionismo? e o ?pesquisismo? na campanha eleitoral. ?Não que não sejam úteis (as pesquisas) mas determinam tudo o que vai acontecer na política. Assim ficou difícil entender o rumo das coisas?,afirmou. Sobre os resultados das pesquisas de intenção de voto, Serra lembrou o jogador Didi, da Seleção Brasileira de 58, que costumava dizer ?Jogo é jogo, treino é treino?, acrescentando que o ?jogo? começou na semana passada.

Serra garantiu ter ?teimosia? para perseguir os objetivos, tendo uma proposta permanente para que o Brasil seja um país de igualdade de oportunidades. ?Hoje o Brasil tem uma ?direitona?, que reúne o mais antigo e o mais atrasado, e por outro lado, há setores que oferecem as melhores propostas, mas sem experiência ou com experiências malsucedidas?, afirmou, numa referência aos adversários do PPS, Ciro Gomes, e do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.

Na saída do hotel De Ville, em Canoas, a comitiva do candidato José Serra, teve que parar devido a uma perseguição policial. Uma picape estava sendo seguida por seis viaturas da Brigada Militar e acabou batendo em carros que estavam parados em um sinal de trânsito, próximo ao hotel, após tiroteio. Depois do susto, Serra, acompanhado da candidata a vice, Rita Camata, seguiu para o centro de Porto Alegre onde faz caminhada, neste momento.”

“O brilho da lua nas noites de agosto”, copyright Folha de S. Paulo, 31/08/02

“A seriedade quase fúnebre, a calva, as olheiras, os olhos enormes como lâmpadas atarraxadas no soquete. José Serra tem um ar de ?família Addams? que, sem dúvida, dificulta a sua candidatura. A propaganda do candidato tucano sabe disso, e trata com cuidado estratégico da tonalidade de sua maquiagem facial. Na televisão, Serra aparece sorrindo, é claro, enquanto transita pelas fileiras de populares e de apaniguados; em momentos de maior descontração, é quase possível vê-lo ensaiar o simpático gesto do ?barra-limpa?.

Mas esse esforço não se sustenta muito. Nos primeiros programas, Serra apresentava o seu projeto de combate ao desemprego. Alguém decidiu que o nome desse projeto seria ?Segunda-Feira?. Existe algo mais enfarruscado, mais paulistano, mais impopular do que uma segunda-feira?

Ah, não faz mal. O candidato sabe desse problema, e prevê a objeção do eleitor. Diz algo do tipo: sabemos, claro, que segunda-feira é um negócio chato, mas será de alegria para toda pessoa que está procurando emprego e não consegue. O eleitor fica, assim, esclarecido. Mas nada indica que também fique convencido -muito menos interessado ou empolgado.

De alguma forma, o discurso eleitoral de Serra segue um modelo racional-argumentativo. Não sei, é claro, se há lógica ou consistência na promessa de criar 8 milhões de novos empregos. Mas o caso do ?projeto segunda-feira? exemplifica, a meu ver, um jeito ?acadêmico? de raciocinar: o discurso como que absorve a própria crítica. ?Sim, segunda-feira talvez não seja um bom nome, mas mesmo assim decidimos utilizá-lo, já que… etc. etc.?

Imagino que então surge, entre os luas-pretas de Serra, o grito de alerta: temos de emocionar o público, minha gente! Não viram o Lula chorando? Não viram o Lula abraçado a uma estrela de plástico inflável? Não viram o encontro entre Lula e Sarney, como se fosse um trailer de desenho da Disney, aqueles de bichos? Algo como o encontro da marmota esperta com o ursinho cordial? Emoção, meu povo!

Veio então a propaganda de Serra sobre a violência. Foi de assustar. Parentes de vítimas choravam, contando casos trágicos, hediondos, revoltantes.

Qualquer pessoa se solidariza com esses relatos sinceros de sofrimento. Vê-los, entretanto, num programa eleitoral… não será uma tremenda apelação? Mesmo que fosse das próprias vítimas de violência a iniciativa de recorrer a Serra -o marketing foi longe demais.

E foi, de novo, para o ponto de partida: para o visual tenebroso, para o clima de sexta-feira, de uma candidatura sob o influxo de luas-pretas, luas cheias, gritos de arapongas, traições soturnas, paredes que ouvem e punhaladas pelas costas.

Em seu aspecto mórbido, a candidatura do ex-ministro da saúde aponta para um problema. Revela, com honestidade involuntária, uma dificuldade que todos os marqueteiros têm de enfrentar.

É óbvio que nenhum candidato pode ignorar o desemprego, a miséria, a violência. Como conciliar esse diagnóstico com aquilo que se vê no horário eleitoral? As cançõezinhas idiotas, as cenas de infantilização sentimental, a fotogenia flutuante, a câmera lenta mostrando invariavelmente um povo esperançoso e feliz? As sombras não podem ser ignoradas.

E de fato, quem surge depois dessas imagens de sonho é Tuma, é Quércia, é Sarney, e mesmo Médici e Geisel, cujo desassombro no planejamento econômico foi elogiado por Lula. Melhor bater na madeira. (MARCELO COELHO, colunista da Folha, escreve aos sábados)”

“O palanque eletrônico”, copyright Veja, 3/09/02

“Bastou uma semana de palanque eletrônico para jogar por terra uma série de teorias improvisadas sobre as eleições e confirmar o que eu havia dito aqui: que havia três candidatos competitivos e que a campanha só começaria para valer quando a TV entrasse nela. Era óbvio que, logo nos primeiros programas, a propaganda mexeria com as intenções de voto, paradas desde a terceira semana de julho.

Entre as teorias improvisadas, duas não resistiram às primeiras 48 horas de campanha na TV. Uma dizia que o programa eleitoral teria sido esvaziado pela pré-campanha muito longa e pela exposição dos candidatos na mídia, principalmente nos meses de julho e agosto. Como eu havia argumentado, essa exposição, dada sua natureza descontínua e não cumulativa, apenas aguçaria o interesse da opinião pública pela propaganda eleitoral e pelos demais eventos de mídia ligados à eleição. Foi o que se viu.

O ibope da propaganda eleitoral gratuita para candidatos presidenciais foi maior que a audiência de programas líderes do horário nobre, como o Jornal Nacional, que registrou média de 37 pontos na semana de 5 a 11 de agosto, na Grande São Paulo, e de 43 pontos no Rio de Janeiro. O horário político registrou 52 pontos em seu primeiro dia de exibição, 47 no segundo e 45 no terceiro. Maiores que a audiência média da novela das 8, que ficou em 40 pontos, ou que a média alcançada pelo Programa Silvio Santos, de 21 pontos. Para medir a audiência da propaganda eleitoral, é necessário somar os pontos de todos os canais, porque é programa único e simultâneo. Ela dá a extensão do alcance de suas mensagens na opinião pública. Já os programas regulares são concorrenciais, veiculam mensagens alternativas, e suas audiências não podem ser somadas. Durante o mês de setembro, provavelmente a audiência do palanque eletrônico cairá e se recobrará nas últimas semanas de campanha. Foi o que aconteceu nas eleições anteriores, e parece que não será diferente neste ano.

A outra teoria dizia que não daria tempo para muita mudança nos padrões de intenção de voto com a TV. Claro que dá. É que a tese, falsa, se baseou em noções de ?tempo? e ?distância? que não se aplicam às medidas da dinâmica eleitoral. O ?tempo? da campanha não se mede mais em dias, mas em intensidade de exposição na mídia. O palanque decisivo não é físico, é eletrônico. Em alguns anos será virtual. No mundo dos segundos ultra-eficazes da mídia eletrônica, há tempo de sobra para grandes mudanças, em qualquer sentido. Não seria de surpreender se houvesse ainda muitas mudanças, em direções diferentes, até a boca de urna. Isso é o que se chama volatilidade.

Quando se olha a pesquisa espontânea, do Ibope ou do Datafolha, vê-se que os indecisos, incapazes de apontar um candidato de sua preferência, beiram os 50%. Na última pesquisa do Ibope para o Jornal Nacional, eles passaram a 45% – antes eram 49% -, apesar de só entre Ciro e Serra ter havido variação conjunta da ordem de 11 pontos percentuais: a diferença entre eles caiu de 15 para 4 pontos. Ciro saiu de 26% para 21% e Serra de 11% para 17%. Por enquanto, é uma espécie de troca-troca entre candidatos, sem cristalização de preferências nem conversão de intenção em voto. Logo, mais volatilidade que tendência.

Outra coisa: somando-se os índices de Ciro e Serra nos meses de julho e agosto, vê-se que a soma permanece tão estável quanto a simpatia por Lula. É indicação de segundo turno. Lula continua a ter um pólo definido na opinião pública e é o que tem mais votos misturados às intenções de voto. Parece óbvio, mas é significativo: ele é o único dos três que já foi votado para presidente, e sabe seu potencial de votos. Os outros dois ainda têm de firmar a preferência que conquistarem.

A campanha na TV marca o momento de conversão de indecisos em eleitores por parte dos candidatos, e de consolidação das intenções mais firmes de votos, anteriormente definidas. Nesse processo de conversão de intenção em voto, há quase 60% de eleitores disponíveis – os indecisos, mais os que ainda podem mudar de opinião -, portanto há muita água ainda para rolar por baixo da ponte dos candidatos. A incerteza é grande, o que é bom para a democracia. Existe muita chance de o primeiro turno ser decidido por pequena margem entre os três, e o segundo turno também. Mas essa será outra eleição, bastante diferente daquela com data marcada para 6 de outubro. (Sérgio Abranches é cientista político (sergioabranches@sda.com.br))”