Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Saídas para a crise de audiência

TELEJORNALISMO

Antonio Brasil (*)

As mais recentes pesquisas de audiência revelam uma tendência mundial: o telejornalismo está em crise de audiência. Nos Estados Unidos, por exemplo, enquanto a audiência geral da televisão aumentou 25%, os telejornais caíram em 17%. Aqui no Brasil, segundo o Ibope, o Jornal Nacional da Globo, apesar de ainda líder isolado, despencou dos 53% em 1987 para 37% em 97, e os dados mais recentes tendem a mostrar sempre uma queda significativa. O fenômeno da desmassificação do segmento telejornalístico também parece realmente irreversível.

Antes de procurarmos as razões e os culpados devemos adiantar que essa é uma tendência mundial. O público parece estar cada vez mais se afastando dos grandes noticiários e procurando programas de entretenimento, como game shows e novelas oferecidos em horário nobre. Em contrapartida, os programas telejornalísticos se parecem cada vez mais com os próprios shows de entretenimento. Trata-se de uma tendência perigosa para a informação jornalística e para a própria democracia.

Se a culpa é das novas alternativas tecnológicas, da previsibilidade dos telejornais ou da alienação do público, pesquisas qualitativas mais pormenorizadas ainda não indicam as verdadeiras razões. Mas todos os pesquisadores do meio parecem concordar em que os telejornais em horário nobre com audiências maciças são, cada vez mais, um reflexo do passado. Estes mesmos telejornais estão sendo pressionados para se tornarem cada vez mais competitivos, menos sérios e, principalmente, o que é bastante preocupante, mais "velhos". O público de telejornalismo, como revelam os próprios comerciais das agências de publicidade americanas, está cada vez mais idoso e menos interessado em matérias aprofundadas sobre assuntos considerados pelos editores como importantes ou relevantes. Imagens fortes e assuntos leves fazem parte do cardápio diário que procura garantir os índices de audiência a níveis aceitáveis para os programadores e patrocinadores das televisões.

No caso específico do Brasil, e para todos aqueles que enfrentaram os limites impostos pela ditadura nas redações dos telejornais, hoje se enfrenta um inimigo ainda mais contundente: a ditadura dos índices de audiência.


Só impressão

Mas nada é mais significativo nesse cenário do que a falta de criatividade dos telejornais, no Brasil e no resto do mundo. Segundo o público mais jovem, telejornal é "chato" e tende a ser mesmo "programa de velho". E o que ainda é pior, só mostra desgraça! Por outro lado, para muitos estudantes de Comunicação, o desejo de ser jornalista de TV é hoje transfigurado num objetivo menos político e social: "Quero ser famoso, viajar muito e ganhar muito dinheiro."

No entanto, se o público em geral e, principalmente, os jovens de hoje não são os culpados e ? considerando que ainda existe interesse pela informação de qualidade ?, resta a todos nós que pesquisamos as tendências desse segmento refletir sobre a qualidade e o conteúdo dos nossos telejornais.

É sempre a mesma fórmula e o mesmo formato. Os ingredientes incluem pautas previsíveis, assuntos tratados sempre da mesma maneira e uma constante superficialidade dos conteúdos das matérias produzidas. Os telejornais continuam sendo produzidos por bons profissionais, com enormes custos e muito trabalho. Tudo para você, telespectador, ter a "impressão" de saber "quase tudo" sobre todo o mundo, todos os dias.


Chegada ao limite

Mas qual seria a saída para inverter essa tendência da audiência e evitar esse conservadorismo no formato mundial nos telejornais, se as próprias escolas de Comunicação e os cursos de treinamento de profissionais das emissoras insistem nas fórmulas estabelecidas e no convite a uma segurança sempre tão conservadora? As perspectivas de mudanças a curto prazo nas grandes empresas de TV são pessimistas. Os interesses políticos e econômicos ainda são maiores do que os riscos inerentes às alternativas criativas.

Pouca coisa mudou desde a migração do pioneiro Repórter Esso do meio radiofônico para o meio televisivo, há mais de 50 anos. O público ainda é simplesmente considerado "espectador passivo e manipulável" dos noticiários. Sua participação se limita sempre às declarações "espontâneas" das famigeradas pesquisas do tipo "o povo fala" (afinal, se a voz do povo é a voz de Deus, ela também é, principalmente, do editor!), às perguntas aos internautas de plantão ou, simplesmente, às consultas telefônicas. Todas essas "participações" têm algo em comum: são sempre superficiais, pouco confiáveis e nada transparentes.

O público segue assistindo aos telejornais da mesma forma que assiste a uma novela ou no máximo a um Você decide. Tenta-se de quase tudo na programação televisiva, inclusive um retorno recorrente ao passado nos programas de auditório. Mas a fórmula dos telejornais segue sempre a mesma. E, para sobreviver, o jornalista de TV faz de tudo. De campanha política a shows de televisão, ele se confunde com ator de novela e com juiz de gincanas ecológicas. O nosso telejornalismo parece mesmo ter realmente chegado ao limite de uma fórmula velha e desgastada.


O projeto da CNN

Mas e o futuro? Os mesmos telejornais que migraram do rádio para a TV tendem agora a buscar novas soluções e desafios na internet. Busca-se um novo formato e, antes de tudo, um novo conceito de participação do público na produção dos programas telejornalísticos. Em vez de serem considerados simples índices de audiência ou opinião manipulável, o novo público da internet estabelece novos parâmetros de interatividade. Com a popularização das novas técnicas de produção, edição e transmissão de conteúdos audiovisuais já vislumbramos a possibilidade de produzirmos telejornais virtuais com matérias dos próprios telespectadores, um telejornal verdadeiramente participativo. O monopólio dos grandes telejornais tende a se tornar cada vez mais fluido.

Mas como serão e quem vai produzir esses telejornais virtuais do futuro? Na CNN já se buscam respostas para estas perguntas.

Um projeto pioneiro, o CNN Student Bureau [ver link abaixo], lança uma nova perspectiva para treinamento dos futuros jornalistas de televisão. Eles estão usando a internet como um laboratório de idéias e um centro de convergência de produções telejornalísticas para os jovens estudantes de milhares de escolas secundárias e cursos universitários dos Estados Unidos e do mundo.


Para eleger presidente

Apesar da predominância dos critérios profissionais tradicionais estabelecidos pela própria CNN, mesmo assim ainda se cria um espaço mais livre para uma experimentação direcionada por professores e profissionais, com a proposta de novas pautas e com o tratamento diferenciado das matérias produzidas. Existe uma preocupação tanto na formação dos futuros profissionais como na exploração das possibilidades desse novo meio comunicacional. Em seus arquivos de matérias disponibilizadas gratuitamente, a CNN cria uma nova ferramenta educacional, em que as matérias telejornalísticas funcionam como verdadeiros livros-texto para professores em todos os níveis educacionais.

Com projetos como este, talvez seja possível acreditar que é possível não só aprender a fazer telejornalismo como aprender com o telejornalismo. Além disso, os custos são mínimos, e criam grande oportunidade de desenvolvimento e visibilidade para os futuros jornalistas de televisão ou de internet. No Student Bureau, a CNN está se preparando para produzir os novos telejornais virtuais na internet. Trata-se de uma iniciativa criativa que pode inverter a tendência ao envelhecimento do público e do conteúdo dos telejornais.

E pensar que aqui no Brasil, a participação das grandes redes de televisão ainda está muito longe da promoção de parcerias com as escolas e universidades na formação dos futuros profissionais e na reciclagem dos professores da área… Essa participação se resume a criticar as escolas, a selecionar os "melhores" estudantes para "estágios" em verdadeiras gincanas com critérios misteriosos, a lançar sempre muitas promessas, mas investir sempre na segurança e na mesmice.

O telejornalismo no Brasil pode estar perdendo audiência, mas ainda elege presidente.

(*) Jornalista de TV e coordenador do Laboratório de Vídeo da Faculdade Comunicação Social da UERJ.

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