Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Sérgio Gobetti e Uilson Paiva

RBS vs. PT-RS

"Olívio joga na comunicação para mudar imagem", copyright O Estado de S. Paulo, 22/7/01

"Governador produz uma boa notícia por dia para reverter índices de desempenho ruins

Um anúncio de aumento salarial por dia, solenidades no estilo campanha eleitoral, aumento da propaganda e integrantes do primeiro escalão do governo solícitos como nunca para falar à imprensa. As duas últimas semanas foram marcadas por uma guinada radical na atitude do governo do Rio Grande do Sul. Apontado em pesquisas recentes como um dos piores desempenhos entre os principais Estados do País, o governador Olívio Dutra (PT) iniciou uma ofensiva para retomar sua base eleitoral.

A sucessão de boas notícias começou há 10 dias com a criação da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, um projeto do Executivo que recebeu emendas da Assembléia. Dois dias depois, foi a vez do anúncio do reajuste de 25% ao magistério estadual (que se soma aos 14,9% concedidos no ano passado). No domingo passado, em solenidade típica de véspera de eleições, na Grande Porto Alegre, Olívio sancionou o salário mínimo gaúcho, o piso mais alto do País (de R$ 230,00 para R$ 250,00).

Já na segunda-feira, o governo resolveu estender o reajuste de 25%, em quatro parcelas, para o quadro geral do funcionalismo. Para completar, na quinta-feira, em meio a crise nas polícias estaduais, anunciou a extensão do adicional de 222% a título de risco de vida (antes exclusividade de coronéis da PM e delegados) para todos os servidores da área de segurança.

Embora negue, depois do puxão de orelha da direção nacional do PT, o governo também começou a dar mais publicidade a suas ações. Foram dias seguidos de anúncios em jornais locais e no horário nobre da TV Globo local. Como nunca, o primeiro escalão do governo atendeu a todos os convites para entrevistas, que se sucediam no rádio e na televisão. ?Não fazemos pirotecnia com propaganda, não gastamos mais do que o previsto, mas em momentos de realizações como esse precisamos divulgar os atos para a sociedade?, disse o governador.

Em comparação com o governo anterior, os gastos têm sido menores. No terceiro ano de administração, o ex-governador Antônio Britto (PMDB) gastou R$ 70 milhões em publicidade. Em 2001, período equivalente do mandato, Olívio pretende gastar R$ 30 milhões. Em 2000, gastou R$ 22 milhões.

Crises – Eleito pela coligação PT-PSB-PCB-PC do B, Olívio criou a expectativa de liquidar de vez com os problemas que sempre fez questão de apontar nos seus antecessores. Mas, na transição de pedra para vidraça, tornou-se especialista em acumular crises. Em documento interno, obtido pelo Estado, o PT faz a seguinte análise: ?Nossa administração se caracterizou por estimular dezenas de conflitos com todos os setores políticos e sociais.? E prossegue: ?Ao optar por um conflitismo anárquico, o governo abdicou de ampliar sua base social.?

Incentivador das greves históricas do magistério, que causaram grandes desgastes nos governos anteriores, o PT nomeou como secretária de Educação Lúcia Camini, a presidente do temido sindicato dos professores, o Cpers. A secretária-sindicalista enfrentou uma greve de 32 dias em 2000 e teve de elevar de 10% para 14,9% o reajuste proposto para a categoria.

Os confrontos não pararam por aí. Recentemente, os professores levaram a primeira versão da nova proposta salarial encaminhada pelo governo dentro de um saco de lixo, que depositaram na frente do Palácio Piratini. A trégua só começou a ser selada na sexta-feira, com a aprovação pela categoria da proposta de novo reajuste de 25%, em quatro vezes. ?É uma lógica diferente, o sindicato sempre quer o máximo, mas nós, governantes responsáveis, não podemos chegar a uma proposta que não seja executável?, observa Lúcia. ?Mas, com certeza, sou a secretária de Educação com quem gostaria de ter negociado como presidente do Cpers.?

Desde o princípio também sucederam-se as crises com o Movimento dos Sem-Terra (MST), que reclamava do ritmo lento de assentamentos e da falta de autonomia do departamento de Reforma Agrária. A convivência pacífica teve fim com a PM agindo com severidade para reprimir, pela primeira vez, em meados de 2000, uma invasão dos sem-terra de um prédio do Incra em Porto Alegre. A pressão levou o governo a criar, no fim do ano passado, a Secretaria Extraordinária da Reforma Agrária, para a qual foi nomeado um ex-líder do MST. Semana passada, o governo anunciou conclusão da meta de assentamentos de 2000, acumulando 3.852 famílias beneficiadas até agora, e prometeu mais 1.600 assentamentos até dezembro. Na campanha, a promessa era a de assentar 10 mil famílias.

Minoritário desde o início na Assembléia, depois das últimas eleições municipais o governo perdeu o apoio que tinha do PDT. Apesar disso, sempre conseguiu aprovar seus projetos mais importantes. ?As realizações anunciadas pelo governo foram conseqüência da parceria com a Assembléia e dos canais de diálogos abertos com o governo?, avalia o presidente da Assembléia gaúcha, Sérgio Zambiasi (PTB).

Ford – Foi no Legislativo que o governo sofreu danos graves em sua imagem em conseqüência de duas CPIs: a da Ford e a da Segurança Pública. A primeira foi motivada pela tentativa da administração estadual de renegociar o contrato firmado pela montadora de veículos com o governo anterior. A revisão dos incentivos fiscais levou a Ford a instalar-se na Bahia, com subsídios extras do governo federal. A oposição não perdoou. A CPI da Ford gerou um noticiário extenso e debates prolongados que, significativamente, exploravam mais o lado simbólico do rompimento do contrato (o governo de esquerda que espanta investimentos estrangeiros) do que o financeiro (auditores do Tribunal de Contas do Estado demonstraram que o contrato era lesivo ao patrimônio público, mas houve pouca repercussão).

O assunto rende polêmica até hoje, mas Olívio orgulha-se de ter privilegiado uma política de incentivos dos ?sistemas locais de produção?.

A falta de diretrizes de desenvolvimento é uma das principais críticas da federação das indústrias (Fiergs), da oposição e até de setores do PT. ?Não há uma política de desenvolvimento ao contrário do governo anterior, por mais que possa ser contestada?, diz Denis Rosenfield, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).

O secretário de Desenvolvimento, Zeca Moraes, argumenta que incentivo fiscal e indústria automobilística não são sinônimos de desenvolvimento. O governo gaba-se, por exemplo, de estar atraindo investimentos de setores de alta tecnologia, como a EMC Computers e um centro de pesquisas da Motorola."

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"Para gaúchos, defeito do governador é ser do PT", copyright O Estado de S. Paulo, 22/7/01

"Segundo pesquisa, eleitorado está dividido entre petistas e críticos ferrenhos da legenda

PORTO ALEGRE – Olívio Dutra é honesto, mas incompetente.

Destaca-se por defender as causas sociais, mas fala muito e faz pouco. É o que se pode chamar de um político popular, mas carrega um defeito: é do PT.

Em resumo, é essa a imagem que os gaúchos têm do governador, segundo pesquisa feita em maio, no Rio Grande do Sul, pelo Instituto Meta, de Porto Alegre.

Os dados, obtidos pelo Estado (ver arte na página A6), demonstram em porcentuais o antagonismo de opiniões da população gaúcha – situação que não mudou muito desde a última eleição. Para 18% dos ouvidos pela pesquisa, Olívio é honesto, porém 13,5% o têm como incompetente.

Desde 1998, o eleitorado aparece dividido em dois grupos: a favor ou contra o PT. Como na divisão histórica entre os maragatos e chimangos da Revolução Farroupilha ou na distinção entre gremistas e colorados no futebol, politicamente os gaúchos não guardam posição intermediária sobre o governo estadual. O discurso antipetista, da oposição à Prefeitura de Porto Alegre (há quatro mandatos comandada pelo PT), hoje estende-se para o Estado.

A divisão política ficou clara na última eleição, quando Antônio Britto foi derrotado por Olívio no segundo turno, por diferença de 1,52% ou 87 mil votos, num universo de 5,6 milhões de votos válidos.

Desde então, o parâmetro para qualquer dado divulgado pela administração estadual petista passou a ser o governo Britto. ?Colhemos mais do que o governo Britto?, disse esta semana o secretário da Agricultura, José Hermetto Hoffmann, celebrando a safra recorde de verão. ?Em dois anos, investimos em escolas o dobro do governo Britto?, diz a secretária de Educação, Lúcia Camini. Britto é apontado como candidato do PMDB ao governo em 2002, apesar da crise pela qual o partido passa também no Estado.

Ao justificar os ataques a seu governo, Olívio repete: ?A oposição ainda não assimilou a derrota.? Com seu linguajar gauchesco – invariavelmente começa uma frase com o castelhano ?bueno? – e bigode robusto, o governador alimenta o culto a sua imagem. Sobretudo faz questão do contato com o interior do Estado, onde passa em média metade da semana e, com freqüência, pelo menos um dos dias do fim de semana. Na viagem para o exterior de maior destaque, foi a Roma receber a bênção do Papa. ?Olívio tem forte apelo regional, é considerado um sujeito simples, de palavra, e tem muito carisma principalmente nos setores mais pobres e no interior do Estado?, analisa o diretor do Instituto Meta, Flávio Silveira, professor da PUC-RS.

A estratégia de comunicação do governo é dar prioridade para veículos de comunicação do interior, que hoje concentram 57% dos investimentos em propaganda. ?O primeiro rádio que as pessoas escutam e o primeiro jornal que lêem é do interior?, diz o secretário de Comunicação, Guaracy Cunha."

    
    
                     

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