Thursday, 03 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Stephen Kanitz

FILANTROPIA & 3? SETOR

"Minha amiga, a irmã Lina", copyright Veja , 24/04/02

"Eu conheço uma verdadeira santa. Não é todo mundo que tem esse privilégio. Vou contar como a conheci, para que todos façam o mesmo e descubram outras santas escondidas por aí.

Trinta anos atrás criei um prêmio para as melhores empresas do país, o Melhores e Maiores. Decidi então criar o Prêmio Bem Eficiente, para entidades beneficentes. Alice Carta levou-me para conhecer uma entidade superséria, e quando cheguei lá ouvi a palavra lepra (hanseníase). Fiquei em pânico, queria sair dali o mais rápido possível. Foi quando a vi pela primeira vez.

É uma religiosa de 81 anos, que há 49 veio jovem da Itália cuidar dos hansenianos do Brasil. Perdeu 9 quilos na viagem e ainda se esqueceram de buscá-la quando desceu do navio.

Na época existia uma lei de confinamento para as pessoas portadoras desse mal – todas eram obrigatoriamente enclausuradas num asilo, em Guarulhos. Era uma prisão perpétua, e ninguém queria cuidar deles, nem amigos nem parentes, com exceção da irmã Lina.

Não dando importância ao fato de que provavelmente também contrairia a doença, ela viveu ali cuidando de mais de 1.000 hansenianos, onde ficou nada menos que trinta anos se dedicando a eles.

A história não pára por aí. Com os avanços da medicina da época, o mal foi quase erradicado, e isso permitiu que a irmã Lina mudasse de preocupação (o problema ainda é grave em algumas regiões do país). Então, ela criou uma creche para os filhos de hansenianos e dedicou-se a eles por mais dezenove anos, até ficarem adultos. Não satisfeita, ela tem uma entidade que cuida de 500 crianças abandonadas, uma das mais eficientes que já vi. As crianças são felizes, têm uma auto-estima que raramente vejo nos alunos das escolas de bairro.

Tive o privilégio de conferir, por duas vezes, o Prêmio Bem Eficiente a sua instituição, e ela será novamente contemplada, no dia 14 de maio, mas isso não é mais notícia. Hoje, a grande moda é premiar empresas socialmente responsáveis, não entidades que há muito vêm fazendo o bem sem alarde. Já existem dez prêmios para empresas com nomes como A Empresa Cidadã, A Empresa Social, A Empresa Responsável.

Antigamente, marketing social era o que as entidades faziam para aparecer. Agora significa tornar empresas socialmente visíveis a todo custo. Doar anonimamente, como rezam todas as religiões, nem pensar.

A filantropia por parte de empresas vem caindo ano a ano, porque muitas preferem montar o próprio instituto com o nome da marca da empresa. Em vez de uma Fundação Bill Gates, no Brasil privilegiam-se a ?marca? e o marketing da empresa. Ao se decidirem por um projeto próprio, muitas companhias preferem não mais apoiar causas como a hanseníase, a prostituição infantil, o abuso sexual, a velhice, a cegueira, considerados ?mercadologicamente incorretos?.

Departamentos de marketing de empresas ?socialmente responsáveis? acham melhor apoiar causas como educação, crianças ou ecologia. Criança é mais fotogênica que idoso ou leproso. Empresa não quer, nem pode, ter sua marca associada a um problema social ?mercadologicamente incorreto?, e quem perde são os mais necessitados.

Não bastasse tudo que a irmã Lina já fez pelo Brasil, longe de sua família e da ajuda do governo italiano, ela luta agora para salvar seu hospital, em Guarulhos, que vem mantendo com muito esforço. Já pediu a Deus e a todo mundo os 3 milhões de reais de que precisa para completar o que será sua última obra.

Não vou dar o nome de sua instituição, seu endereço nem seu nome completo, porque quero que todos saiam e procurem os milhares de santas que ainda temos por aí, desconhecidas, esquecidas e cada vez mais abandonadas.

Obrigado a todas as irmãs Linas por tudo o que fazem por este país. (Stephen Kanitz é administrador – www.kanitz.com.br)"

 

MINO CARTA

"Carta defende fidelidade aos fatos", copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 18/04/02

"O jornalista Mino Carta (foto) afirmou, em palestra assistida por cerca de 150 jornalistas e empresários, no auditório do teatro Sesiminas, da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), que os profissionais brasileiros, em sua prática cotidiana, devem respeitar três princípios básicos: ?uma fidelidade até canina à verdade dos fatos, uma crítica constante, que não deve ser apenas positiva, mas sobretudo construtiva, e uma fiscalização rigorosa do Poder, em qualquer circunstância?. Se estes pressupostos não forem assumidos, adverte Mino Carta, ?corremos o risco de nos transformarmos em simples bajuladores?.

?Um jornalista, por mais que tente negá-lo, nunca é estritamente objetivo. Sempre é subjetivo, porque é obrigado a posicionar-se perante realidades. Por isto, é preciso exigir-lhe sempre a honestidade?, continuou. Sobre a situação atual da imprensa brasileira, ele disse que, em termos gerais, ?melhorou bastante no conteúdo, apesar de ter sofrido um nivelamento por baixo?, mas salientou que ?toda a mídia nacional está falida, e muito mais que os otimistas podem supor?. Lamentou também que os jornais e a mídia eletrônica ?estejam demonstrando um interesse cada dia mais escasso pela informação verdadeira, preferindo o entretenimento e os serviços?. Mas abriu uma exceção para o rádio, ?que depende dos fatos para sobreviver, enquanto veículo noticioso?.

Mino Carta revelou ainda que os jornalistas deveriam seguir à risca o conselho do teórico marxista italiano, Antonio Gramsci, que no início do século passado afirmara que é preciso ?ser otimista na ação e pessimista na inteligência?. Aconselhou os profissionais a escolherem sempre ?a posição e o ângulo interpretativo mais conveniente perante um episódio, que lhes permita realizar um julgamento idôneo e imparcial. A honestidade é nosso maior capital. Sem ele, inevitavelmente fracassaremos?, concluiu."

 

LITERATURA & MERCADO

"Editoras perdem leitores, mas ganham dinheiro", copyright O Estado de S. Paulo, 18/04/02

"A uma semana da abertura da 17.? Bienal do Livro de São Paulo, o mercado editorial recebeu ontem notícias para comemorar e também para se preocupar. Se olhar para o caixa, os editores vão perceber que o mais recente levantamento do setor indica um aumento significativo no faturamento: em 2001, a indústria do livro faturou 10% a mais do que em 2000, atingindo a respeitável marca de R$ 2,267 bilhões.

Por outro lado, se olharem para o balcão de negócios, os editores vão notar uma redução dos número de livros vendidos de 10% – em 2000, foram comercializados 334,2 milhões de exemplares; no ano passado, o número caiu para 299,4 milhões. Para simplificar a equação: o valor médio de cada livro vendido subiu de R$ 6,16 para R$ 7,57. Com isso, clientes – e leitores – foram perdidos.

?O faturamento cresceu porque os livros vendidos eram mais grossos e caros e também porque houve um repasse de custos que estavam sendo represados desde o Plano Real?, afirma Raul Wasserman, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), que banca a pesquisa anualmente, em conjunto com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel).

?O mercado vem crescendo lentamente, nesse ano crescemos 0,5% acima da economia brasileira; não há uma crise do setor, mas há crises em algumas editoras?, diz ainda o presidente da CBL.

O fato é que a instabilidade da economia mundial, agravada pelos atentados em Nova York em 11 de setembro e, internamente, pela subida do dólar, colaboraram para esse quadro, em que os editores (analisados como um todo) perdem clientes, mas não perdem dinheiro. Como?

O gasto com direitos autorais de autores estrangeiros, por exemplo, pagos em dólar, caiu 24%; deu-se prioridade, portanto, o livro de autor nacional (cresceram em 5% esses pagamentos). E a indústria, que empregava 20,9 mil pessoas em 2000, cortou 1.800 funcionários.

Em número de exemplares vendidos, 2001 foi um dos piores anos do setor desde 1994. Só bate 1999, ano da desvalorização do real e de uma retração brusca do mercado. Também foi um ano ruim em termos de variedade: o total de exemplares editados, entre primeiras edições e relançamentos, foi de 40,9 mil títulos, contra 45,1 mil em 2000.

O grande destaque positivo do ano foi o setor de obras gerais. Embora o número de títulos da área, o total de exemplares vendidos cresceu 4%, o de produzidos, 20%, e o faturamento, 14%.

Também cresceu significativamente o setor de livros técnicos e profissionais (8% no faturamento e 4% no total de livros vendidos). Enquanto isso, o setor de livros religiosos amargou um forte retrocesso no total das vendas, mas seu faturamento cresceu em 15%. Os livros religiosos, tradicionalmente, eram mais baratos que os livros de interesse geral, uma regra que pode estar sendo alterada, prejudicando também os leitores mais pobres da área.

Também caiu a venda dos livros didáticos, em 19%. A área, contudo, apresentou um crescimento no faturamento de 7%, movimentando R$ 1,16 bilhão (51% do mercado editorial) – ou seja, governo e pais passaram a pagar mais caro para os livros usados nas escolas."