Saturday, 04 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

A badalhocagem social é a culpada

O mundo está mesmo as avessas. O presidente da China fazendo visita oficial de quatro dias aos EUA; uma travesti que não parece travesti no BBB; o ex-partido de diretriz socialista faz um governo de direita neoliberal e elege sucessora. Realmente o fim parece estar próximo, diriam os sócio-normativos.

Infelizmente, volto a escrever depois de minhas férias sobre isso. Não porque o programa mereça, não porque traga alguma coisa nova ou positiva para a vida das pessoas na sociedade. Apenas e não mais, estou como apalermado com a repercussão da presença e saída do programa no 1º paredão de uma transexual.

Disponho da dualidade representativa para acercar-me deste tema. Pinço dois comentários sobre o ocorrido, que há pouco li na internet:

‘…Ótimo, pelo menos o grau de baixaria e pouca vergonha vai diminuir neste `programeco´, já é uma melhora!’

‘… Aviltante a liçãozinha de contramoral que o Pedro Bial pregou para os participantes do BBB 11 hoje, antes da eliminação. Em uma palavra, se não deixarem de ser `normalpatas´, o programa vai pro brejo… Ainda mais agora, que nossa principal `atração´ foi guilhotinada pelo público… Tive a sensação de estar ouvindo um `amestrador de cães´ dando ordens para os habitantes de um zoológico. A que nível chegamos!’

O ‘herói’ homofóbico

O primeiro segue a linha Muzzo-hittleriana, afirmando entre que os demais participantes são poços mensuráveis de virtudes. Nem comentarei nada quanto aos participantes de edições passadas, ou comentarei…

O programa BBB 10 mostrou um exemplo de o quanto em uma sociedade pseudo-pós-moderna o preconceito e a desinformação ainda persistem como falsas-verdades, como diria Chico Buarque em A Gota d´água. Marcelo Dourado, depois de tantas imbecilidades que proferiu durante sua segunda participação no reality global, mostrando que poderia piorar sua imagem bucéfala diante de uma audiência esquálida e acrítica. Em meio a seus brothers no programa de maior audiência da TV brasileira na atualidade, proferiu que heterossexuais não contraem HIV, causando revolta entre os moradores da casa do Big Brother Brasil.

Na ocasião, o politicamente correto ‘foi feito’, mas o estrago não foi desfeito. Pois simplesmente dizer que se alguém queira se informar que acesse o site do Ministério de Saúde é omissão, ademais sonegação de informação, num país onde um dos projetos do governo federal é justamente a inclusão digital e da, polêmica para alguns, disseminação do acesso à banda larga. Ou seja, somos em torno de 40 milhões de usuários de internet em um país de 200 milhões. Penso ainda que um jornalista deve ter um compromisso com a verdade e a atitude omissa do senhor Pedro Bial não desmentiu a falácia do ‘herói’ homofóbico Marcelo Dourado. Que, pasmem, foi eleito pelo mesmo público o grande ganhador.

Terreno fértil

Ao segundo comentário que passaria, digamos, pela crítica pseudo-politicamente correta, me dá um certo receio seguir nesse comboio. Porque justamente os ‘normal-patas’, como utilizou o comentarista, são os que ganham sempre o jogo. Afinal estes que estão aí estão abaixo da normalidade. O normalista não se expõe, somente lhe satisfaz expor o outro. Em outras palavras, os que aí estão nada mais são que vítimas da desigualdade que há neste país com mania de grandeza e que finge ser desenvolvido.

Ser a oitava economia do mundo e estar em 72º lugar no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é nada mais que um cruzamento de dados simples, científicos e objetivos da desigualdade e exclusão à qual estão submetidos mais de oito em cada 10 brasileiros.

Este o terreno fértil para a badalhocagem que se faz com o povo desta nação, que tem ao mesmo cerne o oitavo PIB do mundo e 40 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza. Que possui um Chico Anysio anos fora do ar, ao passo que os tais grande heróis do senhor Pedro Bial…

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Ator, diretor teatral, cantor, escritor e jornalista