Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A cara da nova TV

A versão beta, experimental, do YouTube foi ao ar no dia 17 de maio de 2005. Como houve outros eventos em outras datas, a plataforma decidiu adotar todo o mês de maio para o aniversário.

Passados dez anos, tem agora 1 bilhão de visitantes únicos por mês, no mundo todo. E a cada minuto são colocadas na plataforma mais 300 horas de vídeo.

Mas o YouTube não está mais sozinho. Muitas de suas estrelas são agora disputadas por outros gigantes, como Netflix e até mesmo o Facebook, que passou a priorizar vídeo nos últimos meses.

Com concorrência crescente, o YouTube acaba de anunciar inéditas parcerias com produtoras, inclusive uma subsidiária da DreamWorks, para sua plataforma crescer também em qualidade.

E a disputa chegou ao Brasil, que é o segundo país em minutos de vídeos assistidos no YouTube por mês, só perdendo para os Estados Unidos.

Desde os 17

Estrela do quarto maior canal brasileiro da plataforma em número de inscritos, 4,5 milhões, a atriz curitibana Kéfera Buchmann, 22 anos, será atração também no Netflix.

Não vai levar para lá o 5incominutos, seu canal, nem o humor característico, mas está entusiasmada com o acordo e a chance de trabalhar com algo bem diferente, como intérprete.

Ela diz não poder “falar muito”, mas que será “um drama, um superdrama”, como no filme que acaba de protagonizar, “Amor de Catarina” –que também deverá estrear no Netflix.

Kéfera deu entrevista horas antes de um voo para Las Vegas, nos EUA, em viagem de uma semana para gravar uma inusitada websérie sobre luxo e moda bancada por um de seus anunciantes. Foi fotografada no Shopping Iguatemi, em São Paulo, logo depois de passar pelo cabeleireiro Wanderley Nunes.

Apesar da idade, ela já fala como uma empresária. “Comecei o canal quando tinha 17 anos”, diz. “Tudo o que eu fui aprendendo foi muito sozinha, fazendo cursos, pesquisando e dando a cara a tapa no YouTube, vendo o que dava certo.”

Seu sustento vem do 5incominutos “há anos”, mas a empresária avança, além do cinema, pelo palco. No próximo dia 6, sua comédia “Deixa Eu te Contar” volta ao cartaz no Teatro Gazeta, de 640 lugares, em São Paulo.

Quanto à televisão, não quer saber. Quando começou no YouTube, ela “via a internet como, quem sabe, uma vitrine para tentar ser contratada por alguma emissora, alguma coisa assim”.

“Só que eu fui vendo a internet tomar uma proporção muito maior e, quem sabe, até melhor do que ser de alguma emissora. Ser só mais uma dentro de uma TV.”

O autor da peça de Kéfera é Afonso Padilha, roteirista do Porta dos Fundos, o maior dos canais brasileiros, que passou a marca dos 10 milhões de inscritos na segunda (11).

Muitos “youtubers”, como são chamados, apesar de estarem avançando por outros meios e plataformas, são próximos e se apoiam em questões técnicas e comerciais.

O Jovem Nerd, que já era fenômeno de internet antes de ser canal de YouTube, transformou o apoio aos colegas em negócio, criando uma rede para abrigar outros canais, inclusive o Galo Frito, o terceiro no país.

Alexandre Ottoni, o próprio Jovem Nerd, e seu sócio Deive Pazos comandam a rede Amazing Pixels como parte de um pequeno império “nerd”, que abrange também editora e site de comércio eletrônico.

Já com 13 anos no ar, Ottoni vê a internet se dividindo em dois caminhos, com uma parte cada vez mais profissional, como evidenciado por Netflix e “o próprio YouTube”, e outra amadora, “porque você vai ter sempre a molecada”.

TV, não

Do alto de seus 36 anos, o Jovem Nerd diz que “a garotada que consome os youtubers não está acostumada a ver TV como a minha geração, por isso é comum você ver um cara que nunca apareceu em TV lotando evento”.

Mederi Corumbá, 28, que faz o Galo Frito e também o canal 5AlgumaCoisa, de animação, diz que “a internet traz muito mais dinheiro, mais facilidade de produção e liberdade”. “Então não tenho intenção de migrar para a TV.”

Mas já avança por outras plataformas, inclusive o Facebook, que “não tem remuneração” como o YouTube, mas no qual ele postou um vídeo a pedido de um anunciante. “E funcionou, o cliente gostou.”

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Próximo passo do Youtube é fazer cinema para concorrer com Netflix

Há três semanas, em meio aos “upfronts”, eventos para apresentação de novas produções por TVs e agora também por gigantes de internet nos EUA, o YouTube anunciou sua entrada no cinema.

Serão filmes para estrear no próprio YouTube, com parceiras como AwesomenessTV, da DreamWorks, e estrelas de canais da plataformas nos EUA, como Smosh.

Questionado se existe a intenção de trazer o projeto para o Brasil, recorrendo às estrelas locais, Álvaro Paes de Barros, diretor de conteúdo do YouTube no país, confirma que “existem conversas”.

Lista até os eventuais parceiros, como a Amazing Pixels, do Jovem Nerd, que “tem projetos interessantes”, assim como Felipe Neto, do Parafernalha. E, é claro, “o filme do Porta dos Fundos”.

“São projetos de altíssima qualidade, esteticamente sofisticados. Eu gostaria muito de trazer o programa para cá e tirá-los da gaveta, em parceria com os criadores.”

Mas tudo vai depender da experiência nos EUA. “É a primeira vez que o YouTube comissiona produção de conteúdo e está todo mundo ansioso pelo resultado”, diz, descrevendo “toda a corporação animada, desejosa de que vá para a frente”.

Se der certo por lá, o Brasil estará na etapa seguinte, “seguramente, porque é um país muito importante no quebra-cabeças global do YouTube”.

Segundo Barros, o objetivo do programa é “que as pessoas busquem no YouTube, cada vez mais, conteúdo de qualidade”, em linha com a concorrência de Netflix e, nos EUA, HBO Go. “É uma próxima fase do YouTube.”

Ele diz ver com bons olhos a maior disputa em vídeo on-line, porque força o YouTube a buscar mais inovação.

Sem citar o Facebook, que vem sendo criticado por desrespeito ao direito autoral em vídeos postados por usuários, Barros destaca o Content ID. “Talvez o YouTube seja a única plataforma que tenha um sistema tão sofisticado de proteção aos direitos do autor. Para mim, é uma grande conquista destes dez anos.”

O executivo afirma não ver problema também na diversificação que vem sendo buscada pelos principais canais do YouTube no Brasil.

Pelo contrário, diz que o avanço de Galinha Pintadinha ou Porta dos Fundos para outros campos “mostra o poder da plataforma para lançar uma nova geração de propriedades intelectuais”, como chama os produtores de conteúdo.

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Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo